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Seu dedo estava no meio do caminho até a tela, mas o destino decidiu que não seria aquele o dia e a ligação finalmente caiu. Irene suspirou pesadamente e colocou o telefone na mesa de centro. 

— Acho que preciso dar um tempo da tecnologia.

— Então precisaria desligar a tv também — disse Íris em seu pijama com a toalha em volta do pescoço e uma camiseta branca de algodão envolvendo os cabelos.

Irene a chamou para se sentar ao seu lado e ela o fez, então Irene deu play no controle remoto e elas assistiram a mais um episódio. Quando o mesmo acabou, depois de cerca de 45 minutos, Íris se levantou para cuidar do cabelo e Irene aproveitou para ir tomar banho, indo até o quarto para pegar seu pijama. Íris passou creme, definiu os cachos e lavou as mãos para tirar o creme restante, indo em seguida para a cozinha colocar o jantar na mesa e arrumar os pratos e talheres. O jantar sempre era o momento da conversa quando elas estavam ativas ou o momento do silêncio  quando estavam mais reservadas, isso geralmente dependia de como estavam seus humores. Enquanto estavam sentadas, cortando a torta de carne, colocando em seus pratos e provando as primeiras garfadas, que Irene fez questão de enfatizar o quão boas estavam, não demorou muito até que Irene surgisse com o assunto.

— Agora já é "mais tarde", sabe... — disse, enfiando outra garfada em sua boca. Íris suspirou e bateu levemente os talheres no prato, frustrada.

— Por que você quer tanto falar sobre meus problemas se eles nem chegam a afetar nossa relação?

— Porque eu sou sua namorada. Tenho pretensão de casar com você um dia e acho que levo aquele juramento bem a sério: "na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza", et cetera, cê sabe o resto.

— Casar? 

— É... Por quê? Não quer casar comigo?

— Não é isso, é que... acho que está meio cedo para esse tipo de conversa.

— Mas não falei que era pra agora. Só quis dizer que eu não quero que você se incomode e lide com tudo sozinha, Íris, só isso.

— Irene, eu aprecio o que você está tentando fazer e tudo o mais, mas eu não quero ajuda para lidar com esse tipo de problema.

— E porque não? Parece que você nunca quer ajuda minha para nada!

— Não é bem assim e você sabe bem disso. É só que...

— É só que o quê?

— Eu não quero acabar criando dependência de você. Só isso. 

Irene se sentiu meio indignada e chateada, mas não disse mais nada, porque ela sabia que, se dissesse, iria começar a chorar. Ela podia demonstrar não chorar, mas ela era bem sensível, apesar de odiar chorar na frente das pessoas. Depois do jantar, ela foi para a cama e pegou um livro para se distrair, apesar de mesmo 20 minutos depois ainda não ter conseguido se distrair muito bem. Ela então deitou de costas para a porta, se aconchegando bem debaixo das cobertas. Íris percebeu que ela não havia falado nada depois do jantar e começou a entender que ela estava chateada, o que a fez suspirar.

— Lá vamos nós — sussurrou ela para si mesma.

Ela sabia que Irene demorava a aceitar desculpas e era meio rancorosa quando machucavam seus sentimentos, então ela sabia que isso demandaria dias até que ela voltasse ao normal. Íris lavou a louça, apesar de isso ser parte do serviço de Irene desde que elas dividiram os serviços domésticos para que nenhuma delas se sobrecarregassem; organizou algumas outras coisas que estavam fora do lugar e foi se deitar, apagando as luzes restantes. Assim que se deitou e se ajeitou, se aproximou de Irene. 

— Amor, me desculpa tá...

Silêncio.

— Você sabe que eu não falei por mal...

Ainda silêncio.

— Você sabe o quanto eu sofri por ser muito dependente emocionalmente das pessoas, então eu só não quero mais isso...

O silêncio continuou, mas Íris percebeu que Irene relaxou um pouco mais. Íris se aproximou mais do rosto dela e disse.

— Você não vai me perdoar?

Irene manteve o seu silêncio, então Íris sorriu maliciosamente. Iria jogar a única carta que lhe restava na manga e começou passando seu nariz delicadamente atrás da orelha de Irene, que estava com o cabelo esparramado no travesseiro. Irene começou a se arrepiar, mas não deu o braço a torcer, então Íris deu um beijo delicado pouco abaixo da orelha e roçou seu nariz em vai e vem, vendo que Irene ainda não fizera nada além de se arrepiar, pensou: "Aham, tá se fazendo de quem não liga. Vamos ver se vai conseguir manter essa pose por muito tempo". Então, com seu indicador, fez uma trilha brincalhona da orelha esquerda até a nuca que estava a mostra, sabendo que ela não iria conseguir evitar dar pelo menos um suspiro ou tremida. Dito e feito, poucos segundos depois, Irene sentiu o calafrio passando por todo o seu pescoço e se espalhando, o que a fez ficar com raiva, ao invés de excitada, então ela virou de frente para Íris, a impedindo de fazer qualquer outra travessura.

— Para. Não to com humor para gracinhas.

— Não vai me desculpar? — disse Íris, fazendo cara de dó e chegando mais perto dela. 

— Não. 

— Nem se eu te der um beijinho?

— Não se atre...

Irene não conseguiu terminar a frase, já que Íris já a estava beijando. Sua mente estava conflitante com seu coração, já que um queria parar o beijo e o outro não, mas como sempre, ela seguiu seu coração, continuando o beijo por mais uns segundos antes de a razão tomar conta, o que a fez parar e soltar um "argh" frustrado. 

— Pelo amor de Deus, para!

— Por quê?

— Você parece uma sereia, me atraindo pra água, pronta pra me afogar. Eu não quero me afogar Íris!

Íris deu uma risada do comentário, o que fez o coração de Irene bater mais rápido. Às vezes, ela se esquecia que Íris ainda lhe causavam efeitos assim, afinal elas já estavam namorando a bastante tempo, mas seu coração ainda palpitava em certas ocasiões. 


Uma Mesa Para Duas • ⚢ •Onde histórias criam vida. Descubra agora