Capítulo 5

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No calor escaldante do Rio, Sáskia esperava que a tia desapegaase o mínimo da jaqueta e do gorro já quase míticos, mas eram “sagrados” como ela dizia. Menos sagrado era o jeito quase suicida que ela dirigia aquele carro o que já dava a Sáskia uma ideia de como tinha sido expulsa da bienal.

— Sério, tia? Por causa de um livro “não exato”?! — começou Sáskia, enquanto passava batom no espelho do carro.

— Digamos só que eu entrei numa discussão com um historiador lá.

— Descer a porrada no homem não parece uma discussãozinha.

— O babaca teimou e teimou com a data errada da construção das pirâmides! O que queria que eu fizesse?

Poucas foram as vezes que Sáskia esteve numa bienal em lançamentos, mas sabia que a ideia louca de tentar passar pelos seguranças numa manhã de sábado já era demais para os malabarismo da tia. A fila no sol de rachar já fazia Sáskia suar mesmo usando aquela camisa sem mangas.

— Como consegue usar esse treco aqui? — perguntou, dando um gole na garrafinha de água.

— Depois de te obrigarem a usar algo por tanto tempo você meio que se acostuma.

Sáskia a fitou de cima a baixo.

— Mamãe também tem essa mania. É de família?

— Sua mãe é... — Sabrina suspirou, de braços cruzados. — Sua mãe não tem coragem para fazer o necessário.

A vez das duas chegaram, e o guarda da fila as encarou cerrando o cenho para uma sorridente Sabrina que já enrolava o braço de forma carinhosa ao redor do pescoço da “filha”.

— Ela não pôde vir com o resto da escola, sabe? Vim trazer ela.

— Senhora, hoje é sábado. Além disso, — Ele apontou para o pescoço de Sáskia. — Cosplayers precisam de credenciais para o evento.

— Do que você me cham-

— Uma criança, senhor — começou tia Sabrina, já com lágrimas de crocodilo banhando entre olhos. — Uma aspirante a escritora com um sonho, e esse sonho pode ser parado por você, ou...você pode ser o herói que vai colocar um sorriso na cara dela.

Um outro guarda apontou para as duas.

— Espera aí, você é aquela maluca de ontem!

— Não sei do que está falando.

Tia Sabrina puxou Sáskia aproximando-se, sussurrando:

— Me diz que essas perninhas já podem correr.

— Eu me curo rápido, tia. — murmurou. — Mas não tão rápido assim!

— É agora ou nunca...

Tia Sabrina já erguia o braço apontando para a multidão, tentando usar o truque mais velho do mundo para distrair os guardas. Mas antes que pudesse arrastar Sáskia pelo vão entre o homem e a barreira, uma voz feminina soou vinda de um estande.

— Oxente! Major Joana?

Uma mulher alta, de semblante grosso e uniforme se aproximou fazendo o guarda que já segurava o colarinho de Sabrina a soltar e se voltar para ela.

— Dona, a senhora conhece essa mulher?

— Oxi, se eu conheço?! Major Joana é umas mulher de respeito, rapaz! Solte ela!

O guarda fitou tia Sabrina por um instante. Tia nunca esteve no Nordeste até onde Sáskia sabia, mas o sotaque que ela puxou ao se dirigir a mulher soava tão similar que podia muito bem se passar por uma nordestina.

Sáskia e os Caçadores de Deuses Onde histórias criam vida. Descubra agora