CONHECENDO UM ESTRANHO

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Um pouco mais tarde minha avó, Silvia, mãe da minha mãe e do meu tio, chegou em casa aos prantos e me disse:

- Luquinhas, vai ficar tudo bem, eu – ela deu um tempo pois não conseguia falar de tanto chorar – vou vir aqui morar com você.

Eu fiquei feliz, porque na época na sabia fazer nada em casa, por favor não riam mas... eu não sabia fazer um miojo... 

Você deve estar se perguntando por que não estava tão triste, bom, certamente que se a minha mãe ficasse me vendo daquele jeito ficaria triste, então superei por ela.

Três dias depois, eu estava no velório dos meus parentes, estavam todos me falando coisas como: "Eles estão em um lugar melhor agora", "Não chora tá?". Mas falando sério, eu que tinha que falar isso pra eles, eles não paravam de chorar na minha frente enquanto eu estava num estado emocional perfeito.

Então de repente, todos se levantam e ficam olhando para algo atrás de mim, quando olho vejo um homem, de cabelos pretos iguais ao meus, olhos castanhos iguais aos meus, pele que certamente vinha de índios iguais a minha, ele usava um óculos de sol bem escuro, uma camiseta vermelha, com uma jaqueta de couro preta, uma calça jeans e um tênis All Star azul marinho.

Atrás de mim ouvi coisas do tipo: "o que ele ta fazendo aqui?" "ele tinha que aparecer aqui logo hoje?".

Ele se aproximou de mim, quando ia dizer algo, minha avó me puxou e berrou:

- Não toque no meu neto seu canalha! Eles morreram por sua culpa eu sei!

Eu olhei pro homem e pra minha avó assustado, então o homem falou:

- Olha Silvia, eu vim falar exatamente sobre isso com você e meu filho.

Eu queria muito acreditar que o "filho" não era eu, mas quem mais seria? Eu estava com sentimentos confusos, surpreso e feliz por conhecer ele e desconfiado também, porque eu tinha dez anos e não conhecia meu pai, e sempre que eu perguntava dele pra minha mãe ela começava a chorar e ia pro quarto ou gritava comigo falando para eu nunca tocar mais no assunto. O homem ficou de joelhos na minha frente e disse carinhosamente:

- Oi Lucas, tudo bem filho?

- Oi pai, tudo... eu acho.

Minha avó ainda desconfiada chamou a nossa atenção falando:

- Vamos lá fora, temos muito a conversar.

Ele concordou e nós fomos para a calçada conversar, se bem que eu nem sabia sobre o que.

Ela virou e falou furiosamente:

- Por que você deixou a Clara na pior hora possível?

Eu estava começando a entender...

- Eu não tive escolha Silvia, e você sabe disso – ele berrou.

A minha avó pediu pra eu voltar para o velório eu disse tudo bem, mas na verdade me escondi atrás de um pilar e ouvi toda a conversa. A dona Silvia começou:

- No dia que ela ganhou o Lucas você foi embora Ricardo.

O nome dele era Ricardo? Será que era por isso que a minha mãe não gostava do Ricardo da escola? Acho que sim. E ele respondeu:

- Você sabe que eu queria ficar com eles, ter a minha família mas era impossível, eles estavam e ainda estão atrás de mim, você sabe por isso que eu fui embora senão nós três iríamos morrer.

Minha vó começou a chorar de raiva e gritou:

- Era pra você morrer não ela!

Já tinha ouvido demais para um garoto de dez anos. Voltei correndo para o velório.

Quando estávamos no enterro, meu pai (naquela época era muito estranho falar isso), se aproximou de mim e disse:

- Quer tomar um sorvete depois?

Eu respondi:

- Claro papai!

Ele abriu um sorriso bem largo pra mim, eu também sorri pra ele eu olhei pra minha avó e pelo o que eu entendi ela disse que eu podia ir. Na hora que iam começar a jogar terra nos caixões as pessoas começaram a prestar suas homenagens, fui o último e bem baixinho eu falei:

- Família, fiquem tranquilos, eles irão pagar, a justiça chegará, eles vão queimar...

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