Raul insistiu no telefonema três vezes, até que foi atendido por uma Ludmilla indignada:
"Quem é o imbecil que está ligando a essa hora em um telefone comercial?"
— Oi, Ludmilla... Me desculpe por estar te ligando tão tarde. Sou eu, o Raul.
Um breve instante de silêncio se instalou e, então, foi possível escutar a jovem pigarrear do outro lado da linha e dizer:
"Raul? Nossa, mas... Por que está me ligando a essa hora?" perguntou Ludmilla, agora com uma voz doce.
— Eu estou com um problema e preciso falar com a Lorena... Você, por um acaso, teria o número dela?
"O pessoal, não. Tenho só o profissional, mas duvido muito que ela vá te atender agora. Mas você só pode resolver com ela esse problema?"
— Sim, só com ela...
"É uma pena, senão eu poderia te ajudar."
Raul sorriu, corado, e perguntou:
— Você poderia me passar o telefone profissional dela mesmo assim?
"Poder, eu até posso, mas... Tem certeza que é só com ela?"
— Tenho, sim.
Ludmilla suspirou do outro lado da linha.
"Posso falar o número, então?"
— Hã... Só um minuto.
O jovem rapaz se voltou para o guarda e perguntou:
-Tem um papel e uma caneta para me emprestar?
O guarda, com pouca vontade, tirou uma caderneta do bolso e uma caneta, entregando tudo a Raul, que segurou o celular entre a orelha e o ombro, dizendo para Ludmilla:
— Sim, pode dizer.
"Nove, dois..."
— Nove, dois.
"Dezenove..."
— Dezenove.
"Vinte e seis, zero, meia."
— Vinte e seis, zero... Meia.
Raul segurou o celular com a mão esquerda novamente e agradeceu:
— Muito obrigado, Ludmilla.
"Tá me devendo, hein?"
O jovem rapaz riu, desconcertado.
— Te devo essa.
"Pode pagar saindo comigo..."
As palavras de Ludmilla pairaram no ar por alguns instantes, até que ela mesma riu do outro lado da linha, dizendo:
"Nossa, Raul! Que gelo foi esse?"
— Me desculpa, é que eu realmente preciso resolver esse problema aqui.
A jovem suspirou outra vez e exclamou:
"Tá bom!"
— Obrigado de novo e... Boa noite.
"Boa noite, Raul."
Ele finalizou a ligação e olhou de relance para o guarda, como se pedisse paciência pelo olhar. Então digitou o número que Ludmilla havia lhe passado e, novamente, caiu em uma infeliz sequência de tentativas frustrantes.
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Lorena já estava deitada quando sua cabeça começou a doer intensamente. Virou de um lado para o outro na cama, em uma vã tentativa de expulsar o incômodo, mas não houve jeito. Levantou-se, vestiu seu robe de seda e desceu para o primeiro andar da casa. Faria um chá.
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O Malabarista - Concluída
SpiritualRaul é um morador de rua que perdeu sua mãe e, desde então, vive debaixo de um viaduto com o seu irmão mais novo chamado Kevin, de apenas 7 anos. Ele vive sem muita esperança de ter a sua sorte mudada, embora esteja sempre consolando o seu irmão, di...