Capítulo 20

26 13 17
                                    


Era estranho estar ali. Embora eu passe boa parte do meu dia na escola, ter faltado ontem mexeu com o meu relógio biológico, como se fosse meu primeiro dia de aula, e ao mesmo tempo sabendo exatamente como funciona. Eu me perguntei como seria olhar para Benjamin depois de um beijo daquele; ele olharia para mim da mesma forma?

Conelly chegou, e ainda que a maioria não pareça gostar dela, imediatamente se sentaram e começaram a folhear os cadernos até encontrar a matéria de filosofia.

A professora elegante com seu terninho – nem parecendo que saiu de casa daquele jeito para dar aula para uns babacas que nem ligavam para ela –, escreveu a palavra razão na lousa e meu corpo arrepiou pela sensação de déjà vu. Tanto que me perguntei se o tempo de fato estava passando. Então, olhei para o lado. Tyler parecia estar em outro planeta; ele me fez ter certeza de que o tempo estava passando, porque naquele dia que eu o conheci, eu jamais perceberia isso. Jamais perceberia que o recém conhecido carregava o peso de seu próprio mundo nas costas, assim como muita gente. Mundos acabando e recomeçando a todo momento, e alguns ansiosos para que a aula acabe logo. A aula acabará, babacas, podem apostar nisso.

Sinto minhas bochechas esquentarem quando me dei conta de que estive encarando Tyler por todo esse tempo de retiro para o meu próprio mundo. Ele me lançou seu sorriso mais simpático, com seus dentes brancos que mais lembravam um farol de tanta luz que pareciam exalar. Pensei em como tenho sorte de tê-lo conhecido. Mas nem toda luz poderia me cegar a ponto de que eu não o visse entrando pela aquela porta, jogando seus cabelos castanhos para o lado como se nada pudesse atingi-lo de onde estivesse. Não olhou para os lados, muito menos para mim. Na verdade era como se ele tivesse uma espécie de visão raio-x, não para ver aquelas pessoas por dentro, mas seus olhos ultrapassavam qualquer parede ou qualquer corpo e só descansavam bem longe dali.

Seu corpo se acomodou na cadeira e ele não pareceu o tipo de pessoa que prestaria atenção em qualquer coisa que a professora dissesse.

 – Ok, vocês já devem estar fartos de ouvir eu falar sobre razão, então, essa é a última aula que vamos falar sobre isso e depois partimos para o próximo conteúdo, certo? Tudo bem. Que relação o amor tem com a razão?

Tentei não olhar para Benjamin, o que em si foi uma das coisas simples mais difíceis de fazer, já que certamente meu olhar imploraria para ele responder àquilo.

 – Eu não diria "relação". O amor me parece uma maneira de entreter a razão. – Tyler olhou para mim, esperando que eu dissesse algo. Eu não sou tão previsível assim, sou?

Levantei a mão e Conelly não pareceu surpresa, mas só agora tinha notado minha presença.

 – Hum, não acredito muito nisso. Muitos pensamentos surgem com um amor, o que significa que pensar faz parte de amar. – o encarei, fingindo uma confiança. Logo sua risada satírica soou por toda a sala silenciosa.

 – Ok, e aí você faz o quê? Ouve seu coração? – seu tom carregara um sarcasmo agressivo, cujo eu não estava acostumada. Ele não estava me provocando por prazer, mas me atacando, como se do dia para a noite tivesse adquirido um ódio sem fundamento.

 – Por que a irracionalidade é vista como algo, hum, ruim para você?

 – Tudo que foge de raciocínio geralmente é ruim, não acha? – ele franziu as sobrancelhas e percebi que aquela era um tipo de pergunta retórica, e tenho a impressão de que ele não estava um pingo preocupado com o que eu achava.

 
 – Não acredito nisso. Muitas pessoas acham, por exemplo, os animais irracionais, mas acho que é uma questão de perspectiva. Humanos tem o hábito de achar que são o centro do universo, e que se não entendem algo é porque o problema é dessa coisa, e não deles. Mas acredito que muitas vezes não percebemos a, hum, capacidade cognitiva de alguém porque não sabemos como nos comunicar com ele. – eu disse, parecendo mais um desabafo do que um argumento. Segurei a respiração para tentar conter a ferocidade do meu coração, enquanto meus dedos brincavam no meu colo.

O Preço do AlvorecerOnde histórias criam vida. Descubra agora