Capítulo 6 - Com efeito ex tunc

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Com efeito ex tunc

Lucas

— Lu, o que é arquitetero? — Vivian perguntou enquanto penteava o cabelo da Barbie ou o que tinha sobrado dele depois do corte estilizado que Matheus tinha feito.

— Por que você não trouxe o seu cachorro? — Matheus emendou, fazendo um biquinho ao olhar para mim como se eu tivesse cometido um crime contra a humanidade. — Você pode me dar seu cachorro? Eu que vou cuidar!

— Por que você mora com uma menina que não é sua namorada? — Virgínia perguntou ao mesmo tempo, com um rastro cor-de-rosa de canetinha que ia da orelha ao nariz e eu torci para não ser permanente, porque um de nós estaria encrencado se fosse.

No caso eu, porque eu tinha vinte e um anos de vantagem para saber diferenciar o que era uma canetinha à base d'água que saía no banho de algo que demoraria quinze dias para sair da pele de uma criança.

Virgínia, Vivian e Matheus eram os três filhos da tia Helen e do seu marido por osmose (já que eles viviam juntos há anos, mas nunca tinham se casado), Pedro. Eles eram trigêmeos de cinco anos de idade e meus primos pimpolhos, mas aí aprenderam a falar e adoravam fazer isso ao mesmo tempo, especialmente quando eu estava em casa, porque eu era o primo que eles adoravam mas não viam com frequência o suficiente.

Mas, bem, quando eu estava em Santo Antônio do Pinhal para visitar nossos avós, eles faziam a festa comigo.

— É arquiteto, Vivi. É uma pessoa que constrói casas e prédios e... — Me estiquei para tirar a canetinha da mão de Virgínia antes que ela riscasse Matheus também, porque aquela carinha sapeca não me enganava nem um pouquinho. — Eu não tenho cachorro, é da Giovanna e sua mãe não iria gostar que eu te desse o Adolfo de presente — porque ele provavelmente te engoliria vivo se te visse, foi o que eu não disse para Matheus para não criar traumas desnecessários — e ela é só minha amiga. A gente pode morar com amigos, sabia?

Os três me olharam com aquelas carinhas confusas que eu tinha vontade de esmagar. Eles não eram idênticos, o que fazia com que eles se parecessem como irmãos se pareciam, sem ser cópias exatas uns dos outros.

Vivian tinha os olhos verdes do tio Pedro, Matheus o cabelo ruivo e as sardas e Virgínia era conhecida como mini-Lucas porque a gente dividia os olhos e cabelos castanhos e, aparentemente, a vocação para ser meio cachorro, já que ela tinha acabado de morder o braço de Matheus simplesmente porque sim e ele estava berrando como uma sirene.

Talvez ela se desse bem com Adolfo.

— Virgínia! — eu disse para ela, estreitando os olhos. — Não morde seu irmão!

Felizmente para o braço de Math que ela soltou depois de alguma relutância, ela estava sem os quatro dentes da frente, então sua gritaria tinha sido mais por estar sendo babado do que pela mordida em si.

Virgínia apenas riu com aquela carinha banguela de quem era o terror da professora da pré-escola e não se arrependia de nada.

Minha garota!

— Lulu — Vivian disse e eu quase abri a boca para dizer que eu era outra raça de cachorro e não um Lulu da Pomerânia, mas eu definitivamente não ia explicar para os meus primos que a) eu tinha um apelido de cachorro; b) eu não me importava com isso; c) não, eu não era tipo o Drácula e podia me transformar em um cachorro como o vampirão se transformava em um morcego e d) não, Matheus não podia passear comigo, a não ser que fosse ele usando o peitoral e eu segurando a guia —, preciso retocar sua maquiagem!

Bom, é.

Eu estava mesmo maquiado e acho pouco provável que fosse nos lugares certos, porque não acho que blush verde fosse uma tendência, mas era na minha bochecha que Vivi estava esfregando seu pincel cheio de pó colorido, retirado diretamente de um estojinho cor-de-rosa que denunciava que era feito para crianças.

A Bela e o GoldenOnde histórias criam vida. Descubra agora