16- Foi um prazer

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Nós riamos enquanto falávamos de assuntos superficiais e aquilo era tão bom que me fazia realmente esquecer de tudo ao redor. Seu sorriso era tão cheio de vida, ele era tão iluminado, que àquela altura nem mais me lembrava da mensagem que havia recebido.

– Vai começar a anoitecer, é melhor a gente ir embora. – Me disse ela parecendo reflexiva.

Camila estava com suas coisas em mãos, não havia porque voltar comigo pro apartamento, então senti que aquele era um momento de despedida e meu problema foi justamente por causa do que aquele pensamento me fazia sentir.

– Amanhã você trabalha? – Perguntei.

– Infelizmente, sim. Tenho faculdade também, inclusive. – Brincou sorrindo. – Acho que preciso voltar pro "mundo real".

Em sua última frase aquele seu largo sorriso se desfez. Eu queria muito poder fazer alguma coisa a respeito, mas o que poderia ser? Como dizer para que não fosse? Como dizer para que passasse mais um dia daqueles ao meu lado? Quem era eu pra ter tal audácia, ou receber esse tipo de presente?

Ficamos em silêncio e imóveis, embora fosse óbvio que deveríamos estar levantando e começando nossa caminhada de volta, cada uma em direção a seus próprios destinos, mas não era o que estávamos fazendo, pelo contrário, continuamos, ambas, imóveis e em silêncio, como se estivéssemos à espera de um milagre.

Estar com Camila me fazia esquecer de todos os meus problemas, tanto do passado, quanto do presente, pois ali eu era apenas eu e mais ninguém. Não queria que terminasse, não queria me despedir, não queria dizer "tchau". Eu tinha dinheiro pra pedir que ela ficasse e isso passou em minha mente, mas não considerei que fosse de bom tom, por melhor que fosse a minha intenção.

– Posso te levar em casa? – Perguntei.

– Não sei o que fazer? – Disse ela em seguida, sem me olhar e sem me responder, parecendo aquela frase mais com um desabafo.

– Como assim?

Camila me olhou, com um olhar confuso, e disse:

– Não queria ir embora.

Sorriu, um sorriso frouxo de quem se esforça pra disfarçar o que seus olhos revelam. Minha vontade era beijá-la, mas não podia, afinal era o que ela havia pedido, que fossemos apenas amigas e, por mais safada que eu fosse, também sempre fui uma pessoa que, ao menos, tenta respeitar seus limites... no caso, o limite de quem o pede.

– Pra te ser sincera, também não queria que você fosse. – Assumi, séria, olhando em seus olhos.

– Eu preciso ir.

– Posso te levar em casa? – Perguntei novamente.

– Não precisa, ainda tá cedo.

– Eu insisto. – Sorri, do jeito que deu.

Camila cedeu e me permitiu, então levantamos enquanto eu chamava um Uber que nos levássemos ao bairro da Abolição, localizado na Zona Norte do Rio. Durante o trajeto nós não conversamos, mas ela se sentou no meio, bem ao meu lado e deitou sua cabeça no meu ombro, isso enquanto abraçava meu braço, o que estava mais próximo a ela.

Por um momento, ainda em silêncio durante o trajeto, senti sua dedos alisarem delicadamente aquele meu antebraço, ao qual ela abraçava. Meu corpo inteiro se contorcia àquele estimulo, por mais inofensivo que parecesse ser. Era um carinho, era apenas isso e nada mais.

Seus dedos deslizaram por meu antebraço até sua mão repousar sobre a minha. Não entrelaçamos os dedos, ficamos apenas ali, uma sobre a outra, na sensação de um toque, no sentir de nossas peles, em meio ao nosso silêncio e a música baixa que vinha do rádio do carro.

Chegamos ao nosso destino e pedi ao motorista cinco minutos, pois já havia incluído o meu destino na mesma corrida, mas queria antes me despedir. Saímos então do carro, nos olhamos frente a frente, sorrimos, ambas, um sorriso frouxo, e eu disse:

– Foi um prazer passar o dia com você, sua alegria é contagiante.

Ela me abraçou e, ao pé do ouvido, disse:

– Existem sorrisos que escondem grandes tristezas. – Beijou meu rosto e, ainda em meus braços, me olhou e completou. – Foi um enorme prazer pra mim também, paulista. Cuidado na volta, fica atenta e, se puder, me avisa quando chegar.

Confirmei com a cabeça, então nos abraçamos novamente, como se aquele pudesse ser nosso último abraço. Havia tanta emoção envolvida que nem sei explicar, até porque não entendia de onde vinda tudo aquilo em tão pouco tempo, mas sentia que nossa conexão era incomum, embora real.

Entrei no carro e só parti depois de vê-la entrar em seu humilde prédio, somente depois disso foi que demos a partida em direção ao meu destino, o qual fiz em silêncio, até porque havia tanta coisa sendo digerida que nem conseguiria ser simpática naquele momento... eu só queria chegar logo e surtar em paz.

Já no apartamento, mandei uma mensagem avisando que havia chegado, conforme Camila me havia pedido. Ela me deu boa noite, me enviando inclusive um coração, e eu fiz o mesmo, embora soubesse que aquela noite seria a mais atípica dos últimos meses... certamente seria.

Fui até a geladeira, peguei o vinho, coloquei um pouco em uma taça, então fui pra sala e me sentei no chão, próxima a enorme janela, a qual tinha uma vista fantástica. Em silêncio eu bebia, um gole por vez, enquanto olhava para fora sem nada realmente estar enxergando, pois minha mente estava cheia de imagens, memórias... lembranças.

– Lucia? Então... tenho muita coisa pra te contar. – Enviei.

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LGBT - Quando AconteceOnde histórias criam vida. Descubra agora