VINTE E DOIS

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Adrian.

Minha cabeça girava. Era uma confusão de sentimentos. Preocupação, medo, afeto, cuidado. Como se tudo o que eu não queria admitir sentir, tivesse vindo a tona, como uma bomba; ao ver aquelas marcas de machucados senti meu coração de retrair de dor.

Não me importo com o quão rápido aconteceu. Marley era minha garota. E agora, eu me via em uma encruzilhada entre contar e não contar. Eu tinha medo, medo de falar alguma coisa para sua mãe e ela me afastar ou tentar algo pior e medo de não contar e estar fazendo a coisa errada. Estava confuso demais.

Como eu nunca percebi? Eu vivi quase a vida toda ao lado dela. Todos os sinais estavam evidentes e nunca me toquei. Me sentia péssimo por perceber o que sentia em relação a ela somente agora, em momento sensível.

Puxei o ar com mais força abraçando seu corpo adormecido. Não queria solta-la, não queria tirar meus olhos dela. Já se passava das três da manhã e era perigoso ficar aqui mesmo eu não tendo pegado no sono nem por um instante.

Com receio, passei minha mão por seu rosto jogando os fios rebeldes de seu cabelo para trás. Queria poder pegar sua dor para mim. Eu não sabia o que dizer, eu não ia mudar meu jeito de trata-la mas também não ia acelerar as coisas. Não ia desistir como eu aposto que ela está pensando que vou fazer.

Passei o restante da madrugada acordado até seu despertador tocar, estiquei minha mão desligando-o quando seus olhos se abriram e me encararam.

— Você ainda está aqui — sorri, assentindo.

— Estou.

— Por que não fugiu no meio da madrugada? — ela tentou brincar mas, continuei sério.

— Porque eu me importo com você e queria ficar com você — Marley desviou o olhar encostando a cabeça no meu peito.

— Não me trate diferente de como me tratava — pediu, enquanto passava a mão na minha camisa.

— Ei — deslizei pela cama ficando frente a frente — Você ainda não percebeu, não é?

Marley ficou em silêncio por longos segundos e quando abriu a boca pra falar o som da batida nos assustou.

— Maninha? Acordou? — arregalei os olhos ouvindo a voz de Marco.

— Sim — a garota ao meu lado respondeu. Meus olhos quase saltaram para fora do corpo quando a maçaneta se moveu.

— Por que trancou a porta? Faz dois anos que não venho dormir com você por causa da chuva! Não precisava disso  — reclamou e eu coloquei a mão na boca querendo rir. Marley veio para cima de mim, forçando sua própria mão em cima da minha.

— Vai pra debaixo da cama — sussurrou — Já estou indo, Marco!

Sai da cama e rolei para debaixo da cama, vi os pés de Marley tocarem o chão e caminharem em direção à porta. Os pés de Marco apareceram na minha visão. Ele não entrou no quarto.

— Bom dia — ela disse.

— Bom dia, maninha — os dois pareciam se abraçar — Mamãe mandou avisar que não vai poder te levar no shopping, por isso, eu vou!

Ouvi barulho de chaves se balançando, deduzi ser do carro da família. Desviei meu olhar para uma caixa verde de papelão verde, a tampa dela estava caída mostrando seu conteúdo. Estiquei meu pescoço segurando a respiração quando vi os papéis de carta azul, como as que eu recebia. Não, não, não pode ser.

Quis mexer lá, averiguar direito mas isso faria muito barulho. Marley era a garota das cartas? Era muita revelação em menos de vinte quatro horas.

Podia ouvir as vozes dos irmãos mas, meu cérebro não conseguia entender as palavras. Como se eu tivesse saído do meu corpo e focado nas palavras Marley, cartas, depressão, futuro amor...

Encostei minha testa no carpete tentando controlar minha respiração.  Queria ter tanto alguém pra pedir um conselho agora.

— Ele já foi — sai debaixo do móvel com o aviso — Tudo bem?

Me levantei, parando na sua frente.

—Sim — segurei seu rosto dando-lhe um beijo suave — Te vejo na escola?

Marley assentiu e abriu a janela para que eu pudesse passar. Lancei um último olhar para ela antes de entrar para meu quarto e começar a me arrumar para a escola. Era ela. Ela era meu futuro amor? Que bobeira, devia ser tudo um engano não? Sem conseguir me conter, levantei meu colchão pegando todas as cartas que recebi, todas com promessas de grandes amores, felicidades e melhoras.

Meu olhar se fixou na parede. Eu era o erro de natal!

Eu não ia ser o tipo que fingia que nada estava acontecendo, não ia fechar os olhos e esperar que o destino resolvesse. Eu não acreditava nisso. Eu era muito raciocinal para isso.

Já estava pronto para ir a escola quando o barulho da buzina chegou aos meus ouvidos. Marco ficaria com a carro hoje, o que significava que não teríamos que andar. Marley estava no banco da frente, me sentei atrás do banco do motorista.

Estávamos no meio do caminho quando meu celular tocou e o nome "mãe" apareceu na tela. Um frio percorreu toda minha espinha. De alguma forma eu sabia que eu teria que lidar com outro "problema".

Te vejo no futuro.Onde histórias criam vida. Descubra agora