Fogo.
Tudo o que havia a minha volta era engolido numa velocidade assustadora pelas chamas.
Pessoas, zumbis, casas e plantações, tudo se transformava em cinzas diante dos meus olhos.
E eu corria, e corria, e corria, de um lado pro outro, sem nunca chegar a tempo de salvar ninguém. As chamas nunca chegavam a mim, mas tudo o que eu queria era queimar também.
No meio de toda a confusão, eu ouvi vozes conhecidas gritando por mim. Virei o rosto devagar, com tanto medo do que veria que mal conseguia me mover, mas a cena era ainda pior do que qualquer coisa que eu fosse capaz de imaginar.
-Clarisse! Por favor, nos ajude! Por favor! - Carl, Paul, meus pais e Kalel suplicaram em coro, de joelhos em frente a um grande monstro feito de fumaça.
Eu fiz tudo o que podia para chegar até eles, chorando e implorando aos berros para que eles fossem poupados, para que eu fosse destroçada em seus lugares, mas minhas preces nunca foram atendidas. O monstro de fumaça gargalhou, debochando do meu desespero, e então os engoliu um a um. Até que não me restasse mais nada...
Em dado momento, sem mais forças, eu tropecei em algo no caminho. Meu corpo desamparado foi ao chão com força, meus olhos se fechando inconscientemente com o impacto.
Quando abri novamente os olhos, o cenário havia mudado bruscamente. Só restava a fumaça e uma fina areia escura que cobria o chão, o horizonte vazio parecia irreal.
Um tremor violento, porém, fez meus ossos doerem com a realização de que a areia fina no chão não era apenas areia. Cinzas. Eram as cinzas de cada pessoa que havia morrido naquela noite, na noite em que os Salvadores atacaram o Reino. As cinzas de cada pessoa que eu conduzi pessoalmente à morte.
Um grito estrangulado saiu sem aviso dos meus lábios, ecoando pelo silêncio mórbido daquele lugar. Eu tentei levantar, mas minhas pernas afundaram no chão arenoso. Sem escapatória, eu fui engolida até que não pudesse mais respirar ou me mover. Engolida pela minha própria culpa...
XXX
Meus olhos se abriram de repente no momento em que a areia finalmente me sufocou, e por reflexo eu saltei para o lado como se tivesse recebido uma descarga elétrica. Tonta e com a visão embaçada, puxei o ar com força algumas vezes, como se meus pulmões não estivessem funcionando como deveriam. Com a escuridão no comodo, eu sequer sabia onde estava, meu corpo inteiro doía e tremia como se eu tivesse sido espancada por horas e uma sensação horrível de enjôo se apoderou de mim ao sentir um cheiro podre invadir minhas narinas.
Com a pouca força que me restava, tateei o cós da calça em busca de meu revólver, mas não encontrei o revólver e nem mesmo minha calça no lugar correto. Meus dedos subiram um pouco e estranhei ao encontrar um tecido estranho amarrado em volta de meu abdômen, mas compreendi sua existência quando ao tentar me mover, uma pontada excruciante de dor tomou conta de uma região específica em minha barriga.
Não pude conter um grunhido de dor com a sensação e amoleci no chão novamente, estremecendo quando uma rajada cortante de frio entrou por uma fresta entre o cobertor e a minha pele. Longos minutos se passaram até que eu fosse capaz de assimilar toda a situação, todo o dia anterior era um mero borrão em minha mente, apenas cenas esparsas restaram em minhas lembranças.
Eu não tinha ideia de como tínhamos sobrevivido aos ferimentos e o frio, mas me lembrava vagamente de Carl me desejando feliz aniversário, pouco antes de desmaiar. Quando pude entender o que estava acontecendo, imediatamente entrei em pânico com o estado de Carl na noite anterior. Levei alguns segundos procurando a lanterna pelo chão empoeirado com a angústia espremendo meus pulmões, e então finalmente pude ver o rosto do garoto, que além de estar ainda mais pálido que o normal, estava imóvel.
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Putrified Love - Carl Grimes
FanfictionSozinha, em meio a um mundo devastado por uma doença que transformou boa parte da população mundial em monstros comedores de carne humana, Clarisse vagava pela floresta como um fantasma, tomando coragem para atirar na própria cabeça. Porém, algo at...