— Morta? Como diabos a princesa está morta? — esbravejou a Rainha, atirando ao chão o cálice dourado, que tilintou antes de derramar o vinho escuro dentro de si sobre a madeira. — O que raios eu fiz para que Deus decidisse me castigar de uma forma tão cruel?
O menino engoliu em seco, sem saber ao certo o que responderia. Não tinha mais que seus dezesseis anos e era pequeno demais para a roupa que usava — um traje encouraçado e escuro, cujo único detalhe era o brasão em forma de diamante pregado em seu peito. Dentro do cômodo espaçoso do castelo, iluminado por poucas luzes de velas que ameaçavam esgotar a cera a qualquer instante naquela altura da noite, havia apenas ele e a monarca.
— Como tens certeza de que a carruagem queimada é, de fato, da comitiva de Jasgônia?
Tímido, o rapaz correu a mão até a bolsa que carregava consigo, e dela retirou uma coroa prateada, tão imponente quanto a da própria Rainha. Cravejado de rubis — da mesma cor da Casa Real de Jasgônia —, aquele havia sido o único objeto que sobrevivera ao fogo.
— Estava junto às cinzas, Majestade. Temo que o esquele...
— Não diga mais nada — pediu Constance, transtornada. — Não diga mais nem uma palavra.
O menino sacudiu a cabeça em um "sim".
— Qual é mesmo o seu nome, menino?
— Gaspar.
— Escute bem, Gaspar — a voz da Rainha havia soado tão ríspida ao soletrar seu nome que o garoto se encolheu. — Mais alguém sabe das coisas que seus olhos viram?
O menino acenou com a cabeça para os lados em um "não".
— Ótimo. Não contarás nem uma palavra sequer sobre o que aconteceu, está de acordo? Nem mesmo aos seus pensamentos: esqueça tudo. Faça de conta que em sua viagem tudo o que encontrou foram os campos floridos de verão e uma alegre comitiva do outro reino que foi avisada sobre a urgência do matrimônio e encaminhada para um atalho seguro, sim?
Ele engoliu em seco e assentiu.
Constance aproximou-se do rapaz até que a distância entre os dois fosse mínima. Ela era alguns centímetros mais alta que ele e sua sombra projetava-se sobre toda a silhueta do garoto, ofuscando-a em uma penumbra ameaçadora.
— Lembre-se de que conheço sua mãe, seus sete pequenos irmãozinhos, sua avó enferma e a sua prometida. Deve saber, segredos são segredos. Sabe quais são as únicas formas de mantê-los a salvo?
Ele não respondeu, e a Rainha prosseguiu:
— Quando quem sabe sobre eles está morto ou calado. Qual dessas maneiras você prefere?
— C-calado, Majestade. Calado — repetiu, em uma afirmativa que estava mais direcionada a si mesmo do que à mulher à sua frente.
— Ótimo. Não tenho dúvidas de que será um bom rapaz — Constance sorriu e afagou os cachos brilhantes do menino. Era bastante parecido com o príncipe quando tinha aquela idade. — Prove ser digno de minha confiança e o lugar do velho Belriques será seu.
Ele sacudiu a cabeça de uma forma assertiva, quase tão trêmula quanto suas pernas, que lutavam para continuar eretas.
— Vá. Não conte também a ninguém sobre o infeliz incêndio que ceifou a vida de um grupo de mercadores do reino.
— S-sim, Majestade. Que infeliz tragédia assolou o grupo de viajantes. — Em uma vênia tão desajeitada como Constance jamais havia visto, ele se despediu e a deixou sozinha no grande escritório.
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A ascensão da Rainha | Livro I | Trilogia Declarações de Amor e Guerra
RomanceDesde a última grande guerra envolvendo a Península Lesíada, os reinos de Jasgônia e Verdela estreitaram as suas relações e decidiram selar a aliança entre as duas maiores monarquias da região em um casamento entre Lenora, princesa das Terras Fértei...