57︙☐•

6 2 0
                                    

Eros resmungou enquanto voltava a consciência.

O lado direito da sua cabeça doía tanto que ele achou que iria desmaiar de novo, mas depois de muito esforço, conseguiu abrir os olhos.

Com um grunhido, tentou mover as mãos, mas seu corpo inteiro parecia preso.

Ele piscou, aturdido.

- Acordado, meu querido capitão? - Nicholas estava sentado preguiçosamente numa cadeira em frente a ele, girando uma tábua ensanguentada nas mãos. Eros fechou os olhos enquanto a ficha caia.

- Você nos traiu.

- Que pena que só percebeu agora. Foi muito divertido brincar com vocês.

- Por quê? - Ele olhou desesperado nos olhos de Nicholas. Eros nem o reconhecia, com seu sorriso debochado e as feições distorcidas – Porque tentou me matar, por que colocou a culpa nos meus homens?

- Coloquei a culpa neles por sua causa! - Ele gritou, se levantando e andando nervosamente – Se aquela... aquela puta que você fode não tivesse interferido tantas vezes... e aquele idiota que vive grudado em você não tivesse me atrapalhado... eu teria te matado antes! Mas não, toda vez que eu tentava algo, alguém aparecia para atrapalhar. Tudo foi culpa sua, Eros.

Eros o olhava sem conseguir acreditar.

- Há quanto tempo você está fazendo isso? - Nicholas soltou uma risada jocosa.

- Desde que saímos da Grécia. Você saiu com ordens para treinar aqueles paspalhões, e eu saí com ordens para te matar. Eu tentei diversas vezes, e quase consegui, mas de repente estávamos nesse inferno de lugar e tudo deu errado.

Eros se sentia letárgico. Ele não conseguia entender, por mais que pensasse naquilo.

- Mas porque, Nicholas? Quem te mandou fazer isso? Nós nos conhecemos desde jovens...

- Há! E foi muito divertido ficar na sombra do grande filho do chefe por tantos anos! - Ele apontou a arma improvisada para Eros - Não importa quem deu a ordem, Eros. O importante é que ela será cumprida. Somente assim eu alcançarei a riqueza e glória que tanto lutei para ter.

Eros se perguntou por que nunca tinha reparado no brilho de loucura nos olhos dele.

Recapitulando, existiam vários eventos suspeitos antes, em que Nicholas sumia, tinha algum rompante de raiva ou tentava tirá-lo do Continente.

- O que eles te prometeram? Eu te dou em dobro, Nicholas – Eros tentou, mas o outro olhava em volta freneticamente, quase como se houvesse mais alguém ali com eles.

- Não pode me dar nada porque hoje será o dia da sua morte, capitão – Ele riu, cada vez mais alto, como se tivesse contado uma piada muito boa.

Discretamente, Eros alcançou o pente de marfim que Yanka lhe dera, caído ali perto quando Nicholas bateu em sua cabeça.

Usou suas pontas afiadas para serrar a corda enquanto Nicholas se recompunha.

- Sabe – Ele ofegou, pegando seu arco e encaixando uma flecha – Tentei te matar na maldita tribo Wattu. Aquela flecha era para ter pegado em seu coração, mas por algum motivo o guerreiro com quem estava lutando o fez desviar. E lembra-se quando aqueles idiotas foram sequestrados pela tribo Malo?

- Não havia galinha alguma – Eros murmurou.

- Não, não havia.

Ele sentiu que vomitaria a qualquer hora. Ele realmente não sabia como ainda estava vivo. Nicholas tinha se esforçado muito. Eros o olhou, implorando silenciosamente enquanto cortava a última linha da corda e Nicholas apontava para seu coração a flecha.

- Nicholas, me escuta. Vamos sair daqui juntos. Seus filhos...

- Adeus, Eros – E soltou a flecha.

Eros se jogou para longe, bem no momento em que a flecha se encravou na cadeira. Ele se colocou se pé com dificuldade, a cabeça zonza.

Nicholas o empurrou e Eros caiu de bunda no chão, tentando focar sua visão em algo. O mundo parecia estar girando, mas ele conseguiu desviar dos chutes dele e se arrastar na direção da porta.

- Se acha que vai fugir, está muito enganado – Nicholas riu, perseguindo Eros. – Estou apenas brincando com você, capitão.

Na primeira oportunidade, Eros enrolou suas pernas nas de Nicholas e o levou ao chão também. O que se seguiu depois, foi uma confusão de chutes, socos e gritos. Nicholas golpeou Eros dolorosamente no braço que acabara de recuperar, e na cabeça que ainda sangrava.

Eros urrou, a dor cegando-o. Não só a física, mas a dor de ter sido traído. Nicholas conseguiu prendê-lo entre as pernas e lhe dar uma chave de braço. Em seu ouvido, sussurrou enquanto lentamente enforcava Eros.

- Qual a sensação de morrer pelas mãos de seu subordinado, Eros? Do homem que viveu na sua sombra a vida toda? O que acha...

Com um grito de dor ele foi arrancado dali e Eros rolou, ofegante.

- Eros! – Uma voz familiar gritou do seu lado. Calor e carinho tomaram conta de seu coração. Ele a amava, mesmo que não conseguisse se lembrar de quem era. Mesmo que mal conseguisse abrir os olhos, ele sabia que amava aquela pessoa com cada fibra de seu ser.

Com um sorriso, ele se entregou aos braços frios e silenciosos da escuridão que o esperava.

////

Ele acordou com uma dor horrível na cabeça, o corpo suado e dolorido.

Uma pessoa se moveu ao seu lado quando ele tentou se levantar, empurrando-o suavemente para baixo.

- Shhh. Você está bem agora. Um curandeiro disse que sua cabeça é forte e dura, e nada vai acontecer com...

Sem abrir os olhos, Eros a puxou de encontro ao peito, optando por ficar quieto, desde que ela estivesse ali com ele.

- Bumbo está aqui? – Murmurou, sentindo a sonolência se arrastar pelos seus ossos novamente.

- Não. Apenas a tribo Malo e a tribo Yeta.

- Não deveria estar lá com eles?

- Estamos esperando o restante.

- Hm... – Ele murmurou. O calor de Yanka era fabuloso. – Nicholas...

- Preso. Eros...

Ele se aconchegou melhor de encontro ao seu corpo. Sentia que sua consciência estava lhe escapando.

- Antes meu lugar preferido no mundo era em qualquer lugar longe do meu pai – Ele murmurou, o pensamento se desfiando enquanto mergulhava em um sono restaurador – Hoje em dia meu lugar preferido no mundo é nos seus braços, Panemorfi. Espero estar aqui por muitos, muitos anos...

- Você estará, Yretoo...

E dormiu de forma profunda.  

O despertar de CatiOnde histórias criam vida. Descubra agora