O Coração de Tleos

46 - Competição

Era um dia agitado, talvez o mais agitado de todo o ano para Gálius. Havia a competição de peleja e também a cerimônia de posse do Oxivonu Lerifan. Um quadrado foi montado no centro do anfiteatro de Tleos. Uma verdadeira multidão estava reunida nas arquibancadas para assistir à disputa. Na galeria real, estavam o próprio Rei-Deus e os mais altos vonu, entre eles, Lerifan.

A primeira luta de Gálius foi difícil, mas venceu, por agir com velocidade e esperteza. Gálius viu seu companheiro de treinos, Merek, perder a luta seguinte contra Yohudu, um sujeito enorme, discípulo de Ragibe. Yuhudu tinha o cabelo preso numa trança curta, atrás da cabeça e era cruel. Ergueu Merek acima da cabeça antes de batê-lo contra o chão com força adicional desnecessária. Merek quebrou um braço, e gritou. Mestre Romlod foi logo socorrê-lo, carregou-o pessoalmente e entregou-o aos templários para receber tratamento.

Mas o ferimento de Merek não tirou a vitória de Yuhudu. Não havia penalizações contra eventuais ferimentos sofridos se os princípios da peleja fossem respeitados. Era comum que lutadores ficassem feridos, especialmente nas competições.

Quem vencer essa próxima vai lutar comigo.

Gálius estava atento ao ver Rigo entrar no quadrado para enfrentar um dos discípulos de Icre. Rigo venceu a luta em poucos instantes, e assim que se levantou, apontou para Gálius com um sorriso no rosto, como se dissesse: você é o próximo!

Gálius sentiu um frio na barriga.

Eu conheço o Rigo. Ele é o melhor do nosso quadrado, mas ao menos o conheço. Ele tem técnica superior, mas a pressão do dia da competição pode afetá-lo. Ele me subestima... Posso usar isso a meu favor.

Ficou tão preocupado com o próximo embate que não prestou atenção nas lutas que se seguiram. Procurou controlar a ansiedade com os exercícios de respiração, 1, 2 e 3. O juíz subiu ao quadrado e anunciou a próxima peleja: Gálius contra Rigo, ambos do quadrado de Romlod.

Gálius subiu respirando e deu uma olhadela na multidão, tentando ver algum parente ou conhecido.

Pelo Rei-Deus! Quanta gente!

Gálius olhou para a galeria Real, no alto da bancada, próxima ao palco. Seu olhar se cruzou com o do próprio Rei-Deus, e nesse instante, sentiu um vazio grande na barriga. Tal foi o desconforto que olhou de lado, e viu Lerifan, conversando casualmente com o vonu Beguino, sem prestar muita atenção lá embaixo. Aquilo tudo distraiu Gálius que só deu por si, quando Rigo avançou para agarrá-lo. Gálius andou de lado, mal escapando da investida. Os olhos de Rigo pareciam rosnar para o oponente.

Ele está raivoso! Até demais! Eu nem estou com raiva dele, afinal eu sou um novato! É um milagre eu estar aqui.

A multidão gritava, então Rigo chegou perto e disse.

— Vou trucidar você, zeno nojento.

Eu não sou zeno. Mas não ligo para esse preconceito barato. A melhor resposta que posso dar a esse idiota é a derrota.

Gálius se concentrou e recebeu o ataque. Rigo não era tão grande quanto o sujeito que derrotou nas eliminatórias, mas Gálius arriscou uma manobra semelhante, afinal, a investida de Rigo vinha acompanhada de uma dose excessiva de raiva.

Vou explorar essa brecha!

Ele abaixou a cabeça, colocando-a, na conta, sob a axila da Rigo. Conseguiu, assim, abraçá-lo na cintura e jogou todo o peso do corpo para trás. O resultado do golpe não foi tão bom, quanto o da eliminatória e Rigo caiu de lado. Gálius tentou rolar para cima das costas de Rigo, mas falhou.

Rigo empurrou-o para trás com um dos pés e Gálius rolou no chão, ficando coberto de areia. A multidão vibrou e os dois se levantaram, mas desta vez, quem partiu para o ataque foi Gálius. Rigo ficou surpreso, pois, o estilo de luta de Gálius sempre fora defensivo. Rigo havia deixado um espaço, pois ficara irritado, com a falha de sua investida e Gálius sempre mantinha em mente o que Romlod havia ensinado.