1x15 - A Promessa (Parte II)

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Terminado o café, Pedrinho enfiou-se no macacão de ajudante e correu até o chiqueiro. Barnabé já estava lá. O peão tinha uma marreta nas mãos e a boca cheia de pregos compridos, os quais usava para fixar no lugar uma das ripas do cercado. Os porquinhos liderados pelo cada dia mais gordo Marquês se agitavam ao seu redor, mas mantinham distância das pancadas ritmadas da marreta.

- Bom dia, Barnabé. - disse Pedrinho.

- Bom dia, rapaz. - a resposta veio em um tom casual. Não havia vestígio do desespero exibido por Barnabé no dia anterior. - Acredita no que esse bando de presuntos fez? Olha pra isso! Além de não me deixarem dormir com a barulheira no meio da noite, ainda me quebram o raio do cercado. Ainda bem que nenhum fugiu.

Barnabé posicionou mais um prego e martelou com força, enterrando-o no ponto em que duas ripas se cruzavam.

- Vai ver eles tão agitados. - insinuou Pedrinho. - Igual os cavalos.

O martelo pairou no ar por um instante, antes de concluir seu movimento contra a cabeça do prego. Barnabé ajeitou o chapéu de palha e apontou para o balde de lavagem do lado de fora do cercado.

- Tá ali a comida deles. Melhor começar a pôr daí desse lado mesmo, pra espalhar um pouco essa turma. Se entrar é capaz deles te machucarem.

Pedrinho seguiu o conselho de Barnabé e se pôs a despejar a lavagem por sobre o cercado. Quando completou a volta até a porteira, metade do balde já era disputado pelos porcos esfomeados, permitindo que Pedrinho entrasse sem problemas para esvaziar o restante bem no meio do chiqueiro.

Pedrinho aproximou-se de Barnabé. Esperara tanto por aquele momento, mas agora que estava ali, sentia-se paralisado. Havia algo de frio nos modos de Barnabé, algo que lhe intimidava e preocupava. Era como se o peão se esforçasse para ignorar a presença dele ali.

- Eu guardei o dinheiro. - disse Pedrinho, tentando romper a barreira invisível que se formara entre si e o amigo.

Outra vez o martelo pairou no ar, hesitante. - Que dinheiro? - perguntou Barnabé, pouco convincente.

- O dinheiro da Dona Benta. - Pedrinho abaixava seu tom.

- Pedrinho, eu.. eu preciso.. - disse Barnabé, respirando fundo.

- Eu sei, ninguém pode saber. - atalhou Pedrinho. - Não se preocupa, não vou contar pra ninguém nosso segredo. O saquinho com o dinheiro tá bem guardado. Só queria um jeito de devolver pra Dona Benta sem que ela percebesse.

- Guarda pra você, rapaz. Bem guardado. Dona Benta não precisa. Mas com sorte, você ainda vai precisar.

Barnabé retomou o trabalho, martelando com ainda mais força os pregos que restavam. O choque do ferro contra ferro foi tão alto que Pedrinho cerrou os olhos, como se isso fosse aliviar os estalos irrompendo em seus tímpanos.

- Eu preciso da sua ajuda! - gritou ele, entre um golpe e outro do martelo.

- Já te ajudei o máximo que podia, rapaz. - respondeu Barnabé.

Havia certa raiva em sua voz, que Pedrinho esperava não fosse dirigida a ele mesmo. De onde estava não pôde ver como Barnabé fechou os olhos com força e engoliu em seco, antes de proferir aquelas palavras.

- Barnabé... - disse Pedrinho, reunindo coragem para interpelar o peão. - Você já tava aqui quando teve aquelas mortes? Quando o Pai da Senzala atacou?

Barnabé ergueu-se de súbito e o agarrou pelos ombros.

- Que história é essa, rapaz?! - vociferou ele. Seus olhos, imensos e brancos, escancararam-se de tal forma que Pedrinho pôde ver claramente as pequeninas veias avermelhadas que se escondiam sob as pálpebras. - Onde foi que você viu isso?!

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