Uma Mesa Para Duas • ⚢ •

20

Irene sorriu um pouco e esqueceu a mágoa, que se enterrou e foi esvaindo ao mesmo tempo que a risada de Íris ia sendo carregada até os ouvidos de Irene. Não demorou para Íris ir parando devagar com as gargalhadas e respirasse fundo para se acalmar, logo dizendo.

— Eu não sou uma sereia e você não vai se afogar. 

— Eu sei.

— Você ainda não me perdoou né?

Irene ficou uns segundos em silêncio e pressionou os lábios.

— Não. Você me magoou e você sabe como meu coração é rancoroso. Mas você também sabe que não consigo guardar rancor de você por muito tempo.

— Eu sei. Me desculpe por te magoar. É só que... eu criei muita dependência emocional no passado e sempre me ferrei por isso. Então minha razão se recusa a fazer isso de novo. Me desculpe.

— Tá tudo bem, eu sei que é a razão que manda em você.

— E o seu coração em você — Íris disse, abraçando Irene, que a aconchegou em seu peito e a abraçou também. 

As duas acabaram pegando no sono do jeito que estavam.

...

 Assim que acordou com a claridade iluminando todo o quarto, Íris já levantou e foi se trocar. Ela não estava lá tão disposta, mas precisava organizar seus materiais de desenho e os materiais para terminar a maquete que estava fazendo em grupo com mais 3 colegas, então colocou uma calça jeans e uma camiseta, prendeu o cabelo em um coque e pegou sua mochila, já arrumando tudo o que iria precisar. Logo ela iria tomar café e se preparar para ir para seu estágio. Faltavam mais dois meses e ela não teria mais que acordar tão cedo. Isso se Irene conseguisse pagar todas as despesas, se não ela teria que arranjar um emprego de meio período, só de pensar ela já suspirava. Era tão cansativo levar essa vida de faculdade e trabalho, ela realmente não entendia como as pessoas aguentavam. O toque do celular fez seus devaneios desaparecerem e ela se inclinou para pegá-lo e atender quem quer que seja que estava ligando tão cedo.

— Alô?

Uma voz masculina respondeu do outro lado e eles engataram em uma conversa. Irene acordou com a voz de Íris conversando, o que a fez estranhar, já que quando elas conseguiam tomar café da manhã juntas, ambas ficavam em completo silêncio a não ser pelo "bom dia" e pelo "até mais tarde". Íris não era muito comunicativa, mas isso ficava bem mais acentuado quando ela acabava de acordar. Já Irene gostava de manter o silêncio, tanto por seu habitual mau-humor matinal, quanto por gostar de ter um tempo onde ela não precisa falar, um tempo para ela poder apenas ficar na dela e curtindo a companhia de sua namorada. Os cafés da manhã delas era, em sua maioria, desse jeito, a não ser quando uma delas acordava mais disposta a socializar, o que fazia com que elas trocassem mais algumas palavras dos que aquelas duas que mencionei. Irene então levantou e foi até onde a voz vinha. Íris sorriu para ela e sussurrou um bom dia, mas logo terminou a ligação. 

— Quem era a essa hora?

— Sei lá.

— Como assim? Você não conhecia a pessoa?

— Não. 

— Perguntou o nome, pelo menos?

— Não. Eu deveria?

Irene não conseguiu segurar o riso.

— Não acredito que você conversou com a pessoa, não conhece ela e ainda nem perguntou o nome. Isso é hilário e totalmente sem sentido. 

Irene riu mais um pouco enquanto Íris apenas sorriu e foi preparar o desjejum delas. Ela gostou de ver que conseguiu desviar o mau-humor de Irene, fazendo ela rir. 

... 

Íris já havia saído e Irene estava se arrumando para ir trabalhar quando seu celular começou a tocar, ela olhou e viu um número não salvo, mas que ela gravou em sua memória de tanto que esse número lhe fazia ligações. Dessa vez, ela não hesitou e atendeu.

— Alô? — disse, visivelmente irritada.

— Irene...

Ela logo reconheceu a voz e revirou os olhos, mais irritada ainda.

— Como conseguiu meu número?  

— Por favor, vamos conversar...

— Vou repetir mais uma vez. Como conseguiu meu número?

A voz do outro lado da linha bufou e disse.

— E isso importa?

— Importa, sua stalker maluca. 

— Eu? Stalker?

— Pois é, que ironia, não é mesmo?

Irene tirou o celular de perto da orelha e tocou no botão vermelho, encerrando a chamada.

Hoje seria um dia estressante, pelo jeito.