Nenhum de nós começa qualquer conversa, mas o silêncio é confortável entre nós. Adiamos até agora qualquer discussão sobre o que fez Leo se mudar e admito que não tenho vontade de voltar para aquele último dia na casa de Rosa. Falar sobre isso de certa forma nos fará reviver. O sentimento de decepção não existe mais em mim e não quero trazê-lo de volta.
- Você não quer falar sobre isso? – adivinha ele.
Mesmo que muitas vezes nesta vida tenha me sentido ignorada por Leo, as vezes ele me percebe de tal forma que parece ler meus pensamentos.
- Não é exatamente que eu não queira falar. – respondo. - Eu quero resolver. Mas mais do que isso, eu quero esquecer. Já passou.
- Acho que pra gente esquecer antes a gente precisa por um ponto final. – diz ele. - Daquela vez, você saiu de casa e ficou em aberto. Até hoje não sei se você considerou aquilo um fechamento e começou uma nova etapa em sua vida. Mas o bater daquela porta não foi um fim para mim. Não houve conversa, não houve decisão nenhuma e eu fiquei a esperar o dia em que você terminaria comigo realmente, ou, como sou um otimista incurável, o dia em que voltaríamos enfim.
- Talvez encarar o que aconteceu, o porquê aconteceu, tenha sido realmente nosso maior erro. - admito.
- Me desculpe por isso. – diz ele, envergonhado.
- Me desculpe também. - respondo. - Acho que, no fundo, me impedi de falar com você em todas aquelas semanas pois não queria tomar essa decisão. Não queria decidir se continuaríamos juntos ou se nos separaríamos para sempre. - conto, mais aberta para ele do que sequer me abria para mim. - Ter essa decisão em minhas mãos era muito peso para mim. Aí Rosa chegou e meio que nos ofereceu este meio termo estranho, mas tão perfeitamente ideal para alguém que estava tão perdida quanto eu. Acho que quis permanecer nesse espaço sem precisar tomar decisões irreversíveis o máximo de tempo possível.
Leo olha pra baixo. Eu o entendo. É difícil olharmos um para o outro com tanta fragilidade e arrependimento pairando no ar. O silêncio é o que temos agora para digerir tantos sentimentos que me invadem, e sei que percorrer por ele também.
- Quando descobri as mensagens no seu celular vi que era tudo fantasia. - solto, agoniada pelas palavras que saem da minha boca, mas sabendo que não consigo guardar mais nada dentro de mim agora que comecei a contar o labirinto que estava minha cabeça. - O meio termo não poderia existir para sempre, você tem razão. As mensagens eram como o tempo decidindo por mim em pedir autorização. Me senti não apenas magoada, como traída. Mas por mim mesma. Pela minha falta de coragem. Pela circunstância, pelo destino, sei lá. Só que era você quem estava ali para ser o culpado, como se você não tivesse tomado uma atitude, tudo continuaria bem, sob controle. Mas isso não é verdade. Nada estava sob controle. Naquele momento, foi como se você tivesse destruído este mundo que desejei ser permanente, pois não sabia como lidar com o outro, o real.
- Eu jamais poderia imaginar que tudo seria assim, que uma coisa desencadearia em outra e que fosse te machucar, seja como for. Eu entendi errado e não percebi nada do que realmente era, eu sou um idiota por não entender, me desculpe. Nunca estive tão confuso em minha vida e não consegui enxergar o quanto você também estava confusa.
- Não se culpe, eu também não me entendia. – admito. – A única coisa que eu sabia era que não queria ser vulnerável de novo e correr o risco de me machucar, principalmente agora, assim. - Olha para minha barriga e a acaricio. - Muitas vezes essa segunda chance me parecia uma armadilha certa. Muitas vezes parecia tudo que eu queria. Para variar, adiei me decidir entre o que apostaria.
- Se soubesse que estava na dúvida, te diria no que apostar - brinca ele.
- Deveria ter te consultado. – continuo.
- Teria sido bem diferente. - completa ele, agora mais triste, e agora quem se sente culpada sou eu.
- Eu não quis racionalizar ou mesmo admitir, mas a verdade é que esses benditos sentimentos foram voltando sem pedir permissão e era tão bom relembrar a parte feliz e sem estresse do nosso passado. E eu queria mais, eu queria de novo. O único problema foi que eu não conseguia dizer isso tudo em voz alta como estou dizendo agora.
- Anna, você precisa saber que eu jamais teria... Se eu soubesse... Eu nunca, NUNCA faria nada que eu soubesse ter possibilidade de te fazer sofrer. Você sabe disso, não sabe?
- Eu sei, Leo. - sim, eu tenho certeza disso. - Acredite, eu realmente quis ficar dias bloqueando sua imagem da minha cabeça e seguir em frente conformada por aquela ter sido nossa segunda chance e não ter dado certo, e pronto. Mas por mais que eu quisesse ficar ressentida com você... não foi bem isso que aconteceu. A minha raiva passou tão rápido que eu mal me reconheci e aquela mágoa gigante a cada minuto se transformava em saudade. Claro que ainda não foi fácil admitir isso para mim mesma, mas eu olhava para aquela cama e estava faltando 1,90m de você ali. E em todo lugar daquela casa eu via sua ausência e queria te ligar para contar quando acontecia alguma coisa boa... Fiquei como no nosso primeiro ano de namoro... Me senti tão ridícula!
Rimos da confissão.
- Agora você sabe exatamente como eu me senti absolutamente todos os dias daqueles três meses sem você, completamente sozinho naquela casa. – diz ele. - E não foi muito diferente agora, naquele quarto de hotel tão vazio.
- É, eu imagino.
- Afinal, por que facilitar se a gente pode complicar, né?
- Estou cansada de complicar. – confesso.
- Eu também.
Leo vira seu tronco em minha direção, pousa sua mão esquerda suavemente na minha face direita e se aproxima aos poucos, como se tivesse todo o tempo do mundo, aproveitando cada milésimo de segundo dessa aproximação. Seus olhos grudados nos meus, dizem mais do que qualquer palavra poderia.
Nossos lábios se tocam como se fosse pela primeira vez. E talvez seja, gosto de pensar neste como o primeiro beijo do resto de suas vidas. Meio brega. Para meus padrões, bastante até. Mas como não ser?
Quando o beijo infelizmente cessa, nossos lábios se separam, mas nossos rostos continuam o mais próximo possível. Sorrisos se estampam no rosto de cada um. Mais uma vez, palavras não são precisas. E mesmo que fossem, seria difícil dizer qualquer coisa agora.
Leo se afasta lentamente, coloca as duas mãos em meu rosto e me beija de novo, agora com mais vontade. Interrompo o beijo ao sentir a parte interna de minhas pernas úmidas. Olho assustada para baixo.
- Ei, o garotão gostou da novidade? – pergunta Leo, animado. Ele passa suas mãos do meu rosto para minha barriga, sem entender o que realmente está acontecendo.
Me levanto do banco, ainda encaixando as peças do quebra cabeça em minha mente.
- Acho que até demais. – digo, abrindo as pernas, por onde vemos um líquido transparente descer.
- Uou! – exclama Leo.
- Acho melhor a gente ir para o hospital. – digo, surpreendentemente calma.
Entramos na loja, andando rapidamente até a porta de entrada. Leo faz um gesto exagerado para chamar Rosa e Jorge, que logo o veem e pedem licença aos convidados, correndo em nossa direção quando se dão conta do que está acontecendo.
Entramos no carro de Leo, enquanto Rosa e Jorge entram no de Rosa. Leo dirige e me pede para inspirar e expirar tranquilamente, o que me faz rir de sua ansiedade.
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Um amor para toda vida e nada mais [COMPLETO]
RomanceNo momento mais desesperado de sua vida, Anna descobre que tudo depende de uma segunda chance. Aos 28 anos de idade, Anna acredita que sua vida já está completamente fora de controle, seja culpa do retorno de Saturno, outro motivo cósmico, cármico o...