CAPÍTULO 02

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ALUGA-SE UM QUARTO PARA ESTUDANTES:

Carlo deixou a carta guardada na gaveta do escritório por dois dias, sem vontade de continuar a leitura. Porém, passado o susto inicial, a curiosidade e a possibilidade de um best-seller aumentava.

Resolveu ler a última, transferir para o notebook e, chamar um detetive da polícia. Assim, teria algum conteúdo para o próximo livro e se livraria do estigma de acobertar algum sádico assassino, solto por aí. Não queria ser visto como um escritor com mancha na consciência. Só em imaginar pessoas sofrendo nas mãos daquele louco, embrulhava seu estomago.

Após o jantar solitário, conversar com a família e escrever para seu editor, fechou toda a casa e subiu em direção ao estúdio. Largou o bule de chá com bolacha, sob a mesa e abriu a gaveta, fitando o envelope amarrotado, entre documentos e contas pagas. Pegou-a e se ajeitou na poltrona reclinável, iniciando a leitura.

Lá fora, começava a chover, criando um clima de tranquilidade em contraste com as linhas da carta a seguir:

Eu já estava para me formar e, conseguido um estágio na própria universidade por mérito e mais altas notas, com renumeração mensal. Estava me preparando para um futuro mestrado. Era bem difícil conseguir esta honra, mas para mim, algo fácil e beirava ao ridículo tanta pompa por algo tão normal pra mim. O que me facilitava, era transitar por entre futuras presas deliciosamente frágeis, sem fazer esforço algum.

Estava já com 20 anos e procurava alugar um dormitório fora do campus, mas não longe da universidade e nem cara demais. Não demorei muito em descobrir que uma senhora idosa e viúva, estava alugando seu porão, devidamente mobiliado, para estudante. Era realmente perfeito demais, pra mim!

Fui até lá, com a melhor das minhas caras e, me admirei com o esmero do jardim. Lembrei-me de minha mãe tão logo avistei a casa de tijolos, no fim da rua

Bati a porta, não muito forte. Velhinhas não suportam que arranhem a pintura da porta, mas também são surdas para batidas leves demais. Surtiu efeito, pois o clique do trinco, mostrou que ela ouvira minha batida. Ajeitei minha camiseta universitária e escolhi meu melhor sorriso

- Olá? O que deseja, meu jovem? – Uma senhora de cabelos grisalhos, estatura pequena e cheirando uma mescla de alfazema e cebola. Logo descobri que ela morava sozinha, pois segurava a porta com uma mão e a outra, o trinco sem escancarar.

- Boa tarde, minha senhora. Me chamo Thomas e sou estudante da Universidade Cornell. Soube que a senhora tem um quarto para alugar.

Ela me analisou, seriamente. Me irritou a forma com que aquela velha me encarava. Na minha mente, eu cozinhava o crânio dela em uma panela imensa, com muita cebola! Quase soltei uma gargalhada com a cena, mas me contive, mostrando um sorriso tímido.

- Tem que dar um mês de entrada e os documentos da universidade. Tens algum animal?

- Como estou fazendo estágio e pretendo iniciar meu mestrado, posso adiantar dois meses, para a senhora, já estou com todos os documentos necessários aqui e não. Eu não tenho nenhum bicho de estimação. Não que eu não goste, mas com o tempo corrido, não tenho este privilégio. Meu velho cão está com meus pais.

Ela se admirou com minhas palavras e, por algum momento, vi uma nostalgia surgir nos velhos e embaçados olhos azuis dela. Abriu a porta, me deixando entrar na sala de estar.

Entrei, pisando no assoalho encerado. O aroma de alfazema invadiu minhas narinas, mas segurei a vontade de espirrar, fui andando até um sofá florido com almofadas de crochê, devidamente arrumadas e analisei tudo ao meu redor. Quadros, retratos, flores, cortinas, livros...

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