07 | QUEBRANDO PAREDES

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07
    QUEBRANDO PAREDES
TATE

5 MESES ANTES
COMEÇO DO OUTONO EM BOSTON

O estridente barulho provocado pelo encontro da marreta com uma parede composta por drywall e madeira reverbera por todo o ambiente, junto com a poeira que acolhe nossos corpos, impregna nas narinas e pinica os olhos, mesmo a metros de distância. Um problema que não parecia incomodar o homem - de camiseta branca, calça marrom e coturno empoeirado – que acertava o "x" em vermelho, pintado com tinta spray,  com precisão, força e até prazer, juro que podia vê-lo mais relaxado, cada vez que batia na parede.

Talvez estivesse imaginando minha cabeça no lugar do "x". Principalmente depois da nossa última conversa. Seu braço tenciona-se mais uma vez, seus olhos estreitam-se, e a marreta choca-se contra o material que começa a se despedaçar. Não posso ver seus lábios cobertos por uma máscara branca, porém não me surpreenderia se encontrasse um sorriso sádico escondido.

A não ser, que aquela sessão de quebra de paredes terminasse com ele acertando os câmeras que o rodeavam. Adam os odiava, não precisava falar, sua mandíbula ficava tensa quase o dia todo, seus dedos batucavam na lateral do seu corpo, sempre inqiuetos, além das três carteiras de cigarro que eram consumidas em uma jornada de 6 a 8 horas de trabalho.

Sorte dele e da equipe, que todo aquele contingente de pessoas seria reduzido nos próximos dias. Era só darmos início a reforma da senhora Ortega e sua loja de chá – com tortas, bolos e outras guloseimas, que já eram conhecidas na cidade. Que a equipe seria reduzida a dois câmeras responsável pelas filmagens, um sonoplasta e dois técnicos, para acompanhar a obra em dias esporádicos, já que a emoção ficava para o começo e para o fim.

E claro, eu poderia voltar para o aconchego de Boston, prestar conta a Malori, apresentar os progressos e não ter que ficar acampada improvisadamente no quarto de hospede do Elliot.

Não era chato morar com meu irmão, pai e sobrinha. Até que era divertido, mas Riley acordava antes do Sol raiar. Tomar café como o meu pai era como nos velhos tempos. E Elliot, quase não via o meu irmão, ele sai cedo e chegava tarde. Mas, sentia falta das minhas coisas e do meu espaço, até dos gritos da Alice enquanto assistia série turca, droga, estava sentindo falta de assistir aquelas séries turcas chatas e as novelas latinas com temporadas intermináveis.

Como se a minha vida já não fosse um dramalhão  suficiente.

— Ele não sorri — o comentário ecoa em direção da minha orelha direita, invadindo meus pensamentos, pisco algumas vezes antes de encarar a figura do homem baixo, cabelos beirando para o tom grisalho e barriguinha saliente, além da credencial de diretor tatuada em sua postura — Por que ele não sorri? — Bob pergunta como se eu tivesse que ter a resposta na ponta da língua, enquanto contemplava a figura quebrando paredes.

Dou de ombros. Deixando as respostas voarem pela minha mente, poderia ser lógica e dizer que a máscara estava escondendo os seus belos lábios, não vamos esquecer daquela volumosa barba, talvez fosse esse o problema. Mas sabia que o meu diretor não estava falando daquele momento em questão, mas de todos os captados até então.

— Porque se ele sorrir o inferno congela — minha língua reproduz a resposta que parece mais lógica e meus lábios curvam-se humorados

Bob não sorri. Nada. Nem um vacilar de lábios. Se fosse outra pessoa estaria gargalhando comigo, nem que fosse uma risada gentil e sem humor. Até Adam acharia humor naquilo, lógico que não mostraria. Lentamente desfaço o sorriso em meus lábios, limpando minha garganta para quebrar o gelo do momento nada engraçado.

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