III. Custo

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O forte ventar da manhã ecoa pelos destroços da antiga cidade, dessa forma, uma sinfonia distorcida e amarga amedronta a população. Todavia, o ruído ainda é belo de certa forma ao indicar o prenúncio de uma nova era, seja de renovação ou de destruição.

No meio dessa grande orquestra perturbadora, poucos insistem em permanecer na antiga capital, não resta nada além de memórias hostis e um passado queimado. Porém, duas pessoas contrariam o fluxo de fuga ao ficarem em frente à muralha caída.

Um alto homem segura alguns papéis para mostrá-los à pequena jovem em sua frente, a qual parece confusa e indecisa.

— É-é para eu escolher?  — Aurora parece apreensiva.  — Eu não sou muito boa com decisões!

— Escolha.  — Wem diz com uma voz forte.  — Você que iniciou essa busca.

— Mas... está bem.  — A jovem encara os folhetos com muita indecisão.   —  O terceiro deu medo! Já o primeiro parece mais tranquilo, mas está muito simples, e se não for um ser amaldiçoado? O segundo também é assustador...

— Escolha.  — Wem interrompe seu monólogo.

— O-o segundo... isso o segundo!  — Aurora responde pelo susto.

O brutamontes dobra o segundo folheto e o guarda em um dos bolsos de seus inúmeros casacos, com os restantes, ele apenas os devolve para o mural. Nesse meio tempo, Aurora nota qual de fato ela escolheu, sua face fica levemente pálida em resposta.

— E-eu... queria escolher o primeiro... — Ela cochicha para si.

— Vamos. — Wem se vira para caminhar para fora da cidade sem demonstrar interesse em saber o que a jovem sentiu.

— C-certo.  — Aurora o segue antes que ele consiga abrir uma grande distância.

A volta é pela mesma via de onde vieram, o movimento não mudou, a fuga ainda é predominante. Contudo, as pessoas que encaram Wem agora apressam seus passos, como se quisessem distância dele.

A jovem nota essas reações escancaradas sobre a imagem encoberta de seu novo companheiro. Apesar de saber um pouco do motivo daquilo acontecer, ela ainda estranha as reações alheias. A frase dita por ele no dia anterior surge em sua mente: "Não sente nada?". Será que ela deveria sentir algo? Um sentimento que todos em volta daquele homem sentem?

Seus questionamentos são parcialmente suprimidos ao passarem pela humilde pousada onde dormiram. Aurora acena para aquela velha senhora, no entanto, não obtém uma resposta, ela está concentrada demais na sua flor.

Aquela dona não nota a presença deles, apenas as pessoas próximas mantêm seus olhares vidrados neles, esta é a única conclusão que formula.

Por fim, chegam ao final do subúrbio, o mesmo local da noite anterior. Os campos carbonizados e a terra mexida ficam mais nítidos com o brilhar do sol, um horizonte outrora dourado se tornara negro. Aquela seria a última visão do seu passado, das suas escolhas. Aurora encara o centro da capital mais uma vez, não sente remorso ou qualquer outro sentimento deprimente, seu coração só está repleto de expectativas.

A enorme estrada de pedras se encontra totalmente coberta por fuligem escura. Sua extensão é tão gigantesca que some pelo horizonte levemente montanhoso. As diversas famílias que abandonaram seus lares andam por aquela estrada sem fim em busca de uma nova vida.

Ali começa sua jornada, um vento caloroso agita seus curtos cabelos enquanto seus pulmões se enchem com determinação. O passado ficará para trás, pois não importa mais, sua força de vontade somada aos seus companheiros farão seu futuro, um não tão fácil quanto imagina.

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