9. SILÊNCIO

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O vocabulário do amor é restrito e repetitivo, porque a sua melhor expressão é o silêncio. Mas é deste silêncio que nasce todo o vocabulário do mundo.
(Vergílio Ferreira)
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Desembarcamos em Recife e fiquei pensando o que aquela viagem significava na minha vida. A Cici sorria e tagarelava ao meu lado enquanto esperávamos a porta da aeronave abrir. O humor dela mudou completamente e eu podia apostar que estava feliz.

Eu gostava da companhia dela, mas a terceira guerra mundial seria lá em casa quando a Amanda descobrisse que ela estava na série e na viagem. Pior, que faríamos par romântico. Eu ainda não tinha tido coragem de contar. Até porque nem eu mesmo tinha conseguido lidar com essa informação.

Liguei o celular. 20 chamadas não atendidas da Amanda. Meu coração disparou. As crianças.

Amanda. Fala o que aconteceu? Por que esse desespero? Eu estava no vôo. - Eu implorei, acho que eu estava quase chorando.

O QUE ACONTECEU, LEO? - Ela gritou do outro lado da linha. - Me diz! Quem está aí grudadinha em você nessa viagem? - Nesse momento eu entendi tudo. Ela descobriu. - Aquela piranha da Cici Muller.

Não fala assim, Amanda. Já te expliquei mil vezes isso. E agora é o meu trabalho. - Tentei disfarçar do lado da Cici. Estávamos lado a lado no corredor.

Seu trabalho? Tá bom, Leo. Se você não tivesse me traído naquela noite no teatro eu até acreditaria. - Ela cismou com essa história. - Você nunca podia ter aceitado esse papel sem falar comigo. Nunca!

Olha, mais tarde conversamos. Já te expliquei que nada aconteceu naquela noite. Passaram-se anos e você não entende. - Suspirei cansado. - Olha, eu acabei de desembarcar. Preciso desligar. Não bebe tá? Enquanto eu estiver fora... - Eu pedi preocupado. Ela me xingou de tudo quanto era nome. Desliguei. Não ia ficar ouvindo aquilo.

Eu tive que tentar colocar um pouco de juízo na cabeça dela. Quando a gente brigava ela bebia muito depois, pra esquecer os problemas. Eu me preocupava com as crianças vendo a mãe naquele estado. Comecei a me sentir culpado e a achar que ela tinha razão.

- Leo, tá tudo bem? - A Cici me chamou. - Você atendeu essa ligação e ficou com uma cara...

- Ah problemas de família... - Não sei o porquê, mas eu não conseguia mentir pra ela.

- Posso ajudar? - Ela perguntou repetindo nossa conversa pela manhã, mas a assistente do Mário, Bia, começou a nos passar as coordenadas para pegar as malas e embarcar na van que nos levaria até Sertânia.

- Gente, são três vans. Mulheres em uma, homens na outra e os equipamentos e quem sobrar vão na última, ok? - Ela explicou.

Fomos separados e o meu sentimento era de uma criança. Fiquei triste. Eu queria ir perto dela. Pegamos as malas em silêncio e seguimos a equipe até a porta principal.

Me enfiei na última van, junto com os equipamentos. Eu não estava afim de socializar, a não ser que fosse com ela. Quando a van ia arrancar, bateram na porta do carona, pedindo pra segurar. Que droga! Eu teria companhia. Já bastava um monte de tralhas nas minhas costas, ainda ia ter que dividir a van. Abriram a porta de correr. Era ela. Minha raiva se dissipou em um segundo.

- Leo, me disseram que tava aqui. - Ela veio atrás de mim? Não entendi.

- Tô. - Eu respondi monossilábico.

- Ainda bem que tá aqui sozinho... - Quando ela falou, confesso que meus pensamentos fluíram, imaginando nós dois naquela van. Fiquei com calor de repente. Essa proximidade só deixava mais evidente o quanto eu a desejava. Fiquei olhando fixamente pra ela. - Por que tá me olhando assim? - Eu balancei a cabeça.

O AMOR DESPERTAOnde histórias criam vida. Descubra agora