10- Não Precisa

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"Estou aqui fora, na calçada da praia". – Enviei para Camila por volta das 16h20, que foi o exato momento em que cheguei próxima ao restaurante onde ela trabalhava. Como havia avisado, fiquei do outro lado da avenida, próximo à areia, pois ali havia um banco público de concreto onde me sentei e fiquei esperando.

Não demorou muito e logo a avistei atravessando e vindo em minha direção. Vestida de forma casual e compatível com a temperatura local, carregava uma bolsa transversal e, ainda de longe, já vinha sorrindo, embora também parecesse estar cansada. Me levantei e também sorria, enquanto a olhava com meus olhos cerrados.

– Vem comigo, paulista! – Brincou ela, ao se aproximar, enquanto me puxava por uma das mãos.

– Olha o preconceito! – Brinquei.

– Assim diz aquela que achava "clichê" vir pro Rio. – Sorriu olhando pra trás pra me ver.

– Olha só, não me faz correr não porque não tenho a sua idade.

Ela riu e disse:

– Falando assim até parece que já está idosa!

– Já tenho meus trinta e alguns anos, me respeita. – Brinquei, já conseguindo caminhar ao seu lado.

– Então ainda é uma garotinha. – Sorriu pra mim.

Ela tinha o incrível poder de sorrir não só com os lábios, mas também com os olhos e isso a deixava ainda mais leve e bonita. Caminhamos um bom pedaço até uma grande pedra, bastante conhecida, chamada de Pedra do Arpoador. Durante o caminho, Camila não soltou minha mão, mas não que tivéssemos simplesmente andado de mãos dadas, não, ela dobrou seu braço e manteve o meu por dentro, enquanto me segurava, dando a entender que o fazia para me fazer andar mais rápido.

– Você vai me fazer subir isso tudo mesmo?

– Para de preguiça. Você não veio conhecer o Rio? Então vou te mostrar uma de nossas tradições, mas não é que todos os cariocas já tenham feito isso na vida, não, só acho legal e acho que você tem cara de que vai gostar.

Revirei os olhos enquanto sorria e disse:

– Ta bom então, vamos subir.

Quando chegamos lá em cima, o que já eram quase 17h30, realmente haviam várias pessoas sentadas, muitos casais e muitos grupos de amigos também. Camila me puxou pra um espaço entre as pessoas, se sentou e me disse para sentar ao seu lado. Eu ainda não estava entendendo o que estávamos fazendo ali, mas logo que me sentei ela começou a me contar, dizendo:

– Muita gente costuma vir aqui nesse horário pra assistir ao por do sol. Parece bobo, mas nós fazemos isso. – Riu. – Quando o sol termina de se por todos batem palmas, como se fosse o final de um espetáculo.

– Parece um programa bem romântico esse. – Falei olhando para frente, mas terminei olhando-a nos olhos.

– Sim, muitos casais realmente vem aqui porque é... enfim, porque é romântico. Por falar nisso, você tem ninguém, – Sorriu. – sei lá, você namora, ou é casada?

O tipo de pergunta inevitável, mas que te causa um certo arrepio, ou gatilho, não sei, hoje em dia se fala em gatilhos, então talvez essa palavra seja erfeita pra exemplificar, eu acho. Acho? Não sei. Enfim. Fiquei reflexiva por um segundo enquanto olhava-a nos olhos, até que respondi, dizendo:

– Não tenho ninguém... e você? – Sorri.

Meu sorriso era mais frouxo do que estava sendo e talvez Camila tenha percebido isso, mas não comentou. Sobre a minha pergunta, ela olhou para frente enquanto sorria e me respondia, dizendo:

– Ah! Também não.

– Não senti tanta firmeza em sua resposta, mocinha. – Brinquei tentando descontrair.

Ela me olhou de um jeito tão fofo e diferente que mal sei explicar, só sei que, como sua mão estava apoiada no chão entre nós, quando virou seu rosto em minha direção, seu queixo se juntou ao seu ombro enquanto ela sorria de uma forma tímida e isso a deixou extremamente mais linda do que já era.

– É que terminei um relacionamento há pouco tempo, – Respondeu ela. – mas definitivamente não tenho ninguém hoje em dia, meu único relacionamento é com a faculdade. – Riu. – Relacionamento abusivo, diga-se de passagem.

– Você faz faculdade de quê? – Perguntei realmente interessada.

– Direito. E você, o que a "senhora" faz? – Brincou.

Por alguma razão eu simplesmente não queria falar a respeito, o que vindo de mim era algo surpreendente, pois sempre senti muito orgulho do que faço e sei que mereço, mas também sei que muitas das vezes o fiz com tom de ostentação e ali isso não cabia, na verdade nem perto disso.

– Eu trabalho no administrativo de uma empresa de São Paulo. – Respondi, com meia verdade, mas respondi.

Nesse meio tempo o sol vinha se ponto e começamos a observá-lo. De fato aquela cena era um espetáculo a ser admirado. Que vista maravilhosa e que cores lindas do por do sol, que, ao se esconder atrás das montanhas, recebeu, merecidamente, a sua salva de palmas. Me sentia fazendo uma lavagem cerebral e sabia que precisava de tudo que estava vivenciando, meu psicólogo que o diga.

Aquela era uma cena de trazer paz a qualquer coração e certamente ficará registrada em minha memória pro resto da minha vida, pois ela foi perfeita. Eu tinha duas vistas maravilhosas, a da natureza, e a da beleza dela ao meu lado, que olhava para a paisagem como quem admira uma poesia.

– Obrigada. – Disse eu para Camila.

Camila me olhou sorrindo, inclusive com os olhos e, após um segundo de silencio, disse:

– Não precisa.


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LGBT - Quando AconteceOnde histórias criam vida. Descubra agora