Capítulo 37 - Algo além de flerte por esporte

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Algo além de flerte por esporte

Lucas

Eram mais de sete da noite quando eu voltei da cozinha com uma xícara enorme de café, eis que os vinte minutos de Fernando se transformaram em duas horas antes que eu me desse conta.

A casa declinada tinha renderizado bonitinho e eu estava feliz demais por isso, todavia, quando Fernando pediu uma "alteraçãozinha" no projeto do apartamento que Isaac e eu tínhamos feito para um amigo dele, eu precisei mexer na planta e, por consequência, tive que abrir o projeto 3D para alterar e agora estava renderizando de novo.

Não que eu me importasse tanto assim de fazer horas extras, mas eu realmente queria ir para casa porque aquele ditado de "mente vazia é oficina do diabo" caía como uma luva para mim — não porque eu estivesse fazendo algo errado tipo pensando em riscar um fósforo e colocar fogo na empresa, mas eu comecei a pensar demais. E pensar demais, para alguém que tinha os meus problemas, nunca era uma coisa boa.

Sei que, no fim, quem trouxe o assunto da pensão da minha mãe à tona fui eu, mas aquilo começou a ficar em looping na minha cabeça enquanto a barrinha do AutoCad me falava a porcentagem da renderização — e parecia que quanto mais eu queria que aquilo acabasse logo, mais demorava.

Eu odiava ficar pensando em como minha vida poderia ser diferente se eu não tivesse sido um erro.

Em como poderia ser diferente se meus pais não tivessem feito tantos planos que não me incluíam.

Aí eu abri o aplicativo do banco e olhei aquele dinheiro depositado na poupança.

Acho que eu nem sei explicar o quanto eu odiava aquele dinheiro, porque ele era resultado de tudo de ruim que tinha me acontecido: daquela ausência com a qual eu jamais me acostumava; daquele vazio horrível que sempre havia no meu peito; daquela vozinha na minha cabeça que dizia que tudo era culpa minha; que eu nunca seria bom o bastante; que eu só estragava tudo em que colocava a mão e que eu sempre machucaria qualquer um que me amasse porque eu simplesmente era fodido demais, cheio de espinhos demais.

Tinha acabado de sentar na minha mesa de novo, acreditando fielmente que as únicas pessoas que ainda estavam naquele prédio comigo eram Joana, da portaria, e os vampiros asiáticos do andar de cima — você sabe, porque eram vampiros com hábitos noturnos — quando Sandro me chamou e minha alma praticamente saiu do corpo porque eu não sabia que ele estava ali, mas vê-lo fez com que eu sorrisse instantaneamente.

— Oi — eu disse, dando um gole no meu café, que estava forte e amargo demais para os meus parâmetros, e ele ergueu uma sobrancelha para me encarar.

— Vai ficar aqui até tarde?

Bocejei antes de conseguir responder.

— Estou renderizando um projeto que o Fernando pediu para amanhã, então acho que uma meia hora? Talvez um pouco mais, porque o AutoCad sabe quando a gente precisa dele e provavelmente vai dar erro em 99% de novo. — Olhei para a tela de trabalho do AutoCad como se o programa fosse se sentir censurado pelo meu olhar semicerrado.

— Você já não fez horas extras demais essa semana? — perguntou Sandrinho, ajeitando os óculos no tronco do nariz. — Tem certeza que não pode fazer isso amanhã?

— Tenho e está tudo bem. Eu vou terminar isso aqui, ir pra casa, comer alguma coisa e dormir, então amanhã vou estar pronto para outra, embora eu espere que não tenha outra — afirmei para Sandro, que não caiu na minha tentativa de ser fofinho e charmoso. — É sério, pai, meu maior problema hoje é que tinha prometido para Gio que ia chegar e passear com o Adolfo, mas como não vou conseguir, talvez ele destrua a casa ou cometa um crime de ódio — gracejei, embora meio que fosse verdade.

A Bela e o GoldenOnde histórias criam vida. Descubra agora