Escorrego a ponta de meus dedos sobre o braço de Leo. Esticado sobre a mesa, entre seu prato e o meu, acaricio seus pelos loiros e finos até que minha palma se encontre com a dele. Quase o dobro da minha, lembro como gostava de sentir quando minha mão se perdia dentro da sua, assim como gostava de perder todo meu corpo dentro de seu abraço de urso. Seu toque era capaz de fazer minha mente viajar quando ficávamos sozinhos em silêncio.
Minha cabeça se tornava uma tela em branco, mas era uma alienação boa, relaxante, diferente de agora. As lembranças que a presença de Leo me traz hoje apenas me confundem, me deixam ao limite da sanidade. Preciso de uma força constante para manter o equilíbrio. Sinto novamente minha mão se perder dentro da dele e me concentro ali, apenas no calor que seu toque traz. Quero que ele me acalme novamente.
Sinto a surpresa de Leo com o meu movimento. Quase posso ouvir seu coração bater mais rápido. Me viro para ele, para encarar sua face surpresa, com um sorriso calculado, enquanto ele me encara como se tivesse acabado de levar um choque elétrico. Pelo visto, a conversa com Rosa e Jorge e a empolgação pelo novo emprego também o fizeram se esquecer de que deveríamos estar atuando como combinado, que deveríamos demonstrar o carinho de antes entre uma garfada e outra.
Rosa não é boba e, apesar de não parar um minuto, sei que repara em tudo ao seu redor. Pode não ser hoje, mas se não nos esforçarmos mais, ela logo vai perceber que algo está errado e virá até mim querendo respostas. Prefiro tomar o primeiro passo e falar com ela sobre as verdades que escondo quando for mais apropriado, quando souber exatamente o que dizer.
Olho fundo nos olhos de um Leo sem reação. Permanecemos em um diálogo mudo tempo suficiente para Rosa reparar em nosso gesto e suspirar. Fico aliviada por ela ainda não ter a mínima ideia do que se passa e imaginar uma conversa bem diferente da que realmente está acontecendo.
Rosa repete o suposto romance do outro lado da mesa e encara o marido, adicionando à cena um selinho apaixonado em seus lábios. Após o pequeno e simbólico gesto, Rosa pula da cadeira da mesma maneira que imagino pular da cama assim que o despertador toca.
- Quem quer sobremesa?! – pergunta ela, como uma avó coruja em domingo com a família.
- Oba! – responde Leo, e pela primeira vez sinto como se ele fingisse uma reação empolgada com uma sobremesa. Sua voz emite o som esperado, mas seus olhos permanecem ligados aos meus.
- Mousse de maracujá, Leo! Seu preferido, não é? – pergunta ela, ao voltar para a mesa, colocando o doce entre nós.
- Ah, Rosa. Você sabe mesmo como me conquistar. - diz Leo, enfim soltando seu olhar de mim para Rosa. Talvez ele realmente seja bom nesse negócio de atuar.
- Quem vê pensa que quem está comendo por dois é ele. – brinco.
- Eu sempre comi por, pelo menos, dois, meu bem - retruca ele, entrando no clima e fazendo todas à mesa rirem.
Apesar da empolgação, Leo não desgrudou sua mão da minha por nenhum segundo. É como se nossos dedos entrelaçados tivessem reconectado terminações nervosas que se sentiam confortáveis e completas demais assim para se desfazer.
O pequeno gesto, como um astronauta fincando sua bandeira na Lua, simboliza mais do que palavras poderiam anunciar. Uma felicidade genuína exala de cada um de seus poros em minha direção. Mais uma vez, não consigo me sentir completamente feliz sem sentir medo. Dessa vez, porém, não por mim, mas por ele. Eu não sou a única que posso me machucar com essa situação.
Agora, Leo também tem algo bom acontecendo para ele, e se ele pensar que tudo isso significa que podemos voltar a ficar juntos e ser novamente como antes? Não existe mais novamente como antes, e construir algo novo pode ser uma novidade a mais do que eu aguento neste momento. De jeito nenhum quero que ele pense que tudo pode se resolver tão fácil assim, muito menos entre nós.
É bem mais difícil do que imaginei ficar tão próxima de Leo assim, mas não podemos confundir nossa situação com a realidade. Ele não pode confundir. Enganar a Rosa já é demais para mim, iludir Leo é a última coisa que pode acontecer.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Um amor para toda vida e nada mais [COMPLETO]
Storie d'amoreNo momento mais desesperado de sua vida, Anna descobre que tudo depende de uma segunda chance. Aos 28 anos de idade, Anna acredita que sua vida já está completamente fora de controle, seja culpa do retorno de Saturno, outro motivo cósmico, cármico o...