10| ᴄᴏɴᴛʀᴀ ᴠᴏɴᴛᴀᴅᴇ

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LEON

QUANDO EU ERA pequeno, meus pais criaram o costume de pedir pratos especiais no meio da semana como forma de agregar os laços familiares e acabou se tornando um dos meus melhores momentos com eles.

— Como anda a escola, meu amor? — Minha mãe se aproximou de mim, no sofá — Arrasando muitos corações? — Demos risada.

De repente, a campainha tocou e eu imediatamente levantei e fui abrir a porta. Dando de cara com Eric, usando uma blusa moletom verde amarronzado, calça jeans escura e um all star preto surrado.

— O que merda você tá fazendo na minha casa essa hora? — Perguntei franzindo minhas sobrancelhas enquanto ele, envolvia os braços em torno de si.

— É que meus pais brigaram, posso dormir aqui essa noite? — Manteve os dentes pressionando o lábio inferior, esperando uma resposta minha.

Somos amigos há um considerável período de tempo mas nunca dormimos em ambas casas e, falando a verdade, queria que continuasse assim, eu sempre quis manter um enigma sobre minha família e tentar ser mais reservado, como pedem meus pais diariamente.

— Prometo que amanhã de manhã irei embora, meu pai ficou bravo demais e minha mãe pediu que eu dormisse fora pra ele esfriar a cabeça — Estalava os ossos da mão constantemente.

— Pode até dormir aqui só não conta nada da minha vida, meus pais acham que eu sou um garoto estudioso e espero que eles continuem pensando assim — Ele assentiu e entramos logo depois.

O apresentei e fiz a mesma pergunta, torcendo por uma resposta negativa.

— Claro que pode, assim acrescentamos mais uma pessoa na nossa noite — Eric já foi se sentando perto deles todo sorridente — Vocês são amigos há muito tempo?

Eu sentei num outro sofá que estava vazio, observando a atitude sorrateira.

— Há um ano, mais ou menos — Começou a admirar o lustre, a lareira, a escada e o piano — Parabéns, é um lugar lindo.

— Obrigada, fazemos de tudo para que seja confortável para o Leon, as pizzas irão demorar um pouco então, você quer tomar ou comer alguma coisa?

— Agradeço mas, não quero nada, já foi muita gentileza me aceitarem hoje.

Minha mãe é uma mulher muito acolhedora e quer sempre fazer com que todo mundo se sinta importante, me acostumei com ela cuidando das outras crianças nas festas familiares, criei uma barreira emocional em relação a nós dois.

— Vou arrumar a mesa, já que a doméstica já foi embora — Ela sorriu com os olhos — Quer ir comigo, querido? Assim deixamos os meninos sozinhos...

Mexeu a cabeça em tom de concordância e, em sequência, saíram lado a lado.

— Por que você nunca me disse que seus pais eram assim? — Perguntou sorrindo como uma criança quando ganha doces ou brinquedos.

— Porque você nunca me disse como são os seus — Deixei meu cotovelo sobre o braço do sofá e minha mão apoiada na têmpora.

— Leon, você sabe que meus pais mais brigam do que vivem em harmonia — Ficou roendo a unha — E por que toda essa descrição comigo? Você fala tantas coisas pra mim, como suas ficantes ou suas possíveis paixões.

— É mas, nem todas são verdade.

Eric mudou sua expressão completamente, consegui ver a vergonha e a decepção no olhar, agora eu tive certeza de que nossa convivência nunca mais seria a mesma. O som da campainha ecoou mais uma vez.

— Pode ir pra sala de jantar — Falei indo abrir a porta — Fina no final daquele corredor.

➝➝

— Sabe Eric — Meu pai cortava uma fatia de pizza doce — O Leon não é de nos contar sobre a vida estudantil e já que temos essa oportunidade — Sorriu — Como ele é na escola?

Um nó se formou na minha garganta e simplesmente não consegui engolir o pedaço já preso no garfo, eu não estava com medo dos meus pais porque sei que eles nunca fariam nada grave comigo mas, tenho receio das palavras que Eric pode usar contra mim.

— Talvez eu não seja a pessoa certa pra dizer isso — Bebeu um gole de suco, me aliviei um pouco mais — Mas, tem certas coisas que eu posso contar, né Leon? — Encostou as costas na cadeira.

— Com certeza — Respondi tentando não mostrar meu desconforto.

Eric coçou a ponta do nariz olhando para as próprias pernas.

— As pessoas na escola costumam chamar o Leon de babaca — Meus pais estranharam — Porque tem certos comportamentos dele que nos fazem repensar sobre seu caráter.

— Como o quê, por exemplo?

— Bullying, chantagem, homofobia e assédio — Respirei fundo acumulando toda a paz que eu ainda poderia ter para não acabar com ele naquele mesmo instante.

Uma onda de calafrios inundou meu corpo e involuntariamente encolhi meus braços e curvei minhas costas, queria acabar com a raça do Eric naquele momento mas, eu era um réu.

— Isso que ele está falando é verdade, meu filho? — Minha mãe encolheu a cabeça ficando mais perto de mim e perguntou sussurrando, preferi não responder.

— Eu tô com dor de cabeça — Joguei o guardanapo, que estava em meu colo, na mesa e sai andando em passos largos até a escada.

Meu pai até tentou me chamar de volta com seu tom de superioridade mas eu o ignorei, nunca imaginei que seria traído por uma pessoa que eu confiava tanto, tudo bem que não fazíamos coisas que geralmente os melhores amigos fazem, mas eu gostava da companhia dele acima de tudo. Ele era como um aliado, um comparsa, uma dupla para as aventuras da vida e a partir de hoje... Virou um mero estranho.

— Leon, calma aí — Escutei a voz dele me seguindo, estávamos no corredor mas eu quis parar e ouvir todas as justificativas mentirosas dele — A gente precisa conversar...

— Sim — Balancei minha cabeça em concordância — O que porra foi aquilo? — Apontei para a escada com a mão.

— Eu fiz o que era certo.

— Então chegar na casa de outra pessoa sem avisar, contar segredos para os pais dele é o certo?

— Você sabe que eu não avisei porque tudo aconteceu de última hora, meus pais são instáveis...

— Problema seu, eu não tenho culpa se seus pais são idiotas ou instáveis, sério mesmo, a consideração que eu tinha por você acabou hoje, agora! — Ele manteve a mesma postura, como se não estivesse ligando para a situação — Pode apagar meu número e contar pra todo mundo na escola que não somos mais amigos!

— Sempre agindo imaturamente, como uma criança mimada na verdade, você é isso — Ficamos se olhando por algum tempo — Eu não me arrependo de nada que disse, até diria mais coisas se tivesse oportunidade mas, eu respeito seus pais acima de tudo.

— Para de citar os meus pais, porra, eles são meus pais e não seus... Para de tentar cobrir sua falta de carinho fraterno, ninguém te quer por perto, some!

Ele ficou parado.

— Vamo, tá esperando o quê? Vaza!

— Okay, eu sumo da sua casa, da sua vida e do seu ciclo de amizades... Mas antes, aproveita a vida com seu ego inflado e seus mimos fora do normal, sozinho!

tchau tchau leitores 

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