IV. Igreja

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Quando a luz do sol fraco vence a escuridão da noite, as sombras que atormentam Aurora se dispersam lentamente. Dessa forma, o coração da jovem se acalma, o frio já passou.

A única coisa escondida no meio da mata oculta é um simples esquilo que guarda nozes em sua boca, o animal se prepara para o inverno. Todavia, ele apresenta pupilas extremamente dilatas, totalmente desproporcionais à luminosidade do local. Além disso, ele a encara por alguns segundos até que sobe uma árvore. A jovem não dá muita importância, é apenas um esquilo.

Aurora suspira de alívio, foi tudo um delírio de sua mente perturbada, ela tenta se enganar que foi apenas um simples sonho. Após embainhar sua espada, ela observa o gigante amarelo, seu primeiro nascer do sol fora da capital, uma imagem que ela nunca se esquecerá, um tão belo quadro de azul-escuro e laranja escondido atrás de montes verdejantes.

Com o seu corpo totalmente calmo, Aurora pensa se é melhor deixar seu companheiro dormir ou o acordar, no entanto, tais opções foram descartadas rapidamente, Wem sumiu.

Aurora encara incrédula a árvore que o brutamontes dormiu, vazia. Rapidamente, sua cabeça gira à procura do desaparecido, mas não há nenhum indício de sua presença entre as folhas. O seu coração bate forte, o desespero e o medo são visíveis em sua face.

Os olhos turbulentos da jovem procuram o máximo que podem, mas nada veem. Por outro lado, seus ouvidos ouvem um som vindo do meio das árvores, um galho se quebrou. A jovem, por precaução, saca a sua arma e aponta para a origem do som, continua com medo daquele pesadelo ser de alguma forma real.

A preocupação logo é substituída por alívio, pois quem surge no meio das plantas é Wem. O brutamontes traz consigo duas miúdas maçãs, as últimas antes do frio. Aurora o encara por alguns segundos enquanto seu coração desacelera, já Wem apenas responde com um olhar neutro.

— V-você me assustou. — Aurora abre um pequeno sorriso enquanto guarda a sua espada.

— Pesadelos?  — Wem se aproxima da macieira onde dormiram.

— Sim...  — Aurora olha para o lado, o sonho ainda a perturba um pouco.  — Como você sabe?

— Você se mexeu muito.  — Wem coloca uma das pequenas maças na mão da jovem.

— Obrigada!  — A jovem agradece antes de mudar de expressão.  — Pera... você ficou me olhando de noite?

  — Alguém precisa ficar de guarda.  — O amaldiçoado morde sua maçã.  — Uma floresta não é segura.

  — É... faz sentido.  — Aurora encara a fruta em suas mãos, ela está com muita fome.

Ao mordê-la, percebe que o gosto não é tão doce quanto está acostumada, além de que sua textura é extremamente farelenta. Considerando que o inverno está prestes a chegar, a maçã não está tão ruim.

Enquanto abocanha sem parar, a jovem percebe que o seu companheiro deu apenas uma mordida na fruta e depois a guardou entre os casacos. A princípio, Aurora pensou em pedir a outra maçã, mas considerou isso meio rude, talvez ele não esteja com fome naquele momento.

Além disso, o rosto dele não está tão coberto pelos tecidos e isso a encanta. Sua aparência nada mudou desde que o viu pela primeira vez há muitos anos, como se não envelheceu nesse período. Sua nostalgia é interrompida quando percebe que ele também está a observando, seu rosto não apresenta nenhuma evidência do que o brutamontes sente, sua face é muito "neutra".

  — Vamos.  — Wem desvia o olhar enquanto se levanta.  — Temos que chegar na vila ainda hoje.

  — F-flaro!  — Aurora termina o último farelo da fruta.  — Será que o ser amaldiçoado estará na vila?

Cursed DreamsOnde histórias criam vida. Descubra agora