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No dia seguinte, Íris pegou sua mala de viagem e colocou algumas roupas dentro. Ela voltaria quando Irene estivesse fora para pegar o que restasse. Ela se sentia doente, mas não tinha certeza se era por conta da bebida do dia anterior. Se apressou e saiu antes que Irene acordasse, pois não seria capaz de olhar em seus olhos. Foi para a casa de sua mãe e deixou a mala na sala de estar, sem dar muitas explicações à ela, apenas prometendo que conversariam mais tarde. Estava tão mal que apenas queria ocupar sua cabeça com qualquer outra coisa que não fosse Irene. Literalmente qualquer coisa. E nesse momento, ela ficou extremamente agradecida por seu estágio. O que antes era um fardo, por um momento pareceu sua salvação.
Essa foi o único dia em que se empenhou tanto no estágio que até sua chefe notou que havia algo a incomodando. Mas ela não perguntou. E Íris guardou aquilo a sete chaves.

"Resolverei isso mais tarde" foi a sua regra mental durante todo o dia e parte da noite enquanto estava na aula.

...

Irene, talvez pela primeira vez, se permitiu sofrer e chorar tudo o que sentisse necessidade. Não teve vergonha daquele sentimento, como geralmente tinha. Seu orgulho era tão grande que a impediu de sofrer na maior parte de sua vida, mas não dessa vez. Nesse dia fatídico, Irene deixou que seu coração quebrasse, murchasse, explodisse e embargasse o quanto fosse necessário. Se permitiu sentir de verdade aquele sentimento como se fosse qualquer outro. E foi a conformação que a fez levantar da cama quatro horas depois que acordou, com o barulho de Íris abrindo as gavetas.
Olhou para o relógio e se viu atrasada em pelo menos meia hora e agradeceu por ter terminado toda a edição. Se levantou, limpando as lágrimas restantes e foi até o banheiro para lavar o rosto e se trocar, mas assim que enfiou a blusa de manga comprida pela cabeça e braços, ouviu o toque de seu celular. Ela ergueu a sobrancelha e atendeu.

— Alô, Maitê?

— Fala gata, como cê tá?

— Tô numa montanha-russa só que sem o cinto de segurança, e você?

— Menina, tô na correria. Hoje vamos fazer um trabalho juntas. Bota um cropped, prancha o cabelo e bora gata. Passo aí em meia hora pra te pegar, fique pronta.

— Nossa, então tá né — disse Irene, rindo da rapidez de Maitê. Ela estava elétrica demais.

— Então bota essas perna pra funcionar mana. E depois quero saber mais da montanha russa. Mas primeiro, trabalho. Beijo. Até.

Ela nem deu tempo de Irene se despedir e desligou, fazendo Irene rir e ir colocar a roupa simples que escolheu. Maitê era sempre em 8 ou 80, nunca um meio-termo: ou extremamente elétrica, ou falava uma única palavra durante um dia inteiro. Se fosse a questão de bateria social, ela devia ser a bateria de um iPhone, vai de 100% a 10% com uma rapidez impressionante.

Irene terminou de se trocar e fez um rabo de cavalo. Pela primeira vez, notou o quão grande estava seu cabelo, quase chegava no meio das costas.

— Acho que chegou a hora de cortar — disse, puxando bem os fios para prendê-los. Olhou por um ou dois minutos e decidiu que um coque doeria menos, então enrolou o rabo de cavalo e passou o final por dentro do elástico, prendendo-o.

Depois pegou sua bolsa, seu celular e sua câmera, colocando tudo dentro da bolsa e pegou suas chaves, dando um olhar triste para o chaveiro, mas respirou fundo e foi até a porta, saindo e a fechando, trancando e depois jogando a chave dentro da bolsa. Não havia passado meia hora ainda, mas Irene não estava mais querendo ficar dentro de casa, então achou uma oportunidade perfeita de comprar um pão de queijo na padaria, então desceu do elevador e fez seu caminho até a padaria da esquina, entrando na mesma e sentindo e cheiro de pão assando. Devia ser a segunda ou terceira fornada do dia e estava com um cheiro delicioso, mas assim que ela olhou o pão de queijo, já o pediu, ficando com água na boca. Enquanto o atendente empacotava, ela se virou para a geladeira e pegou um Toddynho. Essa era a vantagem dessa padaria, as coisas tinham uma posição dinâmica e era praticamente vazia nesse horário. Irene pagou por tudo e agradeceu, saindo e já tirando o pão de queijo enorme de dentro do pacote de papel. Mordeu um pedaço e sorriu ao sentir o recheio inesperado.

— Catupiry. Que delícia. — pensou alto e com a mão esquerda balançou o toddynho, dando uma de equilibrista para enfiar o canudo sem derrubar nada. Sugou o líquido marrom e jogou a cabeça para o lado levemente. Aquilo podia ficar melhor? Não, não tinha como, era uma combinação perfeita. Simples assim.

Chegando no seu prédio, encostou na entrada e mordeu o último pedaço de pão de queijo, mastigando devagar para durar mais tempo, e observando o carro azul cobalto parando à sua frente e o vidro abaixando, revelando a garota de cabelos castanhos, e com ondas tão definidas que dava inveja, usando um óculos de sol.

— Entra aí gata. E quero um gole desse teu toddynho.

Irene riu e entregou a caixinha para Maitê, e indo até o outro lado do carro, abrindo a porta do passageiro e entrando.

Uma Mesa Para Duas • ⚢ •Onde histórias criam vida. Descubra agora