🐬 11. GOLFINHO 🐬

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— Cuidado, você vai à falência, Golfinho.

Eu já estou falindo, Noriaki. E não estou falando das cédulas de mentira do jogo diante de mim. Minha mente está em uma falência gradual. Por dentro, estou tão confuso que sinto como se estivesse falido há um bom tempo, derrotado em todos os aspectos. Não sei me expressar, nem me concentrar; ler um livro de cabeça para baixo é a prova disso.

Continuo olhando para as peças do Monopoly diante de mim, sem saber qual o próximo movimento que farei sobre o tabuleiro. Eu queria logo acabar aquela partida que já durava pouco mais de uma hora, eu não me divertia tanto mais com o jogo, pois desde os catorze anos que o mesmo ficava em um armário no sótão, pegando poeira e resistindo ao tempo.

— Vai, é a sua vez! — Noriaki me pressiona novamente. Estou ficando agoniado com a provável derrota, e quanto mais o Cerejinha me apressa, mais entro em desespero.

— Calma!

Comparo minha vida com aquele jogo. Não tem mais volta, fui capturado em um ponto sem retorno, onde a única coisa que devo fazer é apenas aceitar a falência e seguir em frente. E é o que faço, pelo menos no jogo. Enfio as mãos por baixo do tabuleiro e o viro de uma vez, bagunçando todas as peças sobre a cama.

Minha ação surpreende Noriaki, que gargalha e leva as mãos à boca.

— Eu não acredito que você ainda faz isso, Golfinho! Você cresceu, mas ainda não aceita perder, é inacreditável!

Ah se ele soubesse que eu já havia aceitado a derrota que eu chamo de vida... Deito de vez na cama, esticando as pernas por cima das peças do jogo bagunçado sobre a mesma.

— Mais uma vez você me venceu, Cerejinha. — declaro, totalmente derrotado por dentro. Parei de jogar Monopoly justamente por me estressar muito com o jogo e sempre assumir a derrota antes do tempo. E isso sempre fazia de Noriaki o vencedor. Eu não me importava com suas vitórias, e sim com a minha paciência quando me colocam sob pressão. E só de ter metade da noite investida no joguinho, minha cabeça começou a pesar ainda mais.

Após o ocorrido na biblioteca, passei a ignorar "Harry Potter", e a única coisa que eu ansiava por ler era "Lieblingsmensch", e tenho que confessar uma coisa: nesse meio tempo, reli o livro de Noriaki mais de seis vezes. Não sei se isso conta como obsessão, mas a única coisa que me atrai no momento é unicamente ler. E não quero ler qualquer coisa, quero ler algo feito por Noriaki, estou exigente demais, porém não tenho culpa se o Cerejinha conseguiu a proeza de fazer com que eu —que antes só lia panfletos — lesse textos mais longos.

Como na semana passada não nos encontramos no fim de semana, é a vez dele vir até minha casa. E desde as duas da tarde que Noriaki e eu nos trancamos no meu quarto, se ocupando com atividades inúteis — e o Monopoly era uma dessas. Cerejinha sempre se recusava a jogar videogame comigo por odiar todos os jogos na minha conta da PlayStation Store, que era recheada com todas as edições anuais do FIFA.

— Eu não entendo como você se declara um perdedor tão fácil assim.

O comentário de Noriaki me leva a entender ainda mais que ele me decifra facilmente.

— É só um joguinho, ganhar ou perder não vai mudar em nada na minha vida. — digo, consciente de estar falando a verdade.

Noriaki se deita na cama junto comigo, mas do lado oposto, próximo aos meus pés. Jogo em sua direção um travesseiro, e ele imediatamente apoia sua cabeça acima dele. Tem um silêncio muito pesado pairando entre nós, e não gosto disso. Acho que eu sou o culpado, e logo penso em algum assunto para quebrar o clima depressivo entre nós:

— Cerejinha, quantos livros você já leu até hoje?

Noto as sobrancelhas vermelhas dele se franzir enquanto olha para mim.

Lieblingsmensch | (Jotakak)Onde histórias criam vida. Descubra agora