Mãe?

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Lisa encarou o espaço com as mãos espalmadas em sua cintura, seu olhar escorregava meticulosamente por cada detalhe, fitava tudo por tanto tempo, embora não soubesse precisar, que já não poderia confiar em seu próprio julgamento.

Decidiu que havia feito bem em escolher aquela casa, que sua decoração fazia jus ao que havia escolhido, não passaria o restante do dia naquilo, havia acabado de se estabelecer definitivamente desde que chegara de mudança da Tailândia, preferia ligar para Chaeyoung e finalmente fazer algo para seu divertimento pessoal.

Todavia, surpreendeu-se com o fato de ela não a ter atendido. "Vadia, deve estar babando na amiga crush casada", Lisa resmungou e sentou-se no sofá, aquele vazio a invadiu novamente de maneira sorrateira, mas como algo que já era parte dela poderia invadi-la?

Desde que seus pais se foram o vazio a atingiu como água invernal contra um corpo aquecido, parentes? Não são família, principalmente quando todos tentaram judicialmente tomá-la parte da empresa que os pais a deixaram, entre outros bens.

Irene e Chaeyoung a convenceram de que ela estaria menos sozinha em Nova York, que elas preencheriam os espaços que pudessem de sua vida e seriam uma perfeita família não convencional, duas lésbicas e uma bissexual mãe solteira através de uma inseminação artificial.

Lisa sorriu novamente ao lembrar-se daquilo, contudo, mal havia chegado e já se sentia sozinha outra vez, com o vazio espaçoso em seu peito de fazer eco em seu coração. Nem bem havia chegado e Chaeyoung não a havia atendido, ela soltou uma lufada de ar e resolveu ligar para Irene.

Entretanto, recebeu apenas o recado da caixa postal, aquilo começou a preocupá-la, ela as havia informado que ao se estabelecer corretamente em sua nova casa as ligaria, agora nenhuma das duas a atendia.

Seu coração congelou subitamente e um calafrio desconsertou sua postura, sensações ruins, ela abraçou o próprio corpo ligeiramente.

— Não. — Ela disse bravamente. — É uma nova vida, chega de sensações ruins e vazios idiotas.

Mas como que para contestá-la seu celular tocou, ela o atendeu imediatamente na ânsia de confirmar as palavras que havia acabado de proferir, no entanto, não pôde fazê-lo.

"Lisa", uma Chaeyoung chorosa de voz trêmula e falha a chamou, "Eu estou no hospital, nós estávamos indo fazer uma surpresa para você na sua casa e... tudo foi tão rápido, eu..."

"O que aconteceu?" Lisa exigiu sentindo o martelar doloroso em seu peito.

"Ela está em estado grave, ela... ela... eu tive arranhões leves, mas ela..."

"Qual o hospital?"

Ao chegar no endereço com o carro que havia alugado, Lisa deixou o veículo imediatamente, a cada passo que dava para dentro do hospital sentia uma vontade doída de correr, por isso alargou os passos que passaram a fazer eco.

A branquidão do hospital a irritava o olhar, a causava vertigem e lembranças de afundá-la em melancolia, ao avistar Chaeyoung com curativos, a olhou nos olhos buscando qualquer consolo, boa notícia, uma informação animadora a respeito do estado de Irene, Chaeyoung, porém, olhou-a com aquela vermelhidão inchada que estavam seus olhos e negou com a cabeça, seus lábios estavam trêmulos.

A dormência dominou o corpo de Lisa como um veneno se entranhando no sangue, uma náusea a embebedou os sentidos, ela perdeu o chão sob seus pés e tudo apagou-se.

Ao acordar do desmaio, ela estava numa cadeira e encontrou o olhar tristonho e preocupado de Chaeyoung, elas nada disseram, o que haveria de dizer? Apenas sentiram, sentiram aquele arrancar monstruoso de suas vísceras, aquela perda infeliz que as atingiu mais baixo do que qualquer outra coisa poderia fazê-lo.

Elas choraram copiosamente, não havia reserva para o ato sôfrego, o olhar de uma não largava o de outras, elas estavam compartilhando a dor algoz através dele e de seu soluçar tímido.

— Com licença. — Uma mulher hesitante que Chaeyoung reconhecera disse chamando-as a atenção. — Eu sinto muito atrapalhar o luto, mas eu levei a paciente Irene para a sala de cirurgia e no corredor ela me fez um pedido e me fez prometer dizê-lo a uma de vocês.

Lisa e Chaeyoung se olharam confusas por um breve momento.

— Uma de nós? — Chaeyoung indagou com a voz esganiçada.

— Quem de vocês se chama Lisa?

— Sou eu. — Lisa anunciou-se atraindo o olhar dela.

— Ela me fez prometer que eu diria a você que o último desejo dela é que você e Jennie Kim, não apenas uma, mas as duas, cuidassem de Misuk como mães, que fizessem por ela o que ela já não poderia mais fazer.

As palavras quase não foram processadas pela mente de Lisa, Jennie Kim?

Ela sabia que era uma pessoa que Irene e Chaeyoung tinham em comum como uma amiga muito próxima, alguém com quem viviam insistindo para que ela se encontrasse sempre que ela visitava Nova York em seus curtos períodos de tempo.

A mulher se retirou deixando as duas sozinhas outras vez.

— O que? Ela não faria isso, faria? — Lisa perguntou a amiga.

Chaeyoung a percebeu atônita, perdida em si mesma numa proporção maior que outrora.

— Se você está pensando que foi um capricho de Irene esqueça, ela nunca brincaria com o bem estar da Misuk.

— Então me explique o motivo de se tratar justamente de nós duas, de mim e da tal Jennie para a qual vocês sempre tentaram me empurrar.

— Eu não acredito que você está agindo assim nesse momento, essa porra importa? A Irene não vai voltar mais e você pode não conhecer a Jennie, mas ela é uma puta amiga da Irene como você e eu e vai sofrer pra caralho quando souber. Mas se você ainda quer uma explicação, Jennie sempre teve o desejo da maternidade e você? Bem... talvez ela confie em você para auxiliar Jennie com a Misuk.

Lisa desviou o olhar para frente outra vez, sentia tantas coisas que nem sabia mais como deveria se sentir, sabia que tudo o que sentira era ruim e digno de medo, mas como discernir tudo o que havia acontecido?

Ela havia acabado de se estabelecer em Nova York, havia acabado de perder uma das suas grandes amigas, havia acabado de se tornar mãe com uma mulher que não conhecia.


Por favor, se gostaram votem ou/e comentem, muito provavelmente a continuação vai depender do retorno. 

Mães por acaso • JenlisaOnde histórias criam vida. Descubra agora