Uma Mesa Para Duas • ⚢ •

28

No dia seguinte, Íris se xingou internamente por não ter conversado o que queria com Irene. Agora que já estavam planejando uma viagem juntas, ficaria mais difícil tocar no assunto. Mas ela estava determinada, então decidiu que ia tentar depois da sua aula, se não terminasse tão tarde e se ela não dormisse assim que chegasse. Mas por agora, ela precisava se arrumar para ir trabalhar.

Irene acordou com seu mau-humor habitual e Íris já não estava mais lá. Ela estava no seu segundo gole de café com leite quando olhou no relógio da cozinha, agora acordada o suficiente para distinguir o que são números e horas, e percebeu que estava atrasada. Então ela se levantou rapidamente e foi vestir seu macacão preto que já tinha organizado no dia anterior.

— Esse tipo de roupa é uma benção e... Uma maldição — ela disse, puxando o zíper com certo esforço e colocando o tênis. Ela se recusava a ir trabalhar de salto e deixou isso claro quando suas colegas a tentaram persuadir. Depois pegou sua bolsa, seu celular e terminou o café com leite, por que deixar estragar jamais seria uma opção. Saiu 8 minutos exatos depois que olhou o relógio. Teriam sido 5 se não tivesse parado para terminar o café com leite.
Irene pegou o elevador e com mais 20 minutos, estava estacionando na frente do estúdio. Hoje veria se Maitê estaria por lá e perguntaria sobre a ideia da viagem. Estava caminhando em direção à porta quando seu celular tocou. Ela o pegou e atendeu:

— Alô?

— É a Irene que está falando?

— Sim, eu mesma. Quem gostaria?

— Então senhora Irene, queremos lhe fazer uma proposta...

...

Íris estava mais dispersa naquele dia de trabalho do que jamais esteve e sua chefe percebeu, perguntando se ela estava bem. Ela respondeu que sim, apesar de não estar realmente bem. Sua mente estava uma confusão e ela queria muito se abrir com Irene, mas não sabia como. Parecia que Irene estava sempre ocupada, que nunca tinha tempo para ela. E Íris estava cada vez mais cansada disso, da falta de contato.

Durante o almoço, conversou com Laura, que a ouviu pacientemente para só depois dar sua opinião.

— Você não acha que talvez isso seja um sinal para você procurar pessoas novas?

— Não sei... Eu amo muito ela sabe... Mas ela tá sempre ocupada com o trabalho e com as coisas de escritora dela...

— E você não? Você é estagiária e estuda de noite. Já parou para pensar que ela talvez se sinta da mesma forma?

— Acho que não, se não ela teria mencionado algo... Ou teria mudado... Ela nem notou que eu estou diferente. 

— Então parece que essa relação é meio unilateral.

— Você acha?

— Pelo o que você está dizendo, sim. E, se for mesmo unilateral, melhor você cair fora dessa relação antes que acabe se machucando.

— Não sei não...

Laura deu de ombros e mordeu seu sanduíche, que ela segurava com as duas mãos.

— Pensa bem — falou com a boca cheia e voltou a mastigar.

...

Logo após a aula, Íris se juntou aos seus colegas mesmo não estando afim. Eles a tinham chamado para beber um drink e ela concordou, desde que fosse apenas  um.  Ela bebeu aquele um... depois mais um... e um outro. Esquecendo totalmente de que era fraca para bebidas. 
Estava "meio alta" quando pegou um Uber para voltar para o apartamento e "meio bêbada" quando subiu de elevador e errou algumas vezes na hora de colocar a chave na fechadura. Irene abriu a porta e olhou para ela, com um sorriso. Íris engoliu em seco, ficando mais sóbria na hora. Entrou e Irene voltou para o fogão, terminando de mexer o que quer que fosse. Íris se jogou no sofá e lambeu os lábios, nervosa. Estava tentando tomar coragem para iniciar a conversa. Mas Irene foi mais rápida.

— Ai, você nem sabe a novidade que tenho para te contar. Mas antes, você está bem? Parece bêbada e pálida — disse, olhando para Íris com os olhos brilhando em um misto de animação e preocupação. 

— Estou bem. Bebi um pouco com meus colegas.

— Entendi. Mas então, deixa eu te contar...

Antes que Irene conseguisse terminar de falar, Íris juntou as migalhas de coragem e a interrompeu.