Havia se passado um mês desde que Raul me pediu em casamento e eu não poderia me sentir mais realizada. Eu estava animada para viver uma vida inteira com ele. Acordar todos os dias ao seu lado já não era apenas um sonho distante. Estava mais próximo do que nunca.
Eu sei que, normalmente, existe um espaço de, pelo menos, alguns meses entre o pedido de casamento e o casamento propriamente dito. Afinal, um cerimonial é bastante caro. Porém, graças a Deus — ainda é um pouco custoso para mim usar essa expressão —, dinheiro não era necessariamente um problema.
E por falar em dinheiro, agora que iríamos assumir um compromisso ainda maior do que aquele que já assumimos, me pareceu ser, finalmente, chegada a hora de "quebrar o meu porquinho", isto é, usar minhas economias para comprar uma casa para nós dois.
Quando me casei com Victor no civil apenas, não o fiz com partilha de bens. Pelo menos, essa consciência eu tive. Ele nunca teve onde cair morto, mas sempre teve um talento nato para ser sanguessuga. Por isso, nunca cogitei a ideia de querer compartilhar com ele nada do que eu tinha. Acho até que fiz muito, pagando suas dívidas e livrando sua cara de muita encrenca.
Porém, tratando-se de Raul, tudo mudava de cor. Com ele eu queria fazer valer aquela frase: tudo que é meu é seu. Por isso, quando decidi comprar a casa dos meus sonhos para que pudéssemos viver os nossos sonhos juntos, eu não hesitei em colocá-la no nome de nós dois.
— O que achou da casa, amor? — perguntei a Raul depois que Felipe concluiu o tour conosco.
— Isso daqui é uma mansão — Raul respondeu, fazendo-nos rir.
— Quem dera eu tivesse dinheiro para comprar uma mansão! — exclamei.
— Mas isso daqui é uma mansão. Não é, não?
— Apesar de bem grande, não é. Para ser considerada uma mansão, tem que ter mais de 2km de área útil — Felipe respondeu.
— E aqui não tem isso tudo? — a expressão surpresa de Raul insistia em me fazer rir.
Eu estou muito apaixonada — sem cabimento!
— Não, não! — Felipe também ria. — Aqui só tem 1200 metros quadrados.
Raul se virou para mim com os olhos levemente arregalados e brincou:
— Nós vamos nos perder aqui dentro.
Bati em seu braço de leve enquanto gargalhava.
De fato era enorme, mas, se comparado ao amor que eu estava sentindo, era minúscula.
Um mês após eu ter saído do hospital, Lorena conseguiu uma casa para que Kevin, minha avó e eu morássemos. E eu me lembro de ouvir o meu irmão dizer que, provavelmente, Lorena era a princesa herdeira de algum reino por aí. Não sei de onde ele tirou essa comparação, só sei que ri de suas palavras.
Porém, por mais engraçado que soasse, não havia nada de mágico no sucesso de Lorena. Ela trabalhou, e ainda trabalha duro para ter o que tem. Mas, mais do que isso, ela tem uma admirável inteligência financeira. E eu não estou dizendo isso apenas porque a amo — tudo bem, o amor pode nos fazer agir mais parcialmente do que o normal, mas eu garanto que não é o caso.
Se me permitem um breve monólogo, necessito dizer que Lorena não é apenas uma mulher linda — e, por linda, entendam por dentro e por fora. Ela é também muito inteligente, inclusive, ouvi histórias de que ela se formou com êxito na faculdade. Além de falar três idiomas: inglês, espanhol e francês.
Acho que ainda não contei, mas eu nunca fui o melhor aluno que uma professora pode ter. E não era por questões de rebeldia. Ao contrário, eu costumava ser o garoto mais quieto da sala... E o mais alto também. Por isso, nunca faltaram apelidos. Hoje, eu sei que a palavra usada para descrever o que acontecia comigo é bullying, mas, naquela época, ninguém chamava assim.
Houve inúmeras vezes em que eu pensei em contar para os meus pais sobre o que acontecia comigo nos intervalos, porém, eu sempre pensava melhor e desistia. Então, com o passar do tempo, acho que perdi o interesse no aprendizado. Eu gosto de estudar e até sei uma boa quantidade de matérias, mas nunca passei nem perto de ser o melhor da classe.
É justamente por isso que, às vezes, penso que Lorena é tudo aquilo que eu nunca consegui ser. Ela me completa.
E aquela casa tão imensa, tão bonita, me tirou de mim. Se, um dia, alguém tivesse me parado na rua e me dito que, no tempo certo, eu iria conhecer a mulher da minha vida, me casaria com ela e que, então, moraríamos num casarão como aquele, eu teria julgado tal indivíduo completamente louco.
Mas, novamente, não há nada de mágico em tudo isso. Lorena tinha planos que, a princípio, nem envolviam a mim. E, para falar a verdade, não pude deixar de ficar surpreso quando ela me contou que havia juntado dinheiro por quase 10 anos, visando comprar a casa de seus sonhos.
Como se diz popularmente, quando crescer, eu quero ser igual a ela — rio só de pensar isso.
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Após a visita, entramos no carro para irmos embora. A venda foi acertada para aquele mesmo mês, no entanto, precisávamos nos casar no cartório primeiro. Mas isso já estava parcialmente encaminhado. Tudo era uma questão de acertarmos os últimos detalhes do casamento, que aconteceria muito em breve.
— Acabei de receber duas notícias ótimas, amor — Lorena disse ao entrar no carro.
Assim que nos despedimos de Felipe, ela recebeu uma ligação e eu a aguardei com o carro ligado.
— Quais?
— Em primeiro lugar, a Fiat assinou com a gente. Agora, ela é oficialmente nossa conveniada.
Ergui as sobrancelhas, surpreso e feliz. Havia, pelo menos, três semanas que Lorena estava correndo atrás de fechar um contrato com a Fiat, para que ela se tornasse uma conveniada de sua clínica.
— Isso é ótimo! — exclamei, feliz de ver a empolgação da Lori.
— Mas sabe o que é ainda melhor?
— O quê?
— A Cecí me disse que está tudo certo para abrirmos a nossa nova unidade lá no Buritis.
Lorena me olhou com um sorriso de orelha a orelha e disse levemente emocionada:
— Está tudo se encaixando de uma forma tão perfeita, amor. Tipo... A casa, a Fiat, a nova unidade... E eu estava tão preocupada!
— Eu te falei que Deus iria encaminhar tudo.
— E Ele encaminhou mesmo! — Lorena exclamou, sorridente, enquanto colocava o cinto de segurança.
Então, felizes pelas recentes conquistas, fomos embora.
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O Malabarista - Concluída
SpiritualRaul é um morador de rua que perdeu sua mãe e, desde então, vive debaixo de um viaduto com o seu irmão mais novo chamado Kevin, de apenas 7 anos. Ele vive sem muita esperança de ter a sua sorte mudada, embora esteja sempre consolando o seu irmão, di...