— Quer falar sobre o motivo de estar na minha minha casa a essa hora da noite?— James estava sentado a minha frente, com uma garrafa de água na mão e um olhar desconfiado no rosto.
Eu obviamente não diria o motivo, não por não confiar nele o bastante, mas porque sempre tive dificuldade em falar sobre as coisas que sinto, e isso acontece desde que eu era bem nova. Mas agora eu estava aqui, depois de brigar com minha família, por eles não confiarem o bastante no meu potencial e acharem que eu não era capaz de concluir essa missão sem me apaixonar por meu alvo. Eu definitivamente não conseguiria dormir na mesma casa que nenhum deles essa noite, poderia ir para um hotel ou até para a casa de Mel, mas algo me trouxe até aqui.
— Você avisou que estava vindo e simplesmente entrou, fez um sanduíche com a comida dos meus sobrinhos e ficou aí sentada feito uma assombração na cozinha. Não pensou que poderia assustar as crianças?— Vicent é tão protetor com seus sobrinhos, amo quando fala deles.
— Na verdade, foram eles que fizeram meu sanduíche e pediram para que eu ficasse sentada aqui. Eles me adotaram como se eu fosse um cachorro e tentaram me esconder para que você não me encontrasse— Dei mais uma mordida no pão recheado com as mil coisas que eles encontraram na geladeira. Disseram que eu estava magra demais, então me encheram de comida, e eu obviamente aceitei sem pensar duas vezes.
Finalmente olhei para ele, analisando sua aparência com mais cuidado agora. James Vicent Cole Hacker, definitivamente é o homem mais bonito que já vi, ainda mais quando parece frustrado com algo, e eu sei que ele vêm tendo esse sentimento desde que começamos a nos encontrar com mais frequência.
Sua postura é impecável, seus cabelos bagunçados pelas vezes em que ele passou os dedos entre os fios, apenas para controlar os nervos em apenas pensar em me ter tão perto de seus bens mais preciosos. Sua camisa branca com alguns botões abertos, deixando pouco para a visão e muito para a imaginação.
— Meus sobrinhos certamente vão me enlouquecer algum dia— Ele soltou uma risadinha nasal e começou a caminhar em minha direção com a mesma calma de um animal espreitando sua presa
— Preciso que fique um pouco distante, James— Eu não estava em meu mais perfeito juízo, e se ele me tocasse agora, eu perderia totalmente o meu controle e faria aquilo que minha família espera de mim. E eu não posso fracassar, não agora que me subestimaram.
Sua respiração estava calma e seus olhos sempre focados nos meus, como se ele estivesse lendo todos os meus pensamentos e totalmente pronto para fazer o contrário de minhas palavras, pois sabe que meu desejos ficaram em oculto em meio ao meu abismo de pensamentos. Mas mesmo que eu fizesse o possível para esconder, James sabia que estava alí, o desejo de seu toque ainda crescendo a cada passo seu.
— Por que exatamente você está aqui, Aly?— Como dizer a ele que briguei com meus irmãos pela a ameaça contra seus sobrinhos e que eles disseram que eu estava me apegando a ele? Acho que ele teria o mesmo pensamento que todos, mas não gosto de mentiras
— Não gostei do que Lorenzo fez, da ameaça escondida em palavras mansas. São apenas crianças e não devem ficar no meio de uma guerra de máfias. Eu odiaria se você fizesse isso com Angelina e provavelmente te mataria— Dei a última mordida no sanduíche e ele já estava mais perto do que eu gostaria.
Eu estava sentada no balcão na cozinha durante todo o nosso diálogo e meu lanche da madrugada, e agora ele estava quase no meio das minhas pernas. Era quase impossível não imaginar senti-lo aqui mesmo nessa cozinha, enquanto luto internamente para não fazer barulho e acordar as crianças no andar de cima.
— Ei, não pense em coisas sujas na cozinha, nós comemos nesse lugar— Impressionante como ele sabe o que se passa na minha cabeça antes mesmo de eu dizer, se é que eu ia dizer. Ou talvez James seja tão bom em linguagem corporal como ele diz ser.
— Eu não pensei em nada, Vicent. Você acha que sou o que? Uma pervertida? Nós comemos nesse lugar— Sorri para a sua careta e desci do balcão em um salto. Acabei batendo meu nariz em seu peito duro e ouvi sua gargalhada enquanto eu levava minha mão direita até a provável nova contusão.
Cheiro de sangue, o cheiro de sangue me faz querer vomitar. Sendo meu ou de outras pessoas, o cheiro forte começou a parecer veneno em minha língua, senti a tontura já conhecida por mim desde os meus quinze anos. O odor tóxico estava presente, como uma droga viciante que me fez viajar até velhas lembranças.
Não é real, não é real, não é real.
Mesmo que eu repetisse as palavras na minha cabeça, mesmo que tentasse me agarrar a qualquer pedaço do meu mundo atual, tudo ainda me levava aquela garota frágil que teve sua vida estragada por coisas de que não era culpada. O sangue que escorria de seus ferimentos e fazia sons de um tipo de goteira no chão, como se o telhado estivesse com uma infiltração e aquelas fossem gostas de água. Mas não eram gostas de água, era o som do sangue dela escorrendo e inundando o chão por uma semana, os ferimentos eram pequenos, mas habilidosos, queriam que ela durasse mais tempo. Queriam ver até onde ela aguentaria e começaria a falar, mas ela não falou, resistiu por um semana, mas o som da goteira e o cheiro que vinha dela, sempre voltam, como seus demônios particulares.
Meus demônios particulares.
— Alyson, está bem?— Avancei, comecei a golpear o homem a minha frente. Apenas ataques, ele não tinha tempo para se defender, eu era rápida como um gato selvagem.
Seus cabelos eram escuros e os olhos claros, eu reconheço esse rosto. Ele me tocou, tocou meu cabelo e minha bochecha, ele tentou me beijar. Tentou me tocar enquanto eu estava presa naquela sala, e todas as vezes em que eu tentava gritar, ele estapeava meu rosto frágil e gritava para que me calasse, pois ninguém me ouviria. Ninguém me ouviu, ninguém veio me salvar, ninguém me ajudou. Ele me tocou.
Meu corpo foi derrubado com uma força quase sobrenatural, e algo forte se colocou logo a cima de mim, fazendo força para que me mantesse parada. O homem grande tentou segurar meu pulsos, mas eu fui mais rápida e bati minha cabeça na sua com toda a força, nos troquei de posições logo após , ficando agora sentada em sua cintura e me preparando para dar o soco final, ele nunca mais me tocaria. Dessa vez ninguém o ouviria, ninguém viria o ajudar e ninguém o salvaria.
— Está tudo bem, estamos juntos. Não importa o que aconteça, estamos juntos, sempre— Meus olhos se arregalaram e uma dor forte me atingiu, não me importei com o corpo a baixo de mim, quando levei as mãos aos ouvidos e encostei a cabeça em seu peito.
Uma rápida lembrança passou por minha mente, um garoto loiro sorrindo para mim. Éramos crianças ainda, deveriamos ter por volta de quatorze ou treze anos, um ano antes de tudo acontecer. Ele estava com um sorvete em sua mão e ria de algo que eu falei, mas logo suas bochechas ficaram um pouco vermelhas, tímido pelas palavras atrevidas que eu provavelmente falei para ele. Tão lindo, um sorriso tão doce, com um olhar tão letal e desconfiado.
— Seria tão fácil amar você— O garoto sorriu com minhas palavras e coçou os cabelos claros, totalmente tímido.
Mas eu voltei ao meu corpo, a minha mente. Eu não estava mais com o garotinho tímido, estava quase socando o rosto de James Hacker, em sua própria casa. Meu rosto ainda estava encostado em seu peito, mas não precisei olhá-lo para saber quem era, seu cheiro me trouxe de volta a realidade, e o carinho um pouco inseguro que ele fazia nas minhas costas também me ajudaram a reconhecer o ambiente.
— Desculpa— murmurei, não sabendo se ele ouviu ou não. Meus olhos estavam pesados, não sabendo se pelas lágrimas que eu não percebi ter soltado, ou pelo esgotamento mental e físico, apenas fechei os olhos torcendo para que tenha me ouvido.
— Juntos, eu prometo.
E assim, tudo escureceu.
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Rose Dans Le Crâne
RomanceParece faltar algo em sua vida, uma parte da garota a deixou naquele dia. Assim como as paredes brancas daquela casa se tornaram vermelho sangue, algo dentro de Alyson se foi junto com as lembranças bloqueadas pela sua mente. Como seria possível sen...