Point Of View Narrador
O salão escolhido por Rosamaria, e apenas acatado por Carol, era imenso. Gabi nem sabia que sua amiga conhecia assim tantas pessoas, cruzavam pela entrada a todo tempo. Todas fabulosas. Calçavam coisas nos pés que não paravam de fazer um barulho irritante a cada passo dado. Nunca entendeu porquê jogadoras de vôlei precisam de um salto, como se o 1,96 já não fosse suficiente. Mas, ela até que gosta disso.
A cada nova pessoa conhecida que passava a chamando e tirava sua atenção da carta, ela reiniciava do zero e cobria com as mãos o restante. Não queria receber um "spoiler" do que viria no final, queria ler tudo sequenciado e sem interrupções. E foi somente então que notou que não conseguiria isso ali na frente, a demanda de pessoas não parava de aumentar e ela continuava na metade do primeiro parágrafo.
Dobrou o papel e decidiu andar até um outro lugar, algum que ao menos estivesse mais vazio. Ao lado do salão alugado havia um beco, só não estava breu pela luz do dia e um único espaço aberto. Era um estúdio de tatuagem que, mesmo sem querer julgar, achou um absurdo estar em um canto tão precário. Cheirava a cerveja passada, cigarro e madeira molhada. Gabriela preferiu não prestar tanta atenção nessa parte ou iria enlouquecer.
- Certo, deixa eu ver isso.
Fitou pela segunda vez todo o início, gostou da escolha feita para a cor da caneta e se derreteu pelo cheiro de Sheilla ainda predominar forte ali. Gabi riu ao ler de Sheilla sobre sua mania de quebrar promessas; "A prometedora mais falsa que conheço."
E quando descobriu que Castro sentia sua falta, precisou parar por um tempo e puxar forte o ar para o corpo. Foi a pior ideia que teve, esqueceu-se que o ar naquele senda era contaminado. Voltou a ler quando superou o mal estar.
Encarando a pixação no muro da frente; "Amor, sexo e ódio" e as duas únicas pessoas dentro do estúdio, precisou parar pela segunda vez ao ler que ela estava em site de horóscopo. A esse ponto, já tem certeza que a carta não será algo ruim e não está mais tão cuidadosa em ler tudo lentamente, quer que acabe logo para correr atrás dela o quanto antes.
E então, em quatro minutos, Gabriela leu todo o restante. O 143, que passou despercebido por Mia, foi o ponto alto para a garota de olhos mentolados que, pela primeira vez no ano, teve lágrimas por um bom motivo.
- Ela me ama. - Ficou estática processando essa informação, não deu nenhum passo pelos seguintes cinco minutos.
Nunca tinha associado Sheilla a palavra amor. Associou à carinho, paixão, cuidado, zelo, eternidade, namoro, lebenslangerschicksalsschatz. Mas nunca a amor. Sempre fora a mais intensa com Sheilla e antes mesmo de acabarem, resolveu começar a ir com mais calma; por algum motivo, ela já imaginava que a mais alta havia tido alguém antes. Sentia sua precaução sempre que avançavam um degrau, não queria pressionar ainda mais.
Uma semana antes de romperem, parou de vincular a mulher a toda nova música melosa que conhecera. E mesmo que Sheilla a esquentasse em todo beijo, não comparou sua existência com Gosto de Sol.
Na ponta da língua, Gabi já sente o gosto de aurora e o fervor sob a pele. Sheilla ilumina os seus dias, mas queima o teu corpo.
Gabriela todo o tempo a chamou de sol; a cada tapa, uma nova marca.
Resolveu que era melhor deixar essa sensação de lado até estar com Sheilla, poderia pensar nisso depois. Agora, no entanto, está mais preocupada em pensar em uma forma de explicar o acontecido e recuperar o tempo perdido. Ou o tempo investido, talvez.
Ensaiou sua saída da viela algumas vezes, mas sabia que quando saísse seria o momento de falar. Já está muito traumatizada de mau-entendido para estragar tudo por não saber se justificar.
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Coffee Break | SHEIBI
RomanceGabriela é uma jogadora de vôlei bem sucedida, a melhor da sua posição, mas em decorrência da pandemia teve que sair da Turquia e voltar para o Brasil. Na intenção de não ficar parada e nem sozinha, Gabriela aceitou um emprego em uma cafeteria no Mi...