2. CATARSE

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Catarse é a libertação de si mesmo, um pássaro que estava preso, emudecido; agora canta e voa!
(Aimara Schindler)
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Eu era o mais miserável dos homens e não digo em termos financeiros. Neste quesito as coisas iam muito bem, mas na manutenção do meu caráter eu me sentia o pior dos homens. Meu sobrenome era culpa e ela tinha um motivo: Cici Muller.

Eram três anos completamente apaixonado por esta mulher. Nesse tempo tive uma vida que muitos classificariam como perfeita. Só que mesmo casado, com dois filhos muito desejados, eu não conseguia esquecê-la.

Todas as noites, secretamente, eu lembrava dela e do seu sorriso. Me escondia na sala e rolava todas as fotos do instagram para ver aquele sorriso. Só de olhar para ele eu ficava feliz. Esse era o meu segredo mais precioso: amá-la.

Nos conhecemos no camarim de um teatro. Eu aguardando um amigo, que se apresentava aquela noite. Ela indo cumprimentá-lo pela inquestionável qualidade da sua atuação. Sendo um monólogo, o mérito era só dele, assim como o camarim.

De cabeça baixa eu tentava afastar o sono, eram 23h. A peça tinha sido incrível, mas não via a hora de cumprimentar o Otto e ir embora para casa. Ela entrou pela porta num rompante, quase tive um colapso nervoso de tanto susto que levei. Nunca pude imaginar que alguém iria entrar ali causando tanto impacto.

- Oi! - Ela sorriu e ruborizou. Talvez pelo tamanho barulho que fez para entrar no cômodo. - Desculpa, não sabia que tinha gente aqui, te assustei?

Eu ri. Era óbvio que tinha me assustado, eu quase caí da cadeira, nem tive tempo de disfarçar. Fiquei no meio do caminho entre estar sentado e em pé. Quando me equilibrei decidi ficar de pé.

- Só um pouco, mas tá tudo bem, eu me recupero. - Nós dois olhamos para o chão, sem ter o que dizer. Fiz menção de me apresentar, ela não entendeu o gesto e também não precisávamos. Nós nos conhecíamos, só por telas, mas mesmo assim dispensava apresentações.

Hoje enxergo a ironia do destino. Um só ator para usar o camarim naquele dia, somente dois amigos iam cumprimentá-lo longe dos holofotes. Os mais discretos, odiavam paparazzi. Eu e ela. Um atraso de 2 horas por parte do ator fez com que fossemos quase obrigados a trocar algumas palavras. Foi suficiente para eu ficar encantado. Não! Encantado não era a palavra. Eu fiquei fascinado. Um tempo depois percebi que fiquei inevitavelmente apaixonado.

- Eu vou embora. - Ela disse por fim. - Posso cumprimentar o Otto em outro momento.

- Não se sinta obrigada por mim. Posso esperar lá fora.

- De jeito nenhum. Vou entrar aqui assim e ainda te expulso? Não é de bom tom. - Ela sorriu e mordeu levemente os lábios. Eu sem querer acompanhei o movimento, o contorno da boca envolvida por batom vermelho.

- Então espera, ele já deve estar terminando. - Ela não disse nada, mas não se mexeu. Um silêncio tomou conta do ambiente mais uma vez. Eu não sabia como agir, mas resolvi quebrá-lo. Quando eu fico nervoso ou sem jeito, eu falo.

- Eu vi o seu último filme. - Era verdade, mas seu rosto não escondeu a surpresa.

- Viu? - Ela perguntou.

- Por que a surpresa?

- Por nada. Não imaginei que comédia romântica fosse seu estilo. Geralmente atores abominam clichês cinematográficos. - Ela ficou pensativa. - A não ser quando nós mesmos estamos no elenco.

- Por que não? São os melhores. Nos permitem sonhar... E não era um clichê. - De repente eu virei o defensor dos filmes de romance.

- Realmente, eu acho muito esnobe não apreciar uma boa comédia romântica. Você não é esnobe, é? Ou é e está dizendo que viu só pra me agradar? - Ela riu e mais uma vez o silêncio nos acompanhou.

O AMOR DESPERTAOnde histórias criam vida. Descubra agora