VI

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                        Point Of View Gabriela

Me despedir de Sheilla, das garotas e de todas as lembranças de um dia agitado e folgaz foi doloroso, como um choque de realidade me trazendo de volta para o mundo real. Ainda sinto minha bochecha dolorida de tanto sorrir, o doce do chocolate na ponta da língua, a sensação do toque e o peso das crianças no meu colo. O cheiro do seu perfume ainda está impregnado em sua roupa, que mesmo com muita insistência da minha parte, ela não aceitou de volta. E o aroma doce de Jasmim continua presente, trazendo lembranças de uma noite de primavera, mesmo que no inverno, quando o perfume se torna ainda mais exótico.

A postura séria e firme da mais velha não é um personagem, sinto com a certeza de que preserva a imagem de durona, inalcançável e arrebatadora como forma de segurança. Contudo, quando se sente à vontade, se permite ser uma pessoa completamente diferente: O olhar analisador abre espaço para o acolhedor, o sorriso caçoador a uma gargalhada alta e a voz ríspida não se manteve por muito mais tempo. Ao mesmo tempo que Sheilla é idêntica ao que eu imaginava, ela é completamente diferente. E não consigo parar de me sentir agitada por tê-la conhecida desse jeito e ter tido depois de tantos dias ruins, um dia tão incrível que nem mesmo consigo descrever.

Não devo ser hipócrita, me incomodei algumas - várias - vezes pela mais alta não se recordar de mim. Digo, eu tenho um nome conhecido agora, ela até mesmo me segue no Instagram, ainda que eu e nem ela postamos fotos faz alguns meses, mas ela devia saber quem sou eu. Mas nada! Ela apenas me fitava de cima até embaixo, cerrava as sobrancelhas como se estivesse quase lembrando, sorria como se portasse na ponta da língua, e então, quando eu pensava que viria, ela dizia: "Você me lembra muito alguém." e eu respondia, divertidamente, com um "Espero que seja um alguém bonito." e ela se contentava em apenas rir, concordando com a cabeça. Ela definitivamente não vai se lembrar.

Meu primeiro passo para dentro de casa foi em silêncio, reparando a maioria das luzes apagadas, ainda que não sendo tão tarde para isso. Estranhei o repleto silêncio na sala, mas não o suficiente para me importar, minha mente está muito longe nesse momento para achar algum problema nisso, estou mais preocupada em controlar meu sorriso para não rasgar meu rosto. A chuva não está mais tão invasiva, controlada o suficiente que eu nem mesmo ouço mais o atrito e o clarões pelos raios não são mais realidade faz algum tempo. Liguei apenas uma luz da sala que já me permitiu enxergar umas peças de roupas jogadas pela soalho, peças que não são minhas e forçando bem a memória, não parecem ser de Lorenne também.

- Chegou a princesa Haya. Onde estava, fugitiva? Fiquei preocupada. - A voz de Lorenne soou atrás de mim, me fazendo dar um salto no lugar pelo susto, levando a mão ao peito tentando normalizar meus batimentos.

- Credo, Lorenne! O que faz no escuro como o Batman? - Questionei virando para ir ao seu encontro, vendo seu rosto pela primeira vez. Cabelos desgrenhados, apenas de roupa íntima e uma garrafa de água em mãos. - Garota, vista uma roupa, você não vive sozinha.

- Como se você nunca tivesse me visto assim antes. - Deu risada caminhando em direção ao quarto no corredor, acompanhei seus passos. - Mas sério, Gabi, eu morri de preocupação hoje. Fui na cafeteria te buscar e soube da confusão, e então, refiz 100 vezes o caminho de lá até em casa e não te encontrei pelo caminho. Você precisa parar de sair sem o celular.

- Eu sei, desculpa! Devia mesmo ter conseguido um jeito de te avisar que estava tudo bem. - A culpa me acertou em cheio, eu também teria uma crise de preocupação se estivesse em sua posição.

- Mas então me diga, o que estava fazendo? Onde estava? - Perguntou mais uma vez, abrindo a porta do seu quarto e dando permissão para que eu passasse também. Metade das roupas estavam espalhadas pela sala porque a outra metade estava aqui, em absolutamente todos os cantos. Revirei os olhos ao entender o que acabara de acontecer ali, vendo uma Juma sonolenta embaixo das cobertas levantando as mãos apenas para pegar a água.

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