V. Catacumbas

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A escuridão dominaria completamente o local caso não existisse uma fraca chama em uma tocha velha. Mesmo com tão fraca luz, as paredes de pedras antigas são visíveis, as quais têm um aspecto bem úmido por algum motivo.

Passos fortes e pesados ecoam pelas pedras, entretanto, um som sinistro e constante os sobrepõe. Gritos de medo são tais ruídos, todos de uma mesma voz aterrorizada, a qual grita inutilmente, ninguém que possa ouvi-la irá a salvar.

Um pequeno rastro de sangue é deixado pelo caminho da centelha devido a um corte não letal, porém profundo e dolorido. O qual não parará de sangrar tão cedo, pois o estancamento é dificultado pelo arrastar sobre pedras ásperas.

Quem sofre tal agressão é uma jovem de cabelos castanhos e olhos verdes, Aurora. O pavor toma o seu coração ao lado da dor, uma que seu ser nunca presenciou, mas sua mente se corda de certa forma.

Seu prolongado choro diminui conforme suas forças se esvaiam, assim desistiu de gritar, pois ninguém pode ouvi-la mesmo. Uma fuga parece improvável, já que não consegue soltar um de seus braços das mãos brutas do velho, mesmo com inúmeras tentativas. Além do mais, o outro membro não está em condições para empunhar sua espada por causa dos ferimentos. Por conseguinte, uma linha vermelha contínua se expande pelo chão, marcando seu trajeto pelas catacumbas.

Uma mofada e robusta porta de madeira negra surge em frente à fraca luz da tocha. Sua maçaneta totalmente enferrujada apenas confirma o excesso de umidade do local, algo inicialmente inexplicável, nenhum rio se encontra próximo o suficiente.

O padre agarra a ferrugem sem hesitação e a gira com um enorme esforço, está emperrada. O local adiante é uma sala estranha, pinturas religiosas rasgadas ou mal cuidadas compõem a beleza perdida nas paredes. Além disso, estátuas de santos quebrados sobre móveis de madeira tão mofados quanto a entrada trazem uma percepção de abandono ainda maior.

A sala é iluminada por tochas fracas, as quais deixam o ambiente um pouco visível. Por causa dessa luz, uma estrutura de pedra pode ser vista no meio do cômodo, ela se parece com uma grande bacia ou uma fonte, mas sobre um pedestal.

— Tu, pecadora, terás que ser PURIFICADA! — O padre a levanta pelo braço e a joga em um banco de madeira. — A punição divina é SEMPRE certeira aos hereges!

O chorar da jovem não simpatiza o agressor, nem mesmo seus machucados sangrentos causam alguma comoção. A mente da jovem apenas deseja que seu amigo aparecesse, a salvasse, mas será que ele está realmente preocupado com ela? Ele ainda nem deve ter notado seu desaparecimento.

— Forasteira e pecaminosa! De onde vens? — O sacerdote indaga com desdém. — Por que ousa caluniar na morada do Senhor?

— D-da capital... — Aurora esconde seu rosto com uma de suas mãos, na tentativa de se proteger. — N-não foi por q-querer...

A feição do fiel muda com a resposta, a raiva nitidamente expressa em sua face se diluiu e sua postura já não é tão imponente. No entanto, claramente aquilo não é uma reação devido a arrependimento ou culpa, não há remorso em seu coração.

— Tu és da capital? — A voz do padre se torna mais suave. — Foste batizada pelo menos?

— A-acho que n-não... — A jovem responde ainda com medo.

— Malditos IMPERIALISTAS! Privam o seu povo de conhecer o real Deus!— O ódio do sacerdote é desviado.— Vamos colocar alguns curativos nesses ferimentos, ninguém está apto a aceitar a verdade de Cristo nessas condições.

Ele caminha até uma pequena mesa empoeirada e desgastada. Nela, o padre procura algo entre as gavetas emperradas, as quais emitem o som de metais quando mexidas. Ao levantar sua mão com uma pinça de metal um pouco enferrujada, o padre indica que achou o que procura.

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