Mills
— Eu já falei que não quero ninguém sem cinto de segurança! — do banco da frente do ônibus onde eu estava sentada, falei alto, inclinando meu corpo para trás. Bufei! Sinceramente eu não acreditava que Zelena tinha me colocado em uma situação dessas. Ela me paga!
Estávamos indo a Lewiston, cidade vizinha a Storybrooke, onde seria realizada a Jornada Literária. Ariel era a outra professora responsável, na verdade, ela inscreveu a escola no início do ano, antes de eu voltar a dar aulas. Se estivesse na época, nunca aceitaria, se houvesse a possibilidade de eu ser obrigada a ir como estava acontecendo agora. Eu precisaria avaliar os alunos nas atividades que desenvolveriam ali. E sinceramente, Ariel era uma ótima professora, mas era muito amável. Esses adolescentes iam enrolá-la para tirar nota sem muito esforço. Então, colocaria um patamar elevado para ter uma boa nota. Eles teriam que se empenhar muito. Zelena mandou Leroy para ajudar a manter a ordem. Ficaríamos três dias e duas noites. Chegaríamos na sexta pela manhã, e voltaríamos, domingo no final da tarde.
Me arrumei no acento, tentando aliviar a tensão. Pelo menos, Emma Swan não estava indo conosco. Ela e Ruby Lucas teriam jogo. Ruby ainda conseguiria chegar à noite, a sua avó a levaria. Mas Swan, pelo que Zelena me informou, ficaria em Storybrooke, pois teria uma consulta médica para avaliar o seu joelho após a partida. O trabalho para mim seria maior, porque precisaria planejar uma atividade de recuperação para ela, mas o fato de não precisar estar em sua presença, já me aliviava.
Havia passado duas semanas desde aquela situação constrangedora da sala de fisioterapia do ginásio. Swan voltara às aulas, como me prometeu. Mas eu mantive distância. Já que não poderia deixar de dar aulas na sala dela, estava me esforçando bastante em mantê-la longe de mim. Não podia deixar que uma atração física atrapalhasse minha vida profissional. Tantos anos de dedicação não poderiam ser jogados fora. Precisava manter a eficiência em meu trabalho. Coloquei os pensamentos e o juízo no lugar.
Me manter distante de Swan durante as aulas não era uma tarefa tão difícil assim. Ela era uma aluna calada. Agora ainda mais sem Killian. Quase sempre fazia as atividades com Ruby, que não tinha receio de vir até mim tirar dúvida. Swan não apresentava dificuldades de aprendizado. Então o que eu propunha à frente da sala, ela conseguia fazer sem maiores dificuldades. Assim não precisava me aproximar dela.
Claro que a troca de olhares continuou. Eu a via me observando com frequência. Também eu, me pegava em olhares furtivos direcionados à ela. Foi outra coisa que tive que me policiar bastante. Por vezes, ainda não conseguia evitar. Mas depois do quase beijo, Swan deve ter entendido que não ia acontecer coisa alguma entre nós. Ela era minha aluna. Eu uma pessoa casada. A nossa relação deveria limitar-se àquilo que estávamos vivendo agora. Nada além.
Respirei fundo. Cuidar de adolescentes já é complicado, imagina quando não se tem foco? Ter Emma Swan sentada em uma carteira a metros de distância, é uma coisa. Tê-la circulando em palestras, rodas de poesia, refeitório e dormitórios, é outra. Ela tira minha atenção. E naquela viagem, eu precisava mantê-la.
Para minha sorte, Ariel e Leroy adoravam a interação com os alunos, estavam sentados no fundo do ônibus, e conversavam animadamente. Então eu podia manter distância, pelo menos naquele momento do passeio. Fechei os olhos, encostando minha cabeça no banco.
***
Chegamos ao Complexo Literário, que na verdade, era o Parque Complexo Turístico da cidade. O National Park fora alugado para o evento. Ficava próximo à The Pine Tree State, a imensa floresta de pinheiros, tornou Lewiston líder nacional da indústria madeireira.
O local era frequentado por pessoas da alta sociedade do Maine. Era um lugar tranquilo e sofisticado ideal para pescar, cavalgar, jogar golfe, tênis, aproveitar diversas opções de piscinas, entre outras atividades. O parque atraia turistas também por seu designer oriental. O famoso Jardim Japonês era muito visitado.
As escolas particulares de todo o Maine gastaram rios de dinheiro para realizar este evento. Contratar palestrantes, trazer autores e hospedar todos, não era barato. Mas a visibilidade que a imprensa dava ao evento e os patrocinadores compensariam os investimentos. Fora a comoção nas redes sociais com a divulgação da atitude generosa em convidar uma turma de escola pública para participar. Revirei os olhos ao lembrar! Sempre havia um candidato se promovendo com isso. Cora ficou furiosa quando me recusei a participar e ter minha imagem veiculada a algo parecido em um dos anos de meu mandato. Não nego que era uma grande oportunidade de aprendizado para meus alunos. Mas odiava pensar no que tinha por trás de tudo.
Três chalés ficariam à nossa disposição. Dois para os alunos, cada um com quinze camas de solteiro. Tínhamos treze rapazes e Leroy, então não teríamos problemas com o dormitório masculino. Já alunas, tínhamos quatorze, pois Swan não estava. Comemorei internamente quando Ariel disse que ficaria no dormitório das garotas. Ela dormiria na cama que ficaria vaga.
Pelo menos uma notícia boa em meio a tudo àquilo, eu ficaria sozinha no chalé de professor. Duas camas de casal, armário individual e sossego! Sem invasão de privacidade, ou algo para me irritar.
Agradeci por ela se dispor a isso, realmente alguém teria que ficar responsável pela disciplina do local. Eu, nem nos meus piores pesadelos, me via dormindo em um quarto cheia de alunas. Isso estava totalmente fora de cogitação! Zelena sabia disso. Por mim, elas poderiam se estapear naquele dormitório, que eu nem pisaria lá durante à noite.
Adentramos o Complexo. Todos estavam uniformizados e com suas identificações. Ao passar pelo portão, tivemos acesso ao Jardim Japonês. Os alunos ficaram encantados. A maioria ali nunca tivera a chance de estar em um lugar como esse. Apontaram os detalhes, e sorriram com cada foto que puderam tirar.
— Vem, professora Mills! — Belle me chamou quando todo o grupo fazia pose para tirar uma foto em frente à um monumento oriental.
— Senhoria French, eu não gosto de fotos. — falei com um sorriso sem graça, fazendo não com o dedo indicador.
— Ah, vamos sim! — Ariel me agarrou pela cintura e me puxou em direção ao grupo. Fui a passos desajeitados.
Me aproximei. Ariel passou a mão pelo meu ombro. Dei um sorriso amarelo e o guia que nos acompanhava bateu a foto.
Meia hora depois todos já estavam acomodados em seus chalés. A primeira palestra seria em uma hora. Então, daria tempo para um lanche rápido.
— Todos bem? — perguntei sentado ao lado de Ariel na mesa do refeitório. De onde estávamos, podíamos ver toda a turma sentada se alimentado. Eles estavam se comportando melhor do que esperava.
— Sim. As meninas adoraram a decoração do chalé. — deu uma mordida no seu lanche — Tive que arrastá-las para cá. Queriam ficar lá tirando foto. — balançou a cabeça sorrindo.
— Eu não sei como podem gostar tanto de fotos. — revirei os olhos e mordi minha maçã.
— Professora Ariel, qual será o assunto da primeira palestra? — August Booth perguntou se aproximando de nós, olhou de uma maneira nada respeitosa para o decote de Ariel.
— Será sobre Edgar Allan Poe, com uma leitura dramática do poema “O Corvo”. — ela respondeu meio sem graça devido ao olhar.
— Algo mais, senhor Booth? — perguntei ríspida — Porque a professora Ariel precisa terminar o seu lanche sossegada. — o olhei com uma cara nada simpática.
Ele fechou o sorriso sacana na hora.
— Não, era só isso. — respondeu rápido e saiu.
— Esse rapaz é bom aluno. Mas não sabe o seu lugar. — falei fazendo sinal de negação com a cabeça, o vi sentar com os demais.
— Realmente, Booth é inconveniente. — Ariel concordou.
— É um idiota! — concluí. Nos encaramos em silêncio, e no minuto seguinte, caímos na risada devido ao meu comentário.
***
A palestra sobre Edgar Allan Poe foi um sucesso, os alunos adoraram. Durante a leitura de “O corvo” os palestrantes convidaram um voluntário para participar. Eu notava os olhares de indiferença de alguns educandos das outras escolas, os crachás de identificação tinham que ficar visíveis. Portanto, todos ali sabiam quem fazia parte da única turma de escola pública do evento. Meus alunos eram em sua maioria carentes, com pouco pode aquisitivo, e por isso, o preconceito em relação a eles era quase palpável. Aquilo fazia meu sangue ferver. Ariel também percebeu os olhares. Mas nada disse. Não precisou! Pois Belle French mostrou todo o potencial que nosso grupo tinham, quando foi a única a se levantar para participar da leitura junto aos palestrantes. Apesar de sua timidez, ela leu lindamente o trecho proposto, fez ainda, comentários muito pertinentes a respeito da obra. Deixou claro que tudo era questão se empenho e oportunidade.
Depois da palestra, almoçamos, a tarde foi livre para conhecer o Complexo, e fazer o primeiro relatório para nota. O jantar começou a ser servido as oito e acontecia sem contratempos.
Estava terminando de comer, quando Ariel recebeu uma mensagem em seu celular.
— Zelena acabou de avisar que Ruby está no portão de recepção. — pegou seu prato vazio e se levantou — Vou liberar a entrada dela, e mostrar onde vai dormir.
— Tudo bem. — assenti com a cabeça — Vou esperar todos terminarem de comer, e os levo para os chalés junto a Leroy. — falei levando o copo de suco à boca.
Depois de alguns minutos, com todos alimentados, fomos para os dormitórios. Parei na porta do chalé, ele tinha uma espécie de varanda pequena, e uma a uma, vi as garotas entrarem.
— Ruby já instalou os seus pertences.— Ariel disse saindo do dormitório, ela estava lá dentro e eu não a havia visto.
— Ótimo! — disse colocando a cabeça para dentro do dormitório e vendo a maioria das garotas já deitadas.
— Boa noite, professora Mills. — Ruby me viu na porta e veio em minha direção. Tinha um sorriso simpático no rosto.
— Boa noite, senhorita Lucas, fez boa viagem? — perguntei também sorrindo, tínhamos nos aproximado despois de toda aquela situação difícil. Admito ficar um pouco receosa perto dela, pois tinha certeza que Swan havia contado o episódio da sala de fisioterapia. Mas não a trataria mal por isso. Não seria justo.
— Sim! — falou encostando na parede ao meu lado. — Apesar de Emma ser ruim de volante, viemos bem na estrada. — caiu na risada, Ariel a acompanhou.
Ao escutar o nome de Swan um frio veio à minha barriga e eu não consegui expressar reação.
— EU ESCUTEI ISSO, LOBA ! — fechei os olhos e entrei em choque internamente quando a voz de Swan se fez presente atrás de mim.
Virei rapidamente e a pude ver fechar a porta do meu chalé. Arregalei os olhos ainda mais.
— Pronto! Já coloquei as minhas coisas aí, professora Ariel. — disse com um sorriso simpático se aproximando de nós. — Professora Mills! — me cumprimentou acenando com a cabeça. Mas eu nada respondi. Apenas olhei para Ariel com a expressão de estarrecida. Não podia ser!
— Emma vai ficar com a minha cama, já que eu peguei a dela. — sorriu — Espero que não se importe, Regina. — falou como se fosse a coisa mais natural do mundo.
Fechei minhas mãos em um punho. Pude sentir minhas unhas cravadas na pele.
— Ela vai ter uma cama de casal. Isso não é justo. — Ruby falou sorrindo e agarrando Swan pela cintura. Ela também sorriu abertamente, envolvendo Lucas pelo pescoço. — Professora Ariel, posso dormir com Emma, quero ficar de conchinha com ela. — Senti meu rosto pegar fogo.
— NÃO! — disse alto, as três olharam para mim em um susto. — Vocês não podem dormir juntas. — finalizei disfarçando o tom de voz, e falando mais baixo.
— Regina está certa. Vocês não podem. Não aqui! — Ariel falou e voltou a sorrir.
— Que pena! Ainda não vai ser hoje, loirão. — Ruby falou com cara de safada e apertou a bunda de Swan. Revirei os olhos com a cena.
— Sai pervertida! — Swan deu um tapa na mão dela, e se desfez do abraço. Mas Também sorria. — Professora, estou com fome. — falou olhando para Ariel.
— É mesmo! Vou levar vocês para jantar. — foi descendo a escada do chalé, Swan e Ruby a acompanharam — Regina, as meninas já estão deitadas. Em meia hora eu estou de volta para dormir com elas. Vá descansar. Está tudo tranquilo.
Fiz um sinal de sim com a cabeça. Apoiei as mãos na cerca da varanda, e as vi se afastarem em direção ao refeitório. Ótimo! Dividiria o dormitório com a única pessoa que eu não podia. Onde encontraria psicológico para isso? Olhei para o céu, respirei fundo tentado me acalmar.
Me dirigi ao chalé de professor. Entrei e pude ver na cama ao lado da minha, a mochila de Swan. Balancei a cabeça, a minha falta de sorte chegava a ser inacreditável! Pude ver seu celular sobre o criado mudo e um livro de capa azul. De onde eu estava não consegui ler o nome.
Fui ao armário no qual havia arrumado minhas roupas, peguei uma calça jeans preta e uma blusa básica que ficava colada ao corpo. Me troquei rapidamente no banheiro. Me deparei com os pertences de higiene de Swan. Mentalmente eu tentava me conformar.
Coloquei uma bota de cano alto e sem salto. Quando fui pegar uma jaqueta preta, que havia pendurado no pedestal ao lado da porta, pude ver a jaqueta vermelha de Swan. Estava ao lado da minha. Automaticamente parei olhando aquela cena e um sorriso bobo veio aos lábios. Me aproximei e levei meus dedos à jaqueta dela fazendo o contorno de suas formas. Não sei se era real, mas parecia que sentia o seu perfume. Quando dei conta do que fazia, abaixei a mão bruscamente e me xinguei mentalmente. Que papel ridículo eu estava fazendo! Peguei minha jaqueta e sai daquele quarto rapidamente.
Me senti aliviada quando me vi ao ar livre. Fui pelo caminho do pequeno bosque. Olhei para o céu novamente, estava sem nuvens, eu podia ver as estrelas. Ri com ironia ao pensar que tudo naquele quarto agora me lembraria Swan.
Fui para o único lugar naquele complexo que me acalmaria por completo.
— Como está o meu bebê, Billy? — perguntei para o funcionário do haras localizado dentro do Complexo.
— Prefeita Mills, não sabia que viria hoje. — ele se levantou assustado. Estendendo a mão e tirando o chapéu para me cumprimentar.
— Eu não viria. — apertei sua mão — Estou com alguns alunos participando da Jornada Literária aqui ao lado. — expliquei — E por favor, não sou mais prefeita da nada. — sorri educada.
— É o hábito. — respondeu também sorrindo — Rocinante está cada dia mais forte. Deve estar com saudades da senhora.
Eu tinha um cavalo naquele haras. Sempre que podíamos, Robin, Henry e eu íamos passar o final de semana por lá. Às vezes, a rotina da prefeitura era tão estressante, que ia sozinha. Cavalgar sempre foi um remédio.
— Ei, garoto, como você está? — falei me aproximando de Rocinante fazendo um carinho em sua crina. Ele se agitou.
— Viu? Não falei que estava sentindo falta da senhora? — Billy falou, e ambos rimos.
Sai com Rocinante e ganhei os campos extensos do Complexo. Sentia o vento em meu rosto. De olhos fechados, à luz do luar, eu tentava colocar os pensamentos em ordem. A simples presença de Swan nesse passeio já me preocupava desde o início. Tê-la no mesmo quarto que eu, fazia o meu abalo tomar proporções enormes. A minha postura profissional teria que ser impecável! Mas como fazer isso se a cada vez que Swan me olhava, eu sentia um frio na barriga? Como? Se a única coisa que eu queria fazer era esquecer aquele quase beijo, mas era exatamente o que mais povoava meus pensamentos?
Swan mexia comigo. Mexia demais! E eu odiava a bagunça que ela fazia em mim.
***
Voltei ao chalé tarde da noite. Claro que fiz isso de propósito. Ao abrir a porta, o quarto já estava apagado, apenas a luz do abajur do criado mudo de Swan iluminava o ambiente. Ela dormia toda coberta com um lençol branco. Apenas podia ver seus cabelos loiros sobre o travesseiro. Não via seu rosto, estava virada para a parede.
Peguei uma camisola e roupas íntimas, me tranquei no banheiro, e tomei um banho rápido. Coloquei o roupão. Ao sair do banho, Swan estava na mesma posição. Deitei em minha cama, mas não sem antes mandar mensagem mais rude que podia para Zelena. Ela me respondeu pedindo desculpas e dizendo que a tal consulta de Swan tinha sido cancelada. Então claro que ela tinha o direito de estar aqui. Suspirei conformada. Coloquei meu celular no criado mudo. Me virei para o lado oposto de onde estava a cama de Swan, e tentei dormir.
Isso levou um tempo. E não foi tranquilo.
***
Swan
Acordei com as luzes entrando pela janela do chalé. Alcancei o botão do abajur, o desliguei. Me virei de barriga para cima, me espreguicei e coloquei o lençol de lado. Olhei para a cama de Regina, ela ainda dormia. Estava coberta e mal conseguia ver seu rosto, mechas de seus cabelos tampavam a maior parte da visão. Podia escutar a sua respiração pesada. Eu sabia que na noite anterior ela tinha demorado a voltar para o quarto para me evitar. Na verdade, sei que ela estava me evitando desde o dia em que me deu o colar de estrela. Suspirei fundo olhando teto. Não queria que as coisas tivessem ficado tão complicadas.
Peguei meu celular e o horário marcado era seis e vinte. Levantei, fiz minha higiene matinal. Coloquei uma regata preta e um shorts leve. Em quinze minutos saia para minha corrida matinal. Aquele lugar era fantástico. Fiz o percurso em volta dos chalés e depois cheguei ao tal Jardim Japonês. Pelo menos esse era o nome que vi nas placas. Quando o meu cronômetro marcou nove quilômetros, decidi voltar, a primeira palestra seria as oito e meia, pelo que Ariel falou. Precisava de um banho para estar no refeitório as oito.
Quando cheguei no quarto, Regina já havia saído. Sua cama estava arrumada, assim como todas as suas coisas. Ela era bem organizada. A missão de me evitar estava sendo realizada com sucesso! Balancei a cabeça um pouco desapontada. Fui ao banheiro tomar banho.
***
— PATINHO, AQUI! — Ruby estava sentada em uma das mesas do refeitório sozinha. Fez sinal para que eu fosse até ela. — Pensei que tivesse perdido a hora. E aí muito sexo quente com a professora Mills? — falou com aquela cara safada.
— Fala baixo, sua louca! — respondi olhando para os lados. — Se eu soubesse que você ia dar dessas, não tinha te contado nada! — disse fechando a cara e me sentando ao lado dela. Procurei Regina com o olhar pelo refeitório, mas não encontrei. Vi apenas Ariel em uma das mesas à frente.
— Você não é nem louca de quase beijar a professora mais bonita do Maine, passar a mão por dentro da blusa dela, e não me contar. — falou agora baixo me entregando um lanche e uma garrafa de suco. — Eu peguei de uva pra você.
— Valeu! — disse abrindo e tomando um gole.
— Mas e aí, dormiram de conchinha depois? — perguntou voltando ao ar safado. Revirei os olhos.
— Não loba, Regina está me evitando. Você viu durante as aulas. E aqui não está sendo diferente. — mordi meu lanche. — Ela sumiu ontem à noite. Quando fui para o chalé depois do jantar, ela não estava. Até a hora que dormi, não tinha voltado. Acordei hoje ela dormia coberta até a cabeça — ri ao lembrar da cena — Sai para correr, quando voltei, já não estava.
— Nossa, você espantou mesmo a mulher! Que pegada ruim, sapatão! — empurrou meu ombro com o seu, dando risada.
— Se foder, LOBA! — também sorri.
—Poxa! Tô chateada! Pude jurar que ontem ela tinha ficado com ciúmes quando disse que queria dormir com você . — fez bico para baixo. — Shippava tanto!
— Não viaja, ela é casada! — ao terminar a frase, pude ver a figura de Regina aparecer na entrada do refeitório. Estava diferente, usava uma calça jeans escura, uma mini blusa branca, camisa xadrez preta, com tons de vermelho, por cima. Uma bota preta de cano alto. Os cabelos estavam soltos e brilhantes. O batom desta vez não era o vermelho costumeiro, o tom era mais rosado. Seus olhos se cruzaram com os meus, senti um frio na barriga. A definição de beleza tinha sido atualizada mais uma vez. Não é possível que essa mulher não fique feia nunca! Regina Mills era a personificação da beleza. E a razão das minhas respiradas fundas.
— Cara, você tá muito caída! — Ruby gargalhou ao meu lado.
— Cala a boca! — falei sentindo minhas bochechas ficarem vermelhas, abaixe o a cabeça. Pelo meu olhar periférico pude ver Regina sentar ao lado de Ariel.
— Patinho, você comprou um livro de poemas porque ele te faz lembrar dela. — falou batendo a palma da mão na mesa.
— Comprei porque gostei de um poema. Não fala besteira. — franzi o cenho.
— Pra mim você está apaixonada. — engasguei com meu suco.
— E eu lá tenho tempo para isso, loba?— respondi dando de ombros.
Ela fez uma pausa me olhando nos olhos. Parecia me analisar.
— Já esteve apaixonada antes? — perguntou depois de alguns segundos.
— Você sabe que não. — procurei mais uma vez Regina com o olhar, mas ela desviou. Tentei disfarçar, Ruby me olhava atenta.
— Então eu sinto informar que você está com os sintomas. — me olhou de cima a baixo de forma teatral.
— Que sintomas? — tentei usar um tom de deboche, mas aquela conversa começou a me incomodar.
— Vou deixar você descobrir. — disse pegando a sua bandeja e indo até à lixeira.
Terminamos o café e durante todo esse tempo eu tentei manter um contato visual com Regina que me fora negado por ela todas as vezes.
Ariel deu as coordenadas para onde iríamos. Nos dirigimos ao auditório três, a palestra de hoje seria sobre Mário Quintana. Ruby e eu sentamos na primeira fileira, contra a minha vontade, mas não podia fazer muita coisa, minha amiga adorava aquele poeta. Queria ver a análise de todos os poemas de perto. Revirei os olhos. Estava até vendo o tamanho do relatório que ela iria fazer. Regina não tinha estipulado o número máximo de páginas, sofreria para corrigir o de Ruby, ri internamente. Ao final, minha amiga até subiu no palco para uma leitura dramática, foi muito aplaudida. Ruby realmente era genial!
Ao terminar a palestra já era hora do almoço. Comemos, e dessa vez, Regina não nos acompanhou. Teríamos a tarde para elaborar o relatório de hoje. Passei em meu dormitório, estava mais uma vez vazio, peguei meu notebook, e fui até o dormitório das meninas. Sentadas na cama de Ruby, fizemos nossos trabalhos. Na verdade eu fiz, porque ela estava enchendo linguiça.
— Vai demorar muito ainda? — perguntei já impaciente meio deitada na cama olhando para o teto.
— Não estou nem na metade ainda. — respondeu concentrada.
— Meu Deus! — bufei — a maioria das meninas já estão lá fora aproveitando o Complexo.
— Patinho, eu quero uma boa nota. — disse sem nem me olhar.
Revirei os olhos — Ok! Vou dar uma volta! — disse me levantando — Estou com meu celular, quando terminar, mande mensagem. — terminei de falar já saindo do dormitório.
Bati a porta, fui em direção ao Jardim Japonês. Na verdade, era a única coisa que conhecia ali. Mesmo porque, foi por ali que passamos quando chegamos. Fiquei um bom tempo olhando cada detalhe da decoração oriental. Realmente aquele lugar era lindo. Avistei ao longe um local que me pareceu ser um estábulo. Não era acessível, pois ficava do outro lado de uma charmosa cerca branca. Nada que eu não conseguisse pular sem dificuldades.
Cheguei em sua entrada e pude ver um homem sentado com o chapéu no rosto. Parecia dormir. Mas eu não tinha certeza.
— Boa tarde. — disse baixo. Nada.
— BOA TARDE! — repeti dessa vez alto. Ele acordou em um sobressalto. Tirando o chapéu do rosto.
— Adolescentes! — resmungou baixo.
— O quê? — fingi que não tinha entendido.
— Você não pode andar a cavalo. O haras não faz parte do evento que você está participando. — ele falou olhando a camiseta do uniforme que eu usava.
— Não. Eu não quero andar a cavalo. — me apressei em dizer — Eu tenho medo. — falei sem graça — só queria olhar de perto. Posso?
Ele me olhou de cima a baixo. Depois de alguns instantes respondeu.
—Tudo bem! Mas não faça nada que possa deixá-los agitados. — advertiu.
— Obrigada! — abri um sorriso agradecido.
Entrei e pude ver que ali tinha pelo menos uns trinta cavalos, um mais bonito que o outro. Dava para perceber que eram muito bem tratados. Seu pelos pareciam tão macios, que eu não pude conter a vontade de passar na mão em alguns deles. Pelo menos, naqueles que pareciam mansos.
O estábulo era enorme. No final, dele pude ver o cavalo que eu diria ser o mais belo e forte ali. Era totalmente preto. Seu porte, grande. Sua crina, aparentava maciez. Fiquei analisando cada detalhe dele. Me aproximei o máximo que pude, mas não tive coragem de tocá-lo . O que ele tinha de bonito, parecia ter de arisco.
— Pode tocá-lo. Ele não morde! — me virei em um susto. E pude ver quem eu mais procurei com o olhar naquele Complexo, mas quem eu menos tinha visto.
— O ... Oi — gaguejei sem graça.
— Gosta de cavalos, Miss Swan? — perguntou erguendo uma sobrancelha.
— Na verdade, sempre tive medo deles.— respondi envergonhada — Quando eu era pequena andava com o meu pai. Mas sozinha eu nunca tive coragem. E como essa relação paternal deixou de existir — olhei o chão — nunca mais montei.
Ela sorriu e se aproximou do cavalo.
— Este aqui é meu pequeno Rocinante. — falou e fez um carinho terno no rosto do animal. Ele ficou apenas apreciando o contato. Pareciam ter uma conexão forte.
— Você tem um cavalo aqui? — perguntei surpresa.
— Sim. — ela respondeu ainda acarinhado e olhando para o seu cavalo — Cavalgar sempre foi uma espécie de terapia.
Ao terminar de falar, simplesmente abriu o portão, e montou no cavalo, ele já estava selado. Assisti aquela cena surpresa. Tamanha era a sua habilidade ao fazer. Dei um passo para trás com receio. Aquele cavalo era enorme.
Regina ficava linda montando. Abriu um sorriso de satisfação que poucas vezes a tinha visto dar. Fez mais um carinho agora na crina do animal. E estendeu a mão em minha direção.
— Vem? — falou esperando minha resposta.
— O QUÊ? — perguntei não acreditando no convite. E já me apavorando com a ideia.
— Sabe, tem um ditado popular que diz "Se um cavalo selado passar perto de você, suba porque pode ser que ele passe apenas uma vez". — falou aprofundando o olhar no meu. — Não confia em mim, Miss Swan? — perguntou ainda com a mão na mesma posição, e lançando um olhar agora intimidador.
— Na... Não é isso. — gaguejei mais uma vez. Mas não me mexi.
— Não tenho a tarde inteira, Swan. — falou — Ande logo!
Regina Mills impaciente é muito mais assustadora do que qualquer cavalo, seja qual for o tamanho dele. Não pensei duas vezes. Segurei em sua mão, apoiei meu pé no estribo, impulsionei meu corpo para cima. Me sentei em sua frente. Um frio me veio à barriga, quando senti os braços de Regina me envolverem para segurar a rédea. Soltei um gritinho e grudei as duas mãos de maneira desajeitada na sela, quando Rocinante começou a andar. Escutei o sorriso de Regina próximo ao meu ouvido. Os pelos dos meus braços se arrepiaram por tal proximidade. Respirei fundo, tentando disfarçar.
Fomos lentamente por um caminho de pedras em meio ao bosque de pinheiros. O ambiente era lindo, o ar puro. Fizemos o contorno no lago. Fomos em direção a um monte, “Mount Cadillac Acadia” pude ler em uma placa. Regina guiava Rocinante com cuidado, pois o caminho além de úmido, por causa do lago, era cheio de pedras, a medida que subíamos, a grama ficava cada vez mais escassa.
Chegamos ao alto do monte depois de alguns minutos, eu apreciei cada detalhe do percurso, mas a visão de lá de cima era extraordinária. De um lado, via-se todo o Complexo turístico, e isso, já era lindo, mas do outro, era possível ver parte do lago, circundado pelas outras montanhas mais altas. Havia alguns pinheiros que desafiaram as pedras e nasceram por entre os montes. A floresta ficava mais adiante. Era o pôr do sol mais magnífico que já havia visto. A junção de cores no horizonte, deixavam as pedras do topo em que estávamos em um tom arroxeado. Não consegui conter a expressão abobalhada no rosto.
— Eu costumava vir aqui quando adolescente com meu pai. — Ela falou com o rosto um pouco próximo ao meu. Sorriu ao ver minha expressão de admiração. — Agora costumo vir sozinha.
— É lindo! — exclamei, maravilhada. Virei para olhá-la. Nossos rostos ficaram bem próximos. O castanho de seus olhos parecia mais intenso, a coloração da paisagem o deixava ainda mais bonito. Ficamos presas naquela troca de olhares por alguns segundos. Até que ela desviou e fitou o horizonte.
— É lindo sim! — falou respirando fundo.
— Não trouxe mais ninguém aqui? — perguntei, meu nariz quase tocava em sua bochecha, e aquele perfume que só ela tinha, já mexia com os meus sentidos.
— Não. — respondeu em um sussurro, dando um sorriso tímido, abaixando a cabeça sem me olhar.
— Desse jeito vou me sentir especial! — falei abrindo um sorriso largo. E usando um tom de brincadeira.
Ela levantou a cabeça e me olhou. Ficamos a centímetros de distância mais uma vez.
— Só por hoje, eu deixo você se sentir, senhorita Swan! — seus olhos se fecharam um pouquinho, e ela abriu um sorriso lindo e brincalhão.
Eu o espelhei. Nossas risadas se misturaram ao som do vento. E nossos olhares se perderam um no outro mais uma vez.
— Por que não fala com seu pai ? — Ela perguntou depois de um tempo, parando de sorrir e passando o olhar pelo meu rosto. Suspirei fundo, fazendo-me séria.
— Ele nunca foi presente depois que se divorciou de minha mãe. — continuei a encarando — No começo fez muita falta. Mas com o passar dos anos, me acostumei. — fiz um sinal de negação com a cabeça. — Hoje quem não faz mais questão, sou eu. — finalizei sincera.
Ela apertou os lábios e fez um sinal de concordância com um menear de cabeça. Fitou o horizonte mais uma vez. Fiz o mesmo. O silêncio se fez presente. Mas ele não era incômodo.
Senti Rocinante se agitar, deu dois passos fortes nas pedras. Arregalei os olhos em um susto. Meu corpo foi impulsionado para um dos lados, eu não tinha equilíbrio. Segurei na sela. Regina rapidamente puxou a rédea com propriedade e com a mão esquerda segurou fortemente em minha cintura. Cingiu meu corpo em um abraço que transpirava conforto.
— Calma! Eu estou aqui. — falou com aquela voz rouca em meu ouvido. Cada parte de meu corpo se arrepiou.
Fui me tranquilizando. Me encostei nela. Pude sentir o calor do seu corpo em minhas costas. E sua respiração pesada em meu pescoço. Fechei os olhos aproveitando cada detalhe daquela proximidade. Ao contrário do que pensei, Regina não se afastou. Continuou abraçada a mim. Tirei a minha mão direita que segurava na sela e a levei para a sua mão que estava em minha cintura. A repousei ali. Fiz carinhosamente o contorno de seus dedos. A escutei suspirar. Levantou o seu dedo indicador e o entrelaçou ao meu. Ficamos ali até o Sol sumir por completo atrás das montanhas.
Ora eu respirava fundo. Ora eu olhava o horizonte. E por vezes, só fechava os olhos e sentia o abraço de Regina. E a cada vez, tinha certeza que não havia outro lugar no mundo no qual eu queria estar.
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Cinza das Horas (Swanqueen)
FanficRegina Mills é ex-prefeita de Storybrooke, volta a lecionar Literatura na escola da cidade depois de dois mandatos bem-sucedidos. No seu primeiro dia de aula, conhece Emma Swan, uma jovem atleta, que será sua aluna. Emma não pretende ficar muito tem...