DEZOITO

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Abracei o corpo delicado começando a acordar, olhei para a janela que agora já caia pouca neve. A lareira já não estava pegando fogo. E a energia havia voltado. Marley ergueu o rosto em minha direção, os olhos inchados, sorriso pequeno no rosto.

Acordei faz alguns minutos e a olhava dormir, ela estava estranha — não em um sentindo ruim — e sim na questão de humor. Marley sempre foi fechada, e nessas férias ela está totalmente diferente. Com sorrisos. Piadas. Com felicidade. Coisa que raramente eu via.

E eu não estava reclamando, eu preferia vê-la assim. Já perdi as contas de quantas as vezes cheguei em sua casa e vi-a triste ou via ela entrar em seu quarto aos prantos.

A garota se levantou, espreguiçou-se e foi em direção às escadas. Eu já havia feito minha higiene matinal por isso continuei na cama quente até ela voltar.  Marley deu uma corridinha até o colchão, se embrulhando em seguida. Fazia pouco tempo que a energia voltou, a casa ainda estava um gelo.

— Bom dia — disse finalmente.

— Bom dia — sorri, me aproximando.

Deixei um beijo em seus lábios, um simples contato o que a fez se surpreender. Eu disse que iria viciar.

— Marco e minha mãe devem estar quase chegando — sussurrou.

— Na verdade, agora que os bombeiros chegaram no local. Marco me avisou — assentiu. Seus olhos vagaram no tempo.

— Marco! — franzi o cenho — Ele não pode nunca saber disso. Ok?

Sorri de seu desespero, puxei sua cintura descansando minhas mãos em suas costas.

— Adrian, por favor — disse baixo — Não fale nada para ele.

— Está bem, está bem — suspirou aliviada — Vai ser nosso segredo.

Nos levantamos indo tomar café da manhã e arrumar a cozinha de ontem.  Colocamos as vasilhas na máquina, arrumamos o balcão que estava com papéis de chocolate espalhado e enchemos as vasilhas de águas. Também demos um jeito na sala de estar, não guardamos o colchão apenas dobramos as cobertas e tiramos as velas do local.

Marley estava sentada próxima a janela que tinha um acento com gavetas embaixo. Ela lia algum livro cujo não sabia o nome. Me aproximei, sentando-me ao seu lado.

— Pensava que não gostava de mim — falei com tom brincalhão depois que ela se encostou no meu corpo.

— Não gosto — fiz careta, ela riu — Você é... Bonitinho.

— Bonitinho? — largou o livro se virando para mim — Legal.

Abracei sua cintura e ela passou os braços por meus ombros.

— Estou brincando, é só que... Você é o melhor amigo do meu irmão — fez cara de nojo.

Revirei meus olhos, pegando seu rosto e dando um beijo nariz, queixo, boca. Ela riu, afastando meus ombros tentando fugir do meu toque. Segurei suas mãos mantendo-a perto de mim, ficamos naquela bolha, minha cabeça a mil pensando em como seria dali para frente. Eu sei, sou um emocionado mas... Não tinha como não ser quando um beijo encaixa daquele jeito. Será que seria tudo fingimento? Marley mal olhava e bastou alguns dias de férias para aceitar meu carinho, meus beijos e meu corpo ao seu lado enquanto dormia. Estava tudo tão estranho.

Não quis perguntar nada sobre como nos comportaria daqui alguns dias, quando voltarmos para Toronto para o último semestre do terceiro ano do ensino médio.

Nos afastamos, ou melhor, ela praticamente pulou dos meus braços quando o carro apareceu na entrada da casa. Marley se sentou no sofá em uma distância segura de mim.

Não demorou para a porta de abrir. Marco estava com o pé engessado e se sustentando em muletas. O loiro olhou ao redor, procurando sei lá o que. Quando me viu longe de sua irmã semi-cerrou os olhos, virando-se para sua mãe cochichando alguma coisa e em seguida voltou os olhos novamente para mim tentando imitar a expressão de Sherlock Holmes. Idiota.

— Bem, acho que nenhum crime precisará ser cometido.

Me levantei indo até ele e ignorando por completo seu comentário. Dei um abraço meio sem jeito nos dois desejando um feliz natal.

Não demorou para que todos estivemos sentados à mesa comendo a comida que tia Helen comprou em um restaurante. Não era a melhor ceia de natal mas, eu estava com minha família. E aquilo já bastava.

Durante o almoço, várias trocas de olhares foram trocadas entre eu e Marley. Nada mais disso.

E pelos dias seguidos, foi a mesma coisa. Apenas olhares, algumas palavras mas, nenhum toque. Aquilo estava me matando.

— Está tudo bem, Adrian? — Marco perguntou quando perdi a partida do jogo que geralmente eu sempre ganhava.

— Estou meio avoado.

— Está avoado há quatro dias? — dei de ombros, reiniciando o jogo — O que está acontecendo? Saudade de Becca?

Não respondi. O choque da realidade veio com força. Becca... Até dias atrás eu estava obcecado em fazê-la me notar novamente e agora, eu nem sequer me lembrei dela. Eu devia estar pensando nela, não? Ao invés disso, estava pensando em outra. Outra que eu sabia que não teríamos futuro.

Marco me encarou, com um vinco no meio da testa. Virei minha cabeça em direção ao barulho na escada, a dona dos meus pensamentos descia calmamente, degrau por degrau. 

de sacanagem, não é?

Fiz careta para meu amigo.

— Relaxa, Marco, não é nada disso que está pensando — levantou uma sobrancelha.

— Hum.

Sorri, jogando uma almofada nele fazendo rir também.

— Vê se joga direito agora.

Te vejo no futuro.Onde histórias criam vida. Descubra agora