Ele voltou

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Linda narrando

Foi impossível não reparar em como Caetano estava diferente de quando o vi pela última vez anos atrás. Eu não sabia o que ele estava fazendo, tampouco por quê estava em Salvador ou por quê queria falar comigo.

- Oi, Linda.
- Oi - respondi em tom seco enquanto ele se sentava na cadeira em frente a mim.
- Como você tá? Fiquei sabendo que você acabou de se formar, né?
- Sim, acabei de me formar. E estou ótima. E como você sabe da minha vida?
- Vi uma foto que Gabi postou com você na sua festa.
- Entendi.
- Eu me formei em Design. Sou infografista.
- Que bom - eu só conseguia dar respostas monossilábicas. Quem disse que eu queria saber da vida dele?
- Estou morando aqui tem uns 8 meses já. Estou trabalhando para um jornal local.
- Beleza, mas o que você quer comigo? Por que você me procurou? Foi você que estava me ligando há semanas?
- Sim. Tentei te procurar várias vezes. Consegui seu número com Fábio, nosso colega da época da escola.
- Tá - disse enquanto cruzava os braços - Diga logo o que você quer.
- Primeiro, eu sei que é tarde demais, mas eu quero te pedir desculpas pelo que fiz com você. Eu não tive intenção de te magoar, mas sei que magoei. Fiquei tão envergonhado com minha infantilidade que não tive coragem de falar com você durante todo esse tempo. Mas saiba que tudo que tivemos juntos foi especial para mim.
- Isso não faz diferença mais. Já faz muito tempo e eu segui em frente.
- Eu sei, mas mesmo assim eu te devia isso. E a segunda coisa, é isso aqui - ele disse puxando um envelope dobrado do bolso e me entregou.
- O que é isso?
- Leia, por favor.

Eu peguei o envelope e abri. Era de uma clínica, provavelmente se tratava de um hemograma. Comecei a ler até que percebi que algumas taxas estavam fora do esperado.

- O que significa isso?
- Eu estou com leucemia, Linda.

Aquelas palavras me atingiram quase como canivetes que caíam em forma de chuva em cima da minha cabeça.

- Você tá brincando comigo? Como assim? E por que você não está se tratando?
- Tudo começou apenas como uma suspeita há semanas, por isso te liguei, pois sabia que você poderia me ajudar a entender o que poderia está acontecendo. Essas semanas foram bem intensas para mim por isso. Meu fim de ano foi uma merda, principalmente por ter que ficar aqui em Salvador. Não fiz muitas amizades desde que voltei e não procurei quase ninguém que já conhecia antes. Eu já me consultei com um hematologista e já tenho o diagnóstico fechado. O problema é que para iniciar o tratamento, eu preciso fornecer um contato de emergência no hospital, só que eu não sabia para quem pedir isso.
- Calma, deixa eu ver se entendi. Você quer quer que eu seja seu contato de emergência então?
- Sim. Eu vou dar entrada no hospital hoje à tarde. Amanhã começo as sessões de quimioterapia.

Eu já tinha abaixado a guarda nesse momento, Caetano realmente tinha me machucado muito, mas nunca desejei para ele coisas ruins, tampouco um câncer.

- Caetano, eu gostaria muito de te ajudar e estou surpresa por você pedir minha ajuda depois de tanto tempo. Só que tem um problema nisso, eu estou me mudando para o Rio hoje. Vou fazer minha residência lá e estou indo morar com meu namorado. Ele está esperando por mim com nossas famílias e amigos para inaugurarmos nossa casa.
- Eu não preciso que você  fique comigo no hospital, só preciso que você me dê autorização para te colocar como meu contato de emergência e assine uns papéis lá. Eu não tenho outra pessoa para pedir isso, Linda. Eu pediria para minha mãe se ela estivesse viva.

Quando ele disse aquilo, eu senti um nó na garganta. A única pessoa que Caetano tinha no mundo era sua mãe e eu sabia como
ele era apegado a ela. Deve ter sido difícil para ele perdê-la.

- Tudo bem. Eu aceito - cedi.
- Você tem que ir comigo ao hospital para assinar uns documentos lá, pode ser? Eu estou com muito medo, Linda - ele disse em um tom melancólico e abaixou a cabeça, percebi que ele estava emocionado.
- Eu te levo. Vamos comer alguma coisa antes - respondi enquanto chamava o garçom.
- Vai querer moqueca de camarão? Eu lembro que você gostava - Caetano falou enquanto fazíamos o pedido.
- Da última vez que comi uma não me caiu tão bem - falando isso me lembrei de Bruno e dei um sorriso.

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