Quando meus pais e eu saímos de Pernambuco para tentar a vida em São Paulo, eu tinha quase 14 anos. Um amigo do meu pai havia lhe conseguido um emprego em uma empresa multinacional, além de uma casa para morar. A única coisa que esse tal amigo não nos disse era que a distância entre a casa e a firma era gritante.
Mas isso não nos fez regressar para Pernambuco, até porque não queríamos continuar a encarar a seca. De maneira que meu pai passou a dormir na firma de segunda à sexta, dormindo conosco em casa apenas nos finais de semana.
A princípio, pareceu a rotina perfeita, apesar de cansativa. Eu passei a frequentar uma escola da região — apesar de nunca ter me adaptado muito bem —, enquanto minha mãe passou a trabalhar como doméstica em algumas casas. Quero dizer, apesar de ser uma empresa multinacional, o salário do meu pai não era alto o suficiente para nos dar uma vida confortável.
Meu pai recebia 389,50 reais, um pouco a mais do salário mínimo da época. E, desse dinheiro, ele tirava 80 reais e mandava para a minha avó. Lembro-me perfeitamente porque ia com ele ao banco depositar todo mês.
Minha avó paterna não tinha telefone. Ela morava em uma cidadezinha com pouco mais de 1000 habitantes no sertão pernambucano. Porém, mensalmente, ela ia até a cidade mais próxima onde havia um banco e sacava os 80 reais que meu pai havia mandado. E era nessa data que falávamos com ela por orelhão.
O sonho do meu pai era levá-la para São Paulo, porém ele queria conseguir uma estabilidade financeira primeiro. Infelizmente, ele nunca teve a chance.
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Era sábado de manhã e eu acordei com uma saudade tremenda da minha avó. Durante todos esses anos eu quis voltar para Pernambuco, porque sabia que ela era a única pessoa que me restou. Mas nunca consegui. A falta de dinheiro e as circunstâncias nunca permitiram.
Porém, naquela manhã de sábado, eu abri os olhos e encarei o teto branco do quarto, vendo o rosto da minha avó. Havia tanto tempo que eu não sentia uma saudade como aquela! De repente, pensei que aquele sentimento de falta repentino não poderia ser em vão.
Dinheiro já não era um problema tão grande e nem mesmo as circunstâncias. Eu precisava voltar para Pernambuco e fazer o que meu pai não pôde fazer.
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O Malabarista - Concluída
SpirituellesRaul é um morador de rua que perdeu sua mãe e, desde então, vive debaixo de um viaduto com o seu irmão mais novo chamado Kevin, de apenas 7 anos. Ele vive sem muita esperança de ter a sua sorte mudada, embora esteja sempre consolando o seu irmão, di...