Capítulo 2

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Angélica era um jovem sonhadora. Isso não podia negar. Sempre foi, ainda que a vida destruísse seus sonhos pouco a pouco como um moinho. Ela se olhava no espelho do banheiro da amiga. Berenice estava em um dia de faxina, o filho dela estava na escola.

Suspirou, tocou seu rosto devagar. Era nova. Seus 23 anos iam embora aos poucos, mas ainda era nova. A vida sofrida a fazia parecer mais velha, mais madura, mais experiente. Experiência lhe faltava em muita coisa. Ela desviou o olhar daquela mulher que lhe dava vergonha. Não conseguia se olhar no espelho por muito tempo sem sentir nojo de si.

Fazia pouco tempo que ela começou a usar seu corpo como moeda de troca. 15 dias, para ser exato. Foi assim que conheceu Berenice. Em uma noite fria, depois de dormir na rua pelo terceiro dia seguido, após ser despejada no conjugado que morava, Angélica achou uma peruca loira no lixo e foi para um posto de gasolina procurar um caminhoneiro que pagasse pelo menos cinquenta reais para lhe usar.

A jovem sonhadora e virgem, que esperou seu príncipe encantado, estava se vendendo por cinquenta reais. No caminhão, porém, ela disse que só usava sua boca. O cliente, contrariado, aceitou. E depois de feito, lhe deu os tais cinquenta reais. Quando Angélica saiu da cabine, vomitou no gramado.

Se vendeu por cinquenta reais.

Berenice se aproximou dela quando viu que Angélica estava vomitando. Lhe perguntou se estava bem e queria uma água. Depois perguntou se era sua primeira vez. A ruiva apenas concordou. Ao contrário do que estava esperando, sentiu Berenice a abraçando e dizendo que ficaria tudo bem.

Como ficaria tudo bem?

Ela estava morando na rua, não conseguia emprego em lugar nenhum, não comia direito há dias. E ela despejou tudo isso na morena que a ajudava, despejou com raiva, com nojo e desespero. Quando acabou de falar tudo que estava entalado, esperou que a mulher fosse se afastar. Mas Berenice apenas sorriu em compreensão e disse: então você fica lá em casa.

E assim ela foi acolhida. Por uma estranha que nem sabia seu nome. Berenice a levou para casa, lhe deu banho, algumas roupas e comida. Disse que ela poderia ficar ali. Berenice, ou Furacão, como ela se apresentou no posto, morava com o filho de 7 anos, Caio. Se Angélica não tivesse certeza que Deus já tinha lhe abandonado faz tempo, poderia afirmar que Ele tinha colocado Berenice em sua vida.

No dia seguinte, bem alimentada e com uma boa noite de sono, ela saiu para procurar um emprego para que não tivesse que fazer aquela coisa nojenta do dia anterior. Mas a busca foi e vão, e naquela noite ela saiu com Berenice para ver se conseguia uns trocados para ajudar a nova amiga com as despesas. Furacão sabia, porém, que o lugar de Angélica não era ali naquela vida. Nem o seu era, só estava ali porque não conseguia um emprego melhor e ter um filho pequeno gerava gastos. Ela tentou convencer a ruiva a ficar em casa, mas foi em vão, Angélica estava decidida.

Em derrota, Furacão então lhe deu uma peruca loira que tinha lavado. Ela disse que os homens gostavam mais das loiras mesmo. Angélica pegou aquilo e colocou. Se olhou no espelho e respirou fundo. Poderosa, aquele seria seu nome.

E naquela noite fria, Poderosa ainda não tinha coragem de entregar sua virgindade assim. E assim usou sua boca. Com nojo, com lagrimas nos olhos. Mas conseguiu o dinheiro que precisava para ajudar com os gastos com comida da semana.

Como na noite anterior, vomitou. Era uma tentativa desesperada de tentar tirar essa alma podre que tomava conta dela. Não conseguiu.

E dia após dia ela ia naquele ritmo, depois de 7 dias já não vomitava mais. Depois do oitavo dia, tomou uma pose mais debochada no posto, e na noite anterior, seu décimo quinto dia, ela considerou entregar seu corpo a isso por completo. Se venderia por inteiro mesmo, já que aparentemente era nisso que era boa.

Chão de GizOnde histórias criam vida. Descubra agora