28| ᴄʜᴀᴍᴀᴅᴀ ᴇɴᴄᴇʀʀᴀᴅᴀ

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ERIC

UMA GRAVAÇÃO ERA O FUTURO DOS MEUS PAIS. Um caminho meio óbvio, eu diria. No caminho de volta para casa, tomei uma decisão: iria criar cópias e guardá-las em vários lugares, e depois eu tomaria coragem de mostrar à minha mãe.

Quando cheguei, não encontrei ninguém, mas tinha um bilhete sobre o braço do sofá. Minha irmã havia escrito, ela disse que foi ao hospital com minha mãe — chamaram uma ambulância — pediu que eu não me preocupasse, que eu não fosse para lá e que cuidasse das coisas bagunçadas em casa.

É impressionante como os problemas familiares fazem uma criança criar maturidade tão rápido.

Meus pais eram extremamente jovens quando se casaram, mas graças ao dinheiro das famílias, já tinham uma casa própria. Jonathan sempre dizia que o seu maior sonho era ter filhos, mas minha mãe não queria crianças tão cedo, talvez esse relacionamento tenha sido abusivo demais e eu nem tinha consciência disso.

Uma família com seis pessoas precisa de bastante eletrônicos, então por esse motivo, havia três computadores e foram neles que eu guardei algumas cópias, também as coloquei na nuvem do celular e em um pen-drive.

➝➝

— Arrume minhas malas, mais tarde eu passo aí pra pegar — escutei a mensagem que meu pai havia deixado na secretária do telefone.

Subi as escadas e entrei diretamente no quarto que ele dividia com a minha mãe.

Dentro do guarda-roupa, próximo a cama, ficavam guardadas algumas malas de viagem. Peguei o máximo de roupas que eu consegui, sem dobrar e nem retirar o cabide, aproveitei para procurar os documentos também, assim ele não teria desculpas para vir aqui de novo.

Mesmo tendo vários defeitos, meu pai sempre foi muito organizado com coisas pessoais, então achar uma pasta transparente num guarda-roupa praticamente vazio não foi tão difícil.

Porém, havia um envelope marrom, cujo caiu no chão assim que peguei a pasta. Não consigo explicar, mas quando sentei na cama e comecei a ler aqueles papéis, um sentimento ruim me predominou, como se algo muito desastroso fosse acontecer.

— ...O que significa que Eric Evans não é filho biológico do... — Eu não tive como continuar lendo em voz alta.

Um documento de um laboratório informava que eu não era filho dos meus pais. Lágrimas caíram, mas eu continuei procurando, porque não havia somente um papel, e sim três.

Depois do exame de DNA negativo, tinha outro também negativo.

— Não, isso não pode acontecer! — Sai do quarto e fui para o escritório.

"Revirei" a internet procurando o contato dessa tal clínica, qualquer coisa seria útil para mim e eu consegui um número e rapidamente liguei.

— Clínica Laboratório Central da Califórnia, como posso ajudar? — Era um rapaz.

— Oi, eu queria saber se você faz exame de DNA?

— Fazemos sim!

Eu lutava para não chorar, enquanto lia aquele papel mais uma vez, meus pais me enganaram a vida toda, eles sabiam que eu não pertenço a essa família e mesmo assim, continuaram comigo.

— Olha, vou ser sincero contigo, eu achei um documento dizendo que eu não sou filho biológico dos meus pais, tem como procurar alguma coisa relacionada a isso? — Silêncio por alguns segundos — Por favor, eu imploro.

Eu realmente estava disposto a suplicar quantas vezes fosse preciso.

— Quantos anos você tem?

— Dezessete.

— Eu posso encontrar alguma coisa, mas devido ao tempo pode acabar demorando, então eu recomendo que você desligue a chamada, aguarde e assim que eu achar te ligo novamente.

— Ok. Tudo bem, mas pode ser qualquer coisa mesmo, entendeu? Qualquer papel, bilhete, documento, assinatura, só me informa!

— Fique tranquilo.

Chamada encerrada.

Joguei o celular na escrivaninha e relaxei minhas costas no encosto da cadeira. Encarando meu próprio reflexo, através da janela fechada: eu estava destruído, meus olhos estavam vermelhos e minha pele pálida demais.

Meus pais, se é que devo chamá-los assim, continuaram comigo mesmo sabendo que não deveriam, eu poderia estar vivendo em outra família completamente diferente, eu poderia não ter crises de ansiedade toda noite e, antes de qualquer coisa, poderia ser feliz.

Quantas coisas poderiam não ser vividas por mim? Quantos abraços a mais eu poderia ter ganhado?

Cerca de 30 minutos depois, meu celular vibrava.

— Alô? — Perguntei imediatamente, limpando as lágrimas — Conseguiu algo?

— Consegui, nem foi preciso perguntar seu nome, assim que perguntei aos colegas mais antigos eles já vinham me contando sobre uma troca de bebês, há dezessete anos atrás.

Aquilo foi como facas entrando brutalmente no meu coração.

— Se você pesquisar na internet, pode acabar achando, mas como as duas famílias possuem uma fortuna milionária, conseguiram retirar todas as matérias sobre o acontecimento.

— Qual o nome da matéria? — Eu já estava com o notebook aberto na minha frente, pronto para começar a digitar.

A troca de bebês em 2004.

Não esperei a ligação terminar e já tinha clicado em Enter. No primeiro site, havia o nome dos meus pais e mais a frente, seguido de resistências, os nomes dos pais de Leon. Não pude segurar minhas lágrimas de novo.

Eu e Leon fomos trocados na maternidade. Nós pertencemos a outras famílias, rapidamente, uma onda de memórias sobre a minha infância invadiu minha cabeça, todas as minhas experiências eram para ser dele e as dele eram para ser minhas.

— Pode continuar, por favor — pedi com a voz completamente embargada.

— Depois que essa troca caiu no ouvido dos repórteres, a Instituição acabou falindo e as famílias decidiram continuar com os bebês, mesmo sendo trocados, porque eles já tinham alguns meses e seria doloroso trocar um filho por outro que você nem conhece.

Não, não seria doloroso para eles, está sendo doloroso para mim que com dezessete descubro que não sou irmão das pessoas que imaginei, que não sou filho das pessoas que imaginei.

— Desculpa, mas não consegui achar mais nada.

— Tudo bem — funguei — Já me ajudou demais, obrigado.

Chamada encerrada.

Deixei meu celular sobre a mesa e comecei a ler os comentários que as pessoas deixaram na antiga matéria: pessoas completamente revoltadas com a escolha dos meus pais e os pais de Leon. Deslizando o mouse, pude encontrar fotos minhas de quando bebê, do hospital em que nasci e dos meus verdadeiros pais.

Agora, depois de saber toda a verdade, lembro que quando eu ia na casa de Leon e conversava com os pais dele eu me sentia diferente, aquela mulher me entendia como minha mãe nunca me entendeu. Uma vez, eu a abracei no Natal em que passei na casa deles, e ela fez questão de me abraçar forte dizendo que me amava como um segundo filho.

Agora eu sei que ela me disse imaginando que eu soubesse da história, talvez naquele dia ela tivesse sentido vontade de me chamar de filho, talvez ela tivesse sentido vontade de cuidar de mim e me amar como amou o Leon em todos esses anos.

Um sorriso surgiu em meio as minhas lágrimas, eu havia abraçado minha mãe e nem sabia disso.

Um sorriso maior surgiu, pois eu consegui a oportunidade de abraçá-la novamente, a chamando da forma certa. Sem ser a mãe do meu amigo, mas a minha verdadeira mãe.

tchau tchau leitores.

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