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O SEGREDO DO OCEANO

JAEHYUN

     Eu finalmente fico sozinho no vagão, quando os últimos passageiros descem na estação.

Enquanto cruzo Ulsan para ir à universidade, a cidade vertical passeia sobre os meus olhos, mas ao invés de olhar, encosto a cabeça na janela.

Abro um bocejo longo e preguiçoso.

Já é a terceira noite dessa semana que sou acometido por uma insônia terrível. Ainda que tome um banho relaxante e deite cedo, não consigo dormir bem. Como uma criança que anseia a ida ao parque no dia seguinte, sinto como se meu corpo estivesse esperando algo por mim.

Por algum milagre, o ruído dos trilhos se torna um barulho tranquilizante, que faz o sono me abraçar.

E eu, claro, não nego a vontade de fechar os olhos. Cedo facilmente e adormeço.

Mas me arrependo.

Não demora até que eu tenha aquele pesadelo que se repete de tempos em tempos.

Não posso mais acordar. Estou sem saída.

É o mesmo sonho ruim, onde estou preso nos restos de um navio que naufragou. Os escombros me deixam enterrado, sufocado, mal posso me mexer. Não vai demorar até que essa parte também afunde e se encha de água salgada, para que eu morra afogado.

O céu negro torna tudo muito escuro e desesperador. Sinto o cheiro enérgico do sangue dos que foram esmagados pelos destroços. Posso ouvir pessoas berrando por suas vidas, mas não dou um pio sequer.

Pode parecer que estou aceitando a morte, mas por dentro eu sinto todo o terror me atormentar. E isso piora quando a água gelada alcança a minha cintura, subindo rapidamente para altura do peito.

E aquele momento chega.

Quando o mar está prestes a não me deixar mais escapar, puxo todo o ar que posso pela boca e fecho os olhos. Consigo empurrar as ruínas que me soterraram vivo, mas sei que não vou durar por muito tempo. Todo o resto está afundando junto comigo para esse abismo negro e sem fim.

Mas até que a morte chegue, eu não cedo. Continuo lutando para sobreviver e não respiro fundo até que meu peito passe a arder. Até que se torne agonizante não respirar a água, e acabar me afogando.

Então eu acordo.

Num salto, empurro meu corpo para trás. Zonzo, olho ao redor e lembro que já estou na sala-auditório da faculdade, sentado no meu lugar.

Acho que acabei adormecendo de novo depois que cheguei aqui.

Atraio poucos olhares, todos de julgamento, mas os ignoro.

Ainda que esse pesadelo seja recorrente, fico perturbado só de lembrar do quão vivido tudo parecia. E do terror de morrer sem conseguir respirar.

Tento voltar ao agora, e mudo a página do livro aberto com uma mão, enquanto passo a outra sobre meu cabelo.

Youngho é o primeiro a notar o meu mal-estar, mas abre um sorriso simples e volta sua atenção para o tablet pessoal por onde estuda.

A professora encerrou a sua aula pouco tempo depois e liberou a todos. Ela não chamou a minha atenção, mas eu não esperava que o fizesse. É comum ver estudantes atarefados e exaustos não resistindo ao conforto de uma carteira para dormir. Hoje, sou um deles.

Ainda meio atordoado, juntei meu material lentamente, sem a menor pressa.

— Dormindo na aula de novo? Que mal exemplo... — Youngho comenta ao levantar.

O Segredo do Oceano •  JaeWooOnde histórias criam vida. Descubra agora