Tristeza.

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A semana seria difícil e corrida para todos. Tudo deveria estar pronto até sábado.

Maraisa acordou sentindo as pernas pesadas e doloridas, havia trabalhado no dia anterior. Seu primeiro dia no emprego novo, era um cansaço bom.

Marília não estava no quarto o que fez Maraisa pensar que ela já havia ido para a empresa.

Naquela manhã fazia frio, e o vento não estava nada agradável. Desceu as escadas bocejando e um grito morreu em sua garganta quando viu Marília de pé na cozinha. Tinha o cabelo totalmente bagunçado, e o roupão não estava bem amarrado. Seria uma imagem extremamente sexy e provocativa, se Carla não houvesse reparado no nariz e nos olhos vermelhos, e nas olheiras que denunciavam a noite mal dormida.

- Bom dia. - ela disse com a voz mais rouca que o normal por ter acabado de acordar - Caiu da cama?

Ela não sorriu. Mau sinal.
O dia de Maraisa realmente não havia começado bem... ou melhor nem se quer havia começado a julgar que o seu dia começava apenas depois de ver o sorriso de Marília.

- Café? - Marília ofereceu indicando a térmica em cima da pia.

- Sim. - ela disse estreitando os olhos e a analisando - Está tudo bem?

- Porque não estaria? - o tom da sua voz soou frio.

- Não sei. - ela disse tomando o primeiro gole de café - Você parece abatida. Triste.

- Eu apenas não dormi bem esta noite. - deu de ombros sem encará-la.

- Você está doente? Porque não dormiu?

- Não creio que esteja doente. Apenas não consegui dormir.

O silêncio que veio em seguida tirou uma boa parte da paciência de Maraisa e quando ela estava prestes a gritar Marília falou.
- Vou subir. Não precisa se preocupar.

Maraisa arregalou os olhos.

- Você vai passar a tarde aqui? Não vai trabalhar? Digo, não vai para a empresa?

- Não, hoje não. - ela disse já no alto da escada, e logo o barulho da pesada porta do quarto dela foi ouvido.

Maraisa piscou uma, duas, três vezes, e continuou atordoada. Ela sabia que Marília jamais faltaria ao trabalho naquela semana. Ela era peça chave pra tudo funcionar bem. Algo estava errado.

Sentia-se culpada por ter que deixar Marília ali, sozinha. Mas não podia faltar ao emprego que tinha acabado de conseguir. Já estava atrasada. Terminou de tomar seu café rapidamente e subiu, apenas para despedir-se.

- Marília, preciso ir. Você ficará bem? - ela disse na esperança de obter uma resposta.

- Vá, Maraisa. Tenha um bom dia. Já falei que não precisa se preocupar.

Maraisa notou que ela estava chorando. Não conseguia disfarçar tão bem assim.

- Me deixa entrar, por favor. Amor, o que está acontecendo? - ela disse encostando as costas na porta.

Ouviu alguns passos e em seguida o barulho da chave. Marília abriu a porta e caminhou em direção a cama. Era Maraisa, não tinha o que temer.

Ela estava chorando? Maraisa sentiu seu coração quebrar.

- Você está chorando? - ela perguntou sentindo-se idiota dois segundos depois.

Marília secou o rosto e respirou fundo. Maraisa não pode mais aguentar, terminou com a distância que existia entre elas sentou-se na cama e a abraçou. Marília não a afastou, apenas aproveitou o abraço e não conseguiu mais segurar o choro. Era um choro pesado, a dor era palpável. Maraisa lutava contra algumas lágrimas que teimavam em deixar seus olhos.

- O que houve? - ela perguntou de novo - Fale comigo Marília, por favor.

O quarto ficou em completo silêncio até ela indicar com a cabeça o porta-retratos ao lado da cama em cima do criado mudo.

- São seus pais? - ela perguntou analisando o casal da foto.

Ela apenas assentiu. Não falou nada estava com muita vontade de chorar, mais algumas palavras e elas acabariam em um rio de lágrimas.

- Hoje fazem cinco anos que eles se foram. Cinco longos anos. - ela disse com a voz baixa.

O olhar de ambas se encontrou e ela por algum motivo, sentiu como se algo fosse conectado, e graças a essa conexão pode interpretar a dor contida nos olhos vermelhos da ruiva. Aquilo a emudeceu, e ela sentiu os olhos marejando mais. Querendo ou não, ela sabia a dor que Marília estava sentindo.

Maraisa tinha seus pais e seus irmãos, Yasmin e Marco Cesar. Os três costumavam caminhar em um parque perto da casa de seus pais, todas as tardes. Era um lugar calmo, quase ninguém passava por ali. Eles nunca haviam ido sozinhos. Até um certo dia em que Marco teria aula pela tarde e Maraisa ajudaria a mãe com algumas tarefas em casa.

Yas então resolvera andar sozinha pelo parque. Não tinha como alguma coisa dar errada, tinha? O lugar era calmo e ela estava tranquila. Mas aquela seria a última vez que a menina pisaria no parque. Passaram-se dias, semanas, meses... Nove meses até o corpo de Yas ser encontrado.

Ela estava enterrada perto da árvore onde eles brincavam. Haviam balanças penduradas naquela árvore. Era uma das coisas favoritas de Yas, balançar até as alturas e pular, uma das coisas favoritas dela depois da câmera polaróide que o pai delas havia comprado no natal, claro. Ela costumava fotografar tudo. Era sua verdadeira paixão. Maraisa acreditava que ela seria uma grande fotógrafa.

Ela saiu para brincar, saiu para fotografar as flores e os pássaros e nunca mais voltou pra casa. Maraisa e Yas nunca mais voltaram naquele parque. Nada nunca mais foi o mesmo.

- Pode parecer idiota, - ela disse com um sorriso fraco - Mas ninguém é forte o suficiente quando se trata da saudade de alguém que ama incondicionalmente. Sinto falta de uma família, Maraisa.

Os pais de Marília nunca quiseram ter mais filhos. Ela era o suficiente e era o mundo deles. Tudo o que o pai dela havia construído era pensando no futuro da filha. Mas todos esperavam que fosse demorar muito mais tempo para que ela tivesse que dar conta de tudo sozinha.

Maraisa surpreendeu-se quando uma vontade insana de chacoalhar os ombros da mulher a sua frente e gritar que ela era sua esposa e que era sua família, mas não o fez, apenas a abraçou com força.

- Eu sei como se sente, Lila. O mundo parece cruel e frio quando nos é tirado alguém que tanto amamos. Mas eu estou aqui, amor. Você pode contar comigo. - ela disse acariciando o rosto de Marília e limpando suas lágrimas.

Ela retribuiu o abraço sentindo o cheiro doce dos cabelos soltos de Maraisa. Sentia seu coração menos pesado. Era como se toda angústia que sentia tivesse sido adormecida por aquele abraço.

- Eu sei. - ela disse parecendo mais controlada. - Estou aqui também... Quando se sentir pronta para falar sobre isso.- ela sabia que a vida de Carla era cheia de segredos, mas percebia pelos olhos dela que aquele era doloroso demais. - Marília afundou o rosto no pescoço cheiroso de Maraisa depositando um beijo logo em seguida. Voltando a olhar nos olhos de Maraisa ela não pode conter a vontade de beijá-la.

Era um beijo calmo, um beijo que dizia que uma estava ali pela outra. Nenhuma estava sozinha. Apesar de toda a dor que sentiam. Apesar de terem perdido partes importantes de seus corações. Era um beijo cheio de...amor.

- Eu não aguentaria nenhum dia a mais sem você aqui. - Marília disse em meio ao silêncio fazendo o coração de Maraisa bater ainda mais acelerado.

- Eu também não. - ela disse acariciando o rosto da loira e sorrindo.

- Acho que você está atrasada. - Marília disse fazendo a esposa dar um pulo da cama.

- Meu Deus! Eu preciso ir, você ficará bem? Promete? Promete?- ela disse fazendo Marília levantar e abraçá-la.

- Ficarei, amor. Vou adorar ser a esposa que espera em casa. Quer que eu prepare seu jantar?- ela disse debochada arrancando uma gargalhada de Maraisa.

- Eu trago alguma coisa da rua. - Eu te a...Eu tenho que ir - ela disse dando um selinho na loira e saindo do quarto.

Ela queria mais que tudo ter dito eu te amo. Era o que ela sentia afinal. Amor. Ela amava Marília e não lutaria mais contra isso.

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