🍒 06. CEREJINHA 🍒

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Durante todo o caminho para casa eu reflito sobre a conversa que tivemos. Algo não fazia sentido em suas palavras e eu acho que ele realmente ainda está escondendo algo de mim, mas eu me pergunto o que poderia ser para ele sequer querer compartilhar e pior, tentar encobrir isso com alguma mentira.

Jotaro sabe muito bem que eu sei ler ele com a palma de minha mão, e sei muito bem todos os seus sinais quando algo não está certo. Sei todas as suas expressões e até mesmo as quais ele usa apenas quando está do meu lado, como sorrisos sinceros; sorrisos esses que praticamente ninguém fora capaz de presenciar na escola, ou até mesmo em sua família, apenas eu e Holly.

Assim que finalmente chego em casa, eu desabei na cama. Expliquei aos meus pais porque demorei, pois estava na casa de Jotaro. Os nossos pais sempre foram grandes amigos de Holly, por isso não havia problemas em me demorar demais na casa dos Kujo, assim como Jotaro ficar aqui até o anoitecer.

Tomei um banho demorado, gosto de pensar um pouco enquanto lavo os cabelos, renovando meu ser. Sinto-me muito mais aliviado em termos conversado, Jotaro havia voltado a ser o Golfinho que era antes. Ou talvez em partes.

Sinto que ainda há algo que ele esconde de mim, mas se não me contou durante toda a nossa conversa deve ser porque ainda é algo que ele mesmo vai precisar resolver sozinho, e nisso eu não irei me intrometer, eu sei dos meus próprios limites quanto a ele. Sempre deixei claro que estou sempre do lado dele para o ajudar em qualquer coisa que precise, tudo e mesmo que ele esteja ainda com certas questões ainda não resolvidas, eu estarei ali para o Golfinho. Assim como ele sempre esteve comigo.

Como crescemos juntos, Jotaro viu os meus melhores e piores momentos, assim como eu os dele, embora fosse extremamente raro devido a sua personalidade. Estamos sempre ali um pelo outro.

Agora eu estou sentado em frente de meu notebook, em minha mesa de estudo. Meus cabelos recém enxugados ainda pingam algumas gotas de água pelo meu rosto — sendo sugados pela toalha que deixei em volta de meu pescoço para evitar molhar minha roupa —. Eu me sinto cheio de vontade em botar todos aqueles sentimentos, que acabei reservando em meu peito, para fora, e sem Jotaro para me escutar no momento o que me resta é voltar a minha história.

Tudo o que eu escrevo aqui nada mais é do que um Noriaki em seu estado mais cru e nu possível, despido de barreiras e amarras. Sentimentos que eu sempre quis expressar e dedicar exclusivamente a meu melhor amigo, mas não que tenho a coragem de confessar, pois sei que não há como ser mútuo. Eu reconheço isso e hoje lido da melhor forma e menos dolorosa possível.

Só que há momentos em que todo esse bolo de sentimentos volta de repente em meu ser, que me pega de guarda baixa e não consigo me recompor em alguns momentos.

Lágrimas quentes caem pelas costas de minhas mãos, escorrendo então por meus dedos nodosos. Eu sei que este é um desses momentos em que simplesmente não consigo lidar sozinho com tudo isso que sinto, com tudo isso que tento tanto guardar apenas para mim quando estou ao lado dele, esperando ansiosamente apenas pelo momento de estar em frente de meus documentos e escrever as palavras, para desinchar um pouco esse meu coração tão dolorido quando as palavras finalmente fluem pela minha tela.

Dessa vez tudo acaba saindo em palavras ainda mais dolorosas do que das outras vezes. Quando escrevo e pinto, é muito normal que o resultado final seja influenciado pelo meu estado emocional e psicológico no momento. Por isso, sinto que será um capítulo deveras doloroso, tanto de escrever quanto de ler.

Não posso fazer muito, apenas sou eu ali em forma de texto.

Eu faço o meu melhor, por horas a fio eu digito e digito pacientemente, deixando aquelas ondas de emoções deslizarem agoniadas por meus dedos nervosos e se transformarem em palavras, frases, parágrafos, cheios de tudo e melancólicos como nunca antes eu fiz.

Palavras estas que apenas posto nesse site porque eu sei que Jotaro jamais irá ler. Não existe qualquer probabilidade dele descobrir sobre e isso me alivia em níveis astronômicos, pois sei que tenho a segurança em poder abrir o meu coração sem que ele descubra esse meu lado mais desnudo.

Lado esse que eu sonho em mostrá-lo, mesmo que seja apenas em meus mais profundos desejos, em uma realidade fantasiosa no qual ele pode e quer me corresponder. Uma em que ele me abraça e me beija, chamando-me de namorado e me defendendo do ataque dos outros como o seu companheiro, não apenas como o seu melhor amigo.

Quando eu finalmente desperto do embalo de minhas próprias palavras, eu salvo o documento, copio e colo na caixa para o texto, na página já carregada. Eu edito rapidamente algo aqui e ali e está pronto. A última parte que falta é apenas o nome do capítulo.

Eu geralmente escuto músicas enquanto escrevo, mas hoje foi diferente. Eu sei como minha mente funciona, caso fosse escutar a minha playlist de sempre eu acabaria com o capítulo extremamente deprimente, eu não quero fazer algo assim, não quando o fluxo da história é completamente diferente do que escrevi para hoje.

Apenas vasculho em minhas memórias alguma música que acabe representando a bagunça que encontro dentro de mim.

E assim digito "Capítulo 28: Feuerengel". Fico feliz e realizado quando abro comentários de seguidores assíduos da história, comentando sobre como pegaram a referência dos títulos de capítulos. As letras das músicas geralmente representam uma versão muito mais resumida dos textos que eu escrevo, além de me ajudar a organizar e expressar minhas ideias da forma mais fluida possível.

Preciso postar isso hoje ou eu acabarei me arrependendo daquilo por agora, apagando tudo e esquecendo aqueles dias de angústia. Não posso fazer isso, pois é o dia da semana que designei para as atualizações, não gosto de faltar com os meus compromissos, mesmo que eu não tenha obrigação de fazer isso à risca. Gosto de seguir um fluxo e sinto que me perco demais se eu não o fizer.

Assim que eu envio meu texto para a atualização da história, eu desligo o notebook e finalmente me arrumo para poder deitar. Preciso dormir.

Eu estico meus braços antes de pegar o celular esquecido em cima de minha cama, deitando-me em seguida. Os dedos estão doloridos depois de horas digitando e me dedicando a estar na frente do notebook — mesmo que o texto tenha ficado pequeno dessa vez, eu precisei de muito mais tempo para organizar tudo —, os olhos ardendo depois do breve choro, além de precisar de uma boa quantidade de sono do qual eu acabei me privando no final de semana.

Lembro brevemente que naquela sexta, quando tudo aquilo começou, eu acabei tão abalado que sequer parei para ler os comentários do capítulo de quinta. Eu abri o capítulo de minha história no celular, lendo rapidamente todos os comentários que foram se acumulando ao longo do final de semana.

Puxei os lençóis para me enrolar igual um burrito, confortável o suficiente para relaxar antes de dormir. Meus olhos ardem novamente com a claridade da tela, — eu reduzo a luminosidade antes de ficar cego — o sono querendo me dominar cada vez mais, mas eu ainda me forço a me dedicar a leitura daqueles que gostam de minhas palavras, de minha história — mesmo que eu jamais tenha afirmado, em algum lugar da história, ser sobre minha pessoa e vida real, minhas experiências e sentimentos.

— Espero que ele possa voltar à escola amanhã.

Murmurei antes de me deixar amolecer completamente de sono, largando o celular depois de finalizar toda a leitura de comentários.

Eu finalmente terei uma boa noite de sono.

Lieblingsmensch | (Jotakak)Onde histórias criam vida. Descubra agora