33- Eu Sei

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Corri atrás de Camila pelo corredor e me joguei sobre a porta do elevador antes que ela tivesse a chance de abri-la. Eu pedia para que me ouvisse, para que não fosse embora daquela maneira. Que inferno! Magoá-la era exatamente o que não queria e agora isso.

Um profundo ódio queimava em meu peito por causa daquela situação, ainda mais depois do choque de realidade que havia acabado de ter.

– O que você quer que eu escute? Pelo amor de Deus, me deixa ir embora. – Me disse ela, nitidamente puta.

– Não é o que parece, ela é a minha ex...

– Ah, então pronto! Não precisa dizer mais nada, só me deixa ir embora e vai lá ficar com a sua ex.

– Camila, por favor, me escuta, eu não passei a noite com ela e muito menos a manhã.

– E por que eu deveria acreditar em você? Na verdade não era nem pra eu estar chateada, não é assim? Até porque esse tempo todo quem teve crise quanto a nós fui eu. É óbvio que tinha que ter um motivo pra ser só eu! Agora eu to realmente me perguntando se não viajei demais no que tava rolando entre a gente... eu devo ser muito idiota mesmo.

Camila parecia muito chateada, muito mesmo, e eu não sabia o que dizer, ou o que fazer, pra conseguir fazê-la entender que não era nada daquilo que havia parecido. Como fazer alguém acreditar que sua ex é louca e que acabou de armar uma situação daquelas? Será que ela acreditaria em mim? Enfim, de qualquer forma eu tinha que tentar.

– Pelo amor de Deus, a Beatriz é louca, eu não passei a noite com ela, ela deve ter te visto no corredor e se jogou em cima de mim pra parecer justamente o que pareceu.

– Mesmo assim, Letícia, você me mandou aquelas mensagens hoje cedo, aí eu chego aqui e tem a sua ex te beijando? Porque, assim, você não a empurrou, ou se afastou, mas ela estava aqui, dentro do apartamento... sinceramente, eu é que devo ser muito idiota, porque acreditei que o Universo tinha me trago você depois de tudo que passei e agora eu vejo isso, então é isso, desculpa qualquer coisa e só me deixa ir embora, por favor.

Ela estava avermelhada. Seus olhos estavam submersos. Muitas lágrimas escorriam por seu rosto. "Acreditei que o Universo tinha me trago você depois de tudo que passei". Afinal de contas, o que havia acontecido com essa menina de tão grave pra que houvesse tanto mistério envolvendo isso?

– Camila! Por favor, pra você entender eu teria que te explicar toda a história e não é tão simples falar sobre isso assim, aqui e agora, desse jeito e dessa maneira.

– Não é tão simples?! – Retrucou, com raiva. – Você quer saber o que não é tão simples? Eu te digo então... eu sou viúva! Eu vi, há seis meses, a minha mulher morrer atropelada, quase no mesmo lugar onde eu salvei a sua vida! – Pausa, silêncio e lágrimas. – Você acha que só você se desarmou naquele momento? Você acha que fiquei bem depois disso?

Não que fossem menores, mas senti meus problemas tão insignificantes perto do dela. Que loucura, garota relativamente nova, batalhadora, luta pra pagar a própria faculdade, perde a esposa num acidente ao qual era presenciou e ainda consegue manter um sorriso no rosto. Meus problemas não são menores, são apenas diferentes, mas pra mim foi impossível não me sentir em choque com o que havia acabado de ouvir.

Eu achava que ela era a luz que me tirava da escuridão, mas, talvez, essa era a minha posição em sua vida também... bom, pelo que havia dito, parecia que era isso mesmo. "Acreditei que o Universo tinha me trago você depois de tudo que passei". Eu cheguei em sua vida da forma que ela perdeu alguém a quem amava... situação complicada.

Agora ficava claro pra mim o porquê de tamanha conexão, já que quase fui atropelada por causa da mensagem de Beatriz, que ativava gatilhos dentro de mim e, aquela situação que, por si só, ativava gatilhos dentro dela... eu era muito burra, ou, no mínimo, egocêntrica demais.

– Eu sinto muito. – Foi o máximo que consegui dizer enquanto ainda me sentia em choque.

Fizemos silêncio e não entendo o porquê fazemos esse tipo de coisa, porque, sinceramente, pra mim, seria muito mais fácil abrir logo toda a verdade, jogar tudo no ventilador e pronto, isso de ambas as partes, mas essas travas que existem parecem só nos prejudicar ao longo da vida.

Mantendo os olhos fixos no chão, Camila secou os olhos e disse:

– Eu preciso muito ir embora.

Nitidamente ela não iria me ouvir, até porque o que estava causando aquela emoção com certeza não era apenas por causa do que havia acabado de acontecer, e digo isso não pra diminuir o ocorrido, mas porque acredito que outro conflitos, principalmente sobre ter falado de algo difícil e atitudes que tenha tido comigo por causa disso, também estivessem gritando dentro de sua mente.

Me aproximei o máximo que pude, até mesmo pra não ser invasiva, já que nem estava mais olhando pro meu rosto, e disse:

– Hoje entendi coisas que não estava conseguindo entender... entendi que sofri um relacionamento abusivo e fui condicionada a ter medo de me relacionar com outras pessoas, mas entendi também que o que sinto por você é de verdade, mesmo que tenha nascido em tão pouco tempo. Eu não vou te impedir de ir, mas eu queria que soubesse que ante ontem eu sonhei com você e acordei no exato momento em que dizia que te amava.

– Eu não consigo lidar com isso agora. – Sussurrou ela.

– Eu sei. – Sussurrei. – Não precisa me responder, eu só precisava que você soubesse. Acredito que quando algo tem que acontecer, ele simplesmente acontece, então que o destino, Deus, ou Universo dirija nossos caminhos.

Soltei a porta do elevador e, ainda sem olhar pra mim, Camila a puxou, entrou e desceu. Eu ainda estava ali parada, olhando ela partir, quando o segundo elevador se abriu e vi Lúcia surgir por ele toda perua. Ela olhou pra Beatriz, que estava na porta assistindo tudo, olhou pra mim, que estava silenciosamente em lágrimas, e perguntou:

– Ok, o que foi que eu perdi?

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