Capítulo 47

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A ida até a cidade de Campos do Jordão foi tranquila. Eles foram em três carros. Fernanda e Pedro no carro dele, Donatella e Tobias com o filho em outro, e Angélica foi na companhia do pai. Como era cedo, a ruiva tinha dormido todo o caminho e Ramiro aproveitava para admirar e agradecer aos céus seus filhos estarem todos bem, com saúde, juntos. Para um aniversário, isso era muito mais do que ele poderia pedir. Inevitavelmente se lembrou de Ana.
Essa era uma viagem que eles costumavam fazer juntos antes dos filhos. Eram outros tempos, tempos de juventude e amor, que para ele não voltariam mais. E ele estava bem com isso, depois de muito tempo.
Ramiro chegou no hotel de luxo que sempre ficou com a esposa e parou o carro na entrada para o manobrista pegar. Tirou o cinto e olhou para a filha, levando a mão aos cabelos ruivos tão característicos que uma vez o atormentaram tanto. Hoje tinham ganhado outro significado. Angélica abriu os olhos devagar, se acostumando com o ambiente, se mexendo no banco e olhando para o pai com um sorriso.
— Chegamos, querida. — ele falou.
Desceram do carro, o tempo estava nublado e frio, como seu pai tinha dito que era. Ela nunca tinha estado ali, mas o lugar todo parecia um cenário de filme. Tudo era muito fora de sua realidade, e isso foi um leve baque a princípio. Ela não sabia se algum dia se acostumaria com essa realidade tão distinta da vida simples no campo que ela sempre tinha sonhado.
Fernanda, porém, já muito bem acostumada com tudo isso, puxou a irmã pela mão e junto com a cunhada, as três foram para a recepção pegar as chaves do quarto. Angélica ficaria em um quarto sozinha, os casais em um quarto só deles e Ramiro também sozinho. Levaram as malas para o quarto e trocariam de roupa para darem uma volta na cidade.
A ruiva se sentou na cama, o celular na mão e um sorriso no rosto. Hoje Miguel passaria o dia no shopping com Fabiana para comprarem algumas coisas para o bebê. Os dois ainda discutiam nomes e mais nomes, nunca chegando num consenso. Até sua opinião já tinham pedido, mas ela se recusou tomar partido na discussão, observando os dois debaterem como crianças.

Miguel tinha lhe mandado uma foto da mesa do café da manhã. Comia sozinho e dizia sentir sua falta. Angélica disse que tinha chegado bem e que mais tarde mandaria fotos do lugar. ''Queria estar aí com você'' ele disse, e ela sentiu o corpo esquentar com a tentação da proposta. ''Você seria útil para me esquentar nesse frio'' ela respondeu, rindo.
Depois que se trocou, todos desceram para se encontrar na entrada do hotel. Dessa vez em apenas dois carros, a família começou a passear pela cidade. Caminharam um pouco, olharam as lojas. Uma das lojas chamou sua atenção. Angélica se aproximou da vitrine, as roupas de bebê brilhavam para ela. Tinha que comprar alguma coisa para o enteado. Entrou com Donatella, e a esposa de Tobias ainda aproveitou para comprar alguma coisa para João.
Angélica então parou na frente de um vestido verde, simples, para uma criança de um ano mais ou menos. Donatella olhou para a ruiva, curiosa, se aproximou.
— Existe mais algum bebê que você queira presentear? — a mulher perguntou, assustando Angélica.
— Não, é que essas roupinhas são tão lindas... dá vontade de comprar todas...
Donatella sorriu e tocou o ombro da ruiva.
— Logo é sua vez, tenho certeza que Miguel não vai demorar muito para sugerir um filho de vocês.
Angélica riu sem graça, um misto de sentimentos se formando dentro dela com a ideia de ter filhos com Miguel. Lógico que queria, seria incrível gerar a prova viva do amor deles. Mas ela estava preparada para isso? Saberia ser uma boa mãe? Sabia que ao seu lado teria ótimas referências: Berenice, Zenaide e Donatella eram mães incríveis. Conselho não iria faltar.
Depois do almoço, a família se reuniu no chalé de Ramiro, que era uma espécie de casa realmente. Sempre querendo o melhor, o chefe da família obviamente escolheu o melhor quarto. Estavam todas perto da lareira, conversando. Pedro, Tobias, Fernanda e Ramiro jogavam cartas, Donatella brincava com João e Angélica estava em uma poltrona lendo um livro.
Sua mente longe dali, inevitavelmente. Miguel disse que daria notícias.

á eram quase seis da tarde e nada. O dia já anoitecia, e cada minuto que passava ela sentia algo ainda mais esquisito dentro de si.
Rosana abriu o último exame do dia. A paciente ruiva tinha a preocupado com a palidez, mas agora, olhando todos os valores de referências, suas suspeitas estavam confirmadas. Ela se levantou da cadeira e foi até a porta, colocando a cabeça para fora para chamar a atenção de sua assistente.
— Natália, pode ligar na mansão dos Viana para mim? Quero falar com Angélica. — ela sorriu, esperando.
Natália fez o pedido, mas quem atendeu foi Joana, informando que a família tinha ido viajar, mas que se fosse urgente ela poderia passar o número que quem a médica precisasse. Rosana pensou um pouco e suspirou.
— Pede o número da Angélica, é importante que eu passe algumas informações para ela.
Angélica estava tão aérea, que nem reparou que sua família combinava de jantar em um restaurante perto do hotel. Fernanda parou na sua frente e cruzou os braços, sorrindo.
— Se perdeu no livro, foi? — ela provocou. — Você está estranha.
Angélica suspirou, dando um sorriso nervoso.
— Miguel ainda não me ligou para me contar sobre seu dia. — ela falou, olhando para o telefone pela milésima vez.
Fernanda puxou a irmã pela mão.
— Relaxa, mana. Logo ele liga.
O celular de Angélica tocou no caminho para o quarto, a ruiva atendeu ansiosa ao ver o número desconhecido.
— Alô?
— Angélica? Oi, querida, aqui é a doutora Rosana.
Angélica sentiu o entusiasmo sumir, mas disfarçou. Entrou no quarto com Fernanda em seu pé. Se sentou na cama para falar com a médica.
— Boa noite, Dra. Rosana.
— Queria, estou te ligando para avisar que seu hemograma saiu.
— E está tudo bem? — ela perguntou nervosa.
Afinal, médicos ligavam para falar sobre exames de sangue?
— Eu diria que está tudo ótimo... mas temos que tratar sua anemia, em uma gravidez tudo tem que estar perfeito com a mãe e o bebê.
Angélica sentiu o coração parar, e olhou para Fernanda assustada.

— Parabéns, Angélica, você está gravida! — ouviu a médica repetir o que para ela já não fazia sentido. — Me surpreende você não ter notado, seus valores são semelhantes aos de uma mulher no terceiro mês de gestação.
— Eu... — Angélica começou a falar devagar, tentando raciocinar. — Eu... não reparei. Mas obrigada por avisar, Dra. Rosana.
Angélica desligou o telefone e se levantou da cama com rapidez, indo até o espelho que ficava no canto do quarto. Fernanda a olhou preocupada, se aproximando da irmã, nem se preocupando em fechar a porta do quarto.
— O que foi? O que ela queria?
A ruiva, porém, olhava para o seu corpo em êxtase. Levantou o moletom que usava, expor seu ventre. Levou a mão trêmula até a região. Se antes ela sentia que precisava pensar sobre o assunto, agora já era tarde demais. Estava feito. Ela estava grávida. E muito grávida. Como ela não tinha reparado? Foi inocente em associar todo o seu atraso menstrual ao estresse que vivia. Isso justificava o fogo que sentia por Miguel, justificava a emoção a flor da pele, o sono em excesso dos últimos dias.
Estava grávida.
Se permitiu sorrir, e olhou para Fernanda, que também ligou os pontos e já sorria para a irmã.
— Fernanda... estou grávida... — Angélica sussurrou com os olhos cheios d'água.
A loira abraçou a irmã com força. Parecia que as duas iam explodir de felicidade. Mas isso foi até Angélica ver que Pedro estava na porta com um olhar chocado e o telefone nas mãos. Sentiu o coração pesar, e a sua alegria ir para o ralo. Se afastou de Fernanda rapidamente e foi até o amigo.
— O que aconteceu? — ela perguntou, direta.
Mas ele não soube dizer.
Miguel não sabia se poderia ter evitado aquilo, mas o sentimento de culpa não saía dele de jeito nenhum. Eles tinham passado o dia no shopping, compraram várias coisas, conversaram sobre o futuro e como gostariam de criar o menino. Fabiana disse que gostaria de morar mais perto do campo, para ele crescer perto da natureza e Miguel até sugeriu que eles procurassem um sítio para ela.


A vida estava boa. Estava certo entre eles.
Tão certo que Fabiana passaria a noite no sítio, para eles arrumarem juntos o quartinho que Miguel e Angélica tinha preparado para quando recebessem o pequeno em casa. Eles saíram do shopping assim, combinando de se encontrarem no sítio. Cada um com seu carro. Miguel a seguiu, atento no tráfego ao redor dos dois.
Mas a atenção era uma via de mão dupla. E ele não pôde evitar o motorista bêbado que passou no farol vermelho quando a mão abriu para eles. Fabiana era o primeiro carro da fila, e por isso, o carro a sofrer o impacto em cheio. O bêbado fugiu, e Miguel desceu do carro em desespero até o carro da ex-namorada. Ela estava presa na ferragem, tinha os olhos abertos, mas a cabeça machucada fazia com que o sangue escorresse por seu rosto.
''Nosso filho, Miguel'' ela dizia em desespero e ele não sabia o que fazer. Segurou a mão dela enquanto a ambulância não chegava, e quando ela chegou, Fabiana já estava inconsciente. Agora ele estava aqui, na sala de espera da emergência, esperando uma notícia sequer. E nada. Já faziam três horas.
E nada

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