Percy
- Bom, tem algo que quer compartilhar?
Desligo o carro estacionado em frente à casa de Annabeth Chase. Marina me olha confusa do banco do carona.- Tipo o que?
- Tipo porque uma hora você está jogando o chinelo do garoto pela janela e em outra está combinando de visitar a casa dele.
Observo minha filha desviar o olhar e agarrar a alça da mochila com a ponta dos dedos. É engraçado o quanto você pode conhecer alguém melhor do que a si mesmo e, ao mesmo tempo, ser constantemente surpreendido por ela. Ela suspira.- Não tem nada demais. Nós só queremos apressar as coisas, sabe? Se nos dermos bem logo, isso tudo pode acabar.
- Mas se estão se dando bem, não estaria com pressa de acabar.
- Não estamos! É só... - ela agora gesticula, a mochila solta no colo, sobrancelhas expressivas acompanhando todos os sentimentos que está tendo dificuldade em colocar em palavras. - Eu sei que o que fizemos aquele dia foi errado. Foi desrespeitoso e potencialmente perigoso. Eu entendo a punição disso. Mas me sentiria melhor se pudesse resolver logo tudo.
De repente, não estou mais sorrindo.
- Marina, não estou punindo você. Nada do que eu faço é para punir você. Às vezes, peço que faça coisas que sei que não quer fazer, mas é sempre porque preciso que entenda ou aprenda algo com aquilo. Sei que nem sempre tomo as decisões mais certas, mas me esforço pra isso. E nunca, nunca quero que tenha a sensação de que estou te punindo por algo. Você é livre para cometer seus erros, filha. O meu trabalho é só tentar te ajudar a perceber alguns deles e pode tomar decisões com mais discernimento. Nada que você jamais fizer de errado vai me fazer querer te punir. Só tenho amor por você. Entende o que estou te dizendo?
Os olhos avelã da pessoa que mais amo no mundo me encaram de volta, a expressão conflituosa, como se quisesse ouvir aquilo. Ou talvez quisesse acreditar. Marina sempre se cobrou demais e eu faço o que posso para diminuir essa cobrança nela. Eu sei de onde vem, ou pelo menos sei de partes do que a impulsiona a acreditar nisso, acreditar que precisa fazer mais, se esforçar mais, se provar mais. Nunca vou esquecer da carinha que Marina fez quando contei a ela que Calipso não viria para assistir a sua apresentação de dança na escolinha. Marina tinha pouco mais de seis anos. A garotinha em seu tutu roxo segurou as lágrimas em seus olhos brilhantes e disse que não tinha importância, afinal, ela estava na fileira do fundo e só participava um pouquinho mesmo. Desde então, Marina sempre fez questão de trazer os boletins com notas A para casa, e mandar foto deles para a mãe.
- Entendo, pai.
- Está mesmo tão ruim o clube?
Ela parece pensar um pouco.
- Até que não. Estou gostando de fotografia. E o David... é o David.
Sorrio com a frase dela, entendendo em partes.- Sabe que tenho muito orgulho de você, não sabe? Todo dia. - O menor sorrisinho aparece no rosto da minha menina, enquanto ela assente. - Vem cá.
Puxo a melhor ser humaninha do mundo para um abraço limitado pelo espaço do carro. Acho que nunca tive tanto medo na vida do que quando Calipso me contou que estava grávida. Por mais que eu tenha Sally como modelo de melhor mãe do mundo, aquela insegurança de que talvez eu puxasse mais meu pai do que ela no quesito paternidade me tomou e nunca foi embora por completo. Às vezes não consigo dormir pensando se eu deveria ter falado algo diferente, ou se Marina sente falta de algo. O que sei que puxei de minha mãe é a mania de me culpar por algo de outra pessoa, como ela se culpa por meu pai ter ido embora e como eu me culpo por Calipso. Mas também sei que puxei a habilidade de fazer minha filha se sentir amada, como Sally sempre me fez.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Take it Lightly | au Percabeth
RomanceHá maneiras melhores de se conhecer do que ser chamado na diretoria porque sua filha adolescente arrumou confusão com o filho de outra pessoa. Mas quando se olha a vida com leveza, essa não é a pior das maneiras. Postagem todo sábado 😊