Transato II

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Em pouco tempo a jovem estava na cozinha, a procura de Liz. Vendo as costas da irmã, Désirée a abraçou e sentiu a jovem ficar rígida, apenas para depois relaxar ao perceber de quem se tratava.

A jovem ruiva cortava algo que poderia ser maças, mas pelo estado avançado da mutilação – do que quer que fosse, não poderia ter certeza.

-Vamos ao lago comigo? - convidou a moça ainda abraçando-a. - rápido, eu juro.

Ela estava mentindo, é claro. Não seria rápido.

- Infelizmente não posso. - Desculpou-se a linda moça de cabelos alaranjados – estou fazendo torta para a sobremesa.

O sorriso que estampava o rosto da jovem lady desapareceu com a negativa da irmã.

-Pode ir. – Désirée se virou na direção da voz e descobriu ser Fiona Gilbert, a cozinheira da casa – eu termino por você, já me ajudou o bastante.

-Sra. Gilbert, desculpe-me, não havia visto a senhora. - A jovem sentia necessidade de pedir perdão a mulher, não desejava ser uma fina cópia da madrasta ou da irmã de quinze anos. – Mil perdões.

A senhorinha sorriu, deixando mais aparente as rugas que cercavam os olhos e a boca, se é que isso que era possível.

-Como me veria? Só tinha olhos para a sua preferida – Brincou a Sra. Gilbert, fazendo referência sobre a preferência da jovem por sua meia-irmã. – Podem ir, eu cuido de tudo.

Ao ouvirem isso as jovens saíram correndo e sorrindo em direção ao lago que não ficava muito distante da casa para ser perigoso e nem muito próximo para ser constrangedor ou inadequado utilizá-lo.

A casa do pai de Désirée era confortável e grande para os padrões de Cheshire, mas o que as jovens irmãs mais gostavam era o lago. As visitas a ele adquiriram certa frequência desde muito cedo, quando as jovens aprenderam, com a ajuda do Sr. Gilbert, que o ser humano podia nadar.

Quando isso aconteceu ambas tornaram aquele lugar seu santuário, onde podiam rir e brincar juntas sem incômodos ou julgamentos – quase sempre, já que ninguém entendia o que fazia a filha legítima de um barão ser tão apegada a filha bastarda desse mesmo barão.

Mas a verdade é que ninguém precisava entender.

Bastava apenas que ninguém impedisse, que ninguém tentasse colocar cada uma delas em um continente diferente. Afinal uma era a única família que a outra tinha, mesmo que para Désirée fosse um pouco doloroso dizer isso. Para a sorte das duas jamais viveriam em continentes diferentes.

O pai das jovens era um homem de posses, mas não possuía casa em Londres, sua riqueza era capaz de fornecer um dote para Desirée, e Suzzy, sua outra filha legítima, apenas, então ela e as irmãs nunca haviam conhecido A Grande Cidade. 

Suzzy era eufórica, viva, acesa, educada e fina demais, jamais iria precisar de dotes para atrair cavalheiros, o oposto de Désirée que era pequena, magra, sem cor, falava pouco e cultivava o costume de ouvir atrás de portas e paredes... bom, esse último até que em certo dia escutou o pai e a madrasta falando sobre quão bom seria se ela, Désirée, se iluminasse mais, como a irmã, mas segundo Gwen o brilho da filha havia vindo dela, assim como a “falta de brilho” de Desirée e da bastarda, havia vindo dele. Nesse dia a jovem aos dez anos perdera um mal costume e ganhara uma irmã. 

Elizabeth, filha de uma já falecida camareira, um ano mais nova que Désirée, jamais receberia o sobrenome Lovecraft – mesmo sabendo de suas raízes desde o berço, mas a irmandade que unia as duas iria durar uma vida, pensou Désirée. E estava certa. 

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