ASSISTOLIA
TATELOS ANGELES, CALIFÓRNIA
FINAL DO OUTONOA noite passada tinha sido um completo pesadelo. O Guster estava bêbado e com ciúmes de um colega de classe. Uma péssima combinação. Uma combinação infernal. Minhas mãos tremiam ainda em choque. Continuava sentada no chão do dormitório, encostada na minha cama desarrumada.
Parecia estar fora de mim. Queria estar fora de mim. Não queria ser aquela pessoa. Sentia vergonha e repulsa de quem havia me tornado.
Porém não conseguia me mexer. Não tinha forças para mais nada, além de ficar ali, sentada.
O irônico era que o final de semana prometia ser tudo de bom. Ele tinha prometido que seria um novo começo. Feriado prolongado. As universidades estavam vaziam. Todos tinham planos. Nós tínhamos planos, era para estarmos na casa de campo da família dele. Uma viagem que deveria ter começado na noite passada.
A noite do terror.
Eu precisava terminar um trabalho com um colega de turma. Eu me atrasei. Quando cheguei no dormitório não encontrei nada, nem ninguém. Gus não respondia as minhas mensagens. Ele não respondeu até 2 horas da manhã, quando bateu na minha porta.
Ele estava bêbado. Seus olhos estavam negros e seus dedos não demoraram em agarrar o meu braço e me empurrar contra a primeira parede em nosso caminho. As mesmas perguntas se repetiram em sua boca enrolada:
Quem é ele?
Vocês estão tendo um caso?
A quanto tempo você vem me traído?
Entre o ódio e as perguntas, um eu te amo, saia. Sempre saía um: Você não sabe o quanto amo você, não faz isso comigo. Uma palavra dita com ódio e dor. Uma palavra que para ele justificava tentar me agarrar a força. Aquilo estava indo longe demais. Pela primeira vez não senti apenas medo, mas pânico. Total pânico diante do homem que amava e que deveria me amar de volta, não tentou fazer sexo a força.
Como um animal.
Foi nojento. Foi cruel. Foi apavorante. E só não chegou ao fim graças ao abajur ao lado da minha cama. O abajur de metal que usei para acertar a sua nuca. O mesmo abajur que agora estava caído no chão ao meu lado.
Agradeci quando a pancada pareceu ter funcionado mais do que os meus protestos, e o feito se levantarem e cambalear para trás, com um olhar perdido. E perdido, Gus abriu a porta do dormitório e sumiu.
Um alívio.
Um alívio pequeno e momentâneo.
Um sufoco que não podia mais carregar.
Não podia mais.
Estava apavorada.
E alimentada por esse pavor fiz a única coisa que jamais jurei fazer, ligar para a minha mãe.
A gaveta da cômoda é batida com força. Ergo os olhos. Não consigo encarar a mulher furiosa, com os cabelos loiros presos em um rabo que caminha de um lado para o outro jogando minhas coisas nas bolsas ainda abertas no meio do quarto.
Meu estômago se revira.
Eu sabia que minha mãe estava furiosa. Sabia que ela estava remoendo um sonoro e merecido: eu avisei.
Há semana ela estava desconfiada. Há semanas tinha visto roxos no meu braço e se preocupado com um corte sobre a sobrancelha. Eu menti na época, disse que tinha batido na porta aberta do armário. Mesmo sabendo que tudo era errado. Mesmo sabendo que o Gus estava errado, não conseguia dar um basta, era incapaz de entrega-lo.
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HEART
Roman d'amourQuantas vezes a vida pode quebrar uma pessoa? Adam Baylor tem a resposta na ponta da língua: inúmeras. Vítima de escolhas egoístas, não hesitou em largar uma carreira promissora no hóquei, para tornar-se sobrevivente do inferno, de uma guerra que n...