Capítulo 25

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Havia um grilo fazendo barulho ao longe, o que não deixava de ser interessante, pois Tommy não estava em uma fazenda. Do outro lado da rua havia um parque, mas sem grilos, até onde ele sabia. Além disso, o bichinho teria de ser muito poderoso para que seu cricritar chegasse até o apartamento. Tommy sorriu, pensando em paisagens bucólicas e em Vida de Inseto. Seu pai era louco por Disney e, quando ele e sua irmã Angie estavam na fase do Barney e seus Amigos, seu pai comprou um videogame de Vida de Inseto para que eles mudassem de ídolo. Foi um fiasco.

Puta que pariu, seu pai!

Tarde demais, Tommy percebeu que não era um grilo, era o interfone, e agora seu celular tocava para acompanhar. A tela dizia que seu pai tentava todas as formas possíveis de entrar no apartamento, o que fazia todo o sentido, porque era dia da mudança.

Ele correu até o interfone e tocou o botão para liberar o portão de entrada no prédio, não sem uma enorme dor no coração, pois era a última vez que faria isso. Devia ter apelado para o valor sentimental do imóvel quando falou com a tia Rê. Do fato de ter sido a primeira conquista dela em Londres, e a duras penas, de sua mãe ter vindo para morar com ela quando era adolescente, e a tia Rê virar mãe da sobrinha, como costumava dizer; das milhares de vezes que a turma, que mais tarde viraria a família estendida, se reuniu ali. De ter sido a primeira casa da Emily, de... Tommy achava que ia chorar.

Nesse momento, seu pai e o dindo passaram pela porta e xingaram quando viram a sala. Estava uma mixórdia sem tamanho e nada, nadinha de nada, havia sido guardado. Tommy não tinha nem colocado um par de meias em uma mala. Nada.

-Caralho – Seu pai falou, olhando em volta. E, dos três, ele era o bagunçado. O dindo, mundialmente conhecido pela organização que beirava o transtorno obsessivo compulsivo, assobiou baixinho.

Tommy imediatamente ficou sem graça e se encolheu da bronca, mesmo que tivesse quase vinte e oito anos e seu pai tivesse o direito de argumentar com ele, mas não de brigar.

-Eu dei uma festa ontem, de despedida. Acho que saiu um pouco do controle.

-Um pouco? Porra, cara, tem um caminhão de mudança aí embaixo esperando a gente! Você comeu merda? - Seu pai não tinha o direito, mas isso não significava nada.

-Calma, bora pensar – O dindo falou. Não era à toa que Tommy dizia para Luca que ele havia ficado com o pai legal. Não conseguia pensar em uma única ocasião ou circunstância que o dindo perguntasse se o Luca ou a Emily haviam comido bosta, principalmente na frente dos outros. - O piano vai ser o maior trampo para levar lá para baixo, porque vai ter de passar pela janela. Enquanto isso a gente vai arrumando bem rápido as caixas com as coisas pequenas. Despacha o caminhão, com o piano e os móveis que você vai ficar, eu vou com eles, e o Tom fica aqui para te ajudar com o que vai para o apartamento novo.

Seu pai botou as mãos na cintura, parecendo contrariado, e por fim disse:

-Ok, chama lá os caras, então.

Os caras eram três homens fortes que imediatamente começaram a examinar a janela da sala e instalar roldanas. Tommy, dindo e seu pai, cada um montou uma caixa de papelão e Tommy ia passando as instruções: DVDs, equipamento de pintura e a maior parte dos livros, esses iam para a casa da mãe; mais livros, roupas, sapatos, cosméticos e higiene pessoal, esses iam para Bloomsbury, além da cama, seu armário e a mesinha de cabeceira, que eram os únicos móveis ali que não eram da tia Rê.

-Melhor você aproveitar e dar uma arrumada no resto também - Seu pai falou, enfiando pés de sapato em uma caixa. - A Rê vai ter um AVC quando vir a merda que você fez no apartamento dela.

-Foi só uma festa – Tommy resmungou, se tocando que certamente não poderia chamar a empresa de limpeza que sempre contratava depois para cuidar dos despojos. - Você devia saber. Sua namorada estava aqui.

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