Vinte e Quatro

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"Minha Amélia,

Ter encontrado o amor da sua vida faz parecer que os olhos não estão preparados. Ouvir o amor da sua vida faz parecer que os ouvidos são surdos para todo o resto e beijar o amor da sua vida é de dar inveja a qualquer poeta do romantismo pós-moderno. Claro que me dá medo. Dá medo porque não tem o mesmo frescor de antes, mas você tem. Dá medo porque eu não acho que sou tão inteligente quanto você achou que eu era no primeiro dia, mas você é mais. Dá medo porque a vida inteira parece pouco para viver um amor tão grande. E viver um grande amor é para quem tem sorte e coragem. O que eu queria era que todos no mundo tivessem o privilégio de viver um grande amor. Que alguém pudesse se sentir tão amado como eu, pelo menos por um instante como a cada encontro, a cada beijo, a cada transa, a cada conversa interminável, a cada discussão que prova que você estava certa e eu errado. Estarei indo à Itália em breve, mesmo odiando avião, comprarei um vôo para te ver, mas quando chegar, iremos velejar juntos. Espere por mim.

Com amor, Seu Yuno."

Termino de ler essa carta mais uma vez e dobro o papel que já foi dobrado tantas vezes que já está quase rasgando. Essa foi a última vez que meu avô escreveu para a grande paixão da sua vida. Pelo ano que está marcado no papel, vejo que foi um ano antes do meu pai nascer. Talvez a minha avó tivesse descoberto a sua gravidez e essa foi a razão do vovô nunca ter enviado essa carta e de nunca mais ter procurado pela Amélia.

As suas palavras conseguem descrever o que sinto com mais facilidade do que eu gostaria. Fecho os olhos e respiro. Penso no meu Jungwoo.

São 23h54, eu acabei de voltar do trabalho e sei que deveria estar dormindo, afinal, tenho uma prova prática amanhã cedo, mas não consigo parar de encarar o teto do meu quarto.

Respiro. Seguro perto do peito o medalhão que meu pai me presenteou, sentindo meu coração bater debaixo dele. São batidas conformes e intensas. Respiro.

Ergo as mãos para o alto, deixando o cordão pendurado e olho novamente a imagem daquela mulher que balança diante de mim. Tinha a aparência jovial, cabelos escuros como os olhos e o formato do nariz muito familiar para mim. Há algo nela que grita em minha memória, eu já a vi em algum lugar, mas que lugar?

Tento fazer minha mente trabalhar para lembrar-se e levantar da cama quando me lembro de Yuta. Não necessariamente dele, mas do que me devolveu naquela vez.

Vou atrás da sacola de papel que ainda está sobre a minha mesa de estudos. Puxo logo o que me interessa: o bloco de rascunhos de Jungwoo.

Folheio rapidamente com o polegar e então passo folha por folha, e dentre os inúmeros rascunhos de flores, formas geométricas e xícaras de café, chego onde queria. Encontro o rosto daquela mulher. Encontro o rascunho da sua face e comparo com o medalhão que ganhei de meu pai.

Preciso me sentar na cadeira, já que minhas pernas bambearam e eu não aguentei. É incrivelmente parecido. O formato das sobrancelhas e o nariz. A mulher do retrato é igualzinha à que estava estampada no medalhão.

Aquela mulher é a mãe de Jungwoo.

***

Tudo o que escuto é um burburinho de vozes intermináveis. Observo um garçom devidamente vestido passar por minha mesa e levar aquelas torres de cerveja para a mesa vizinha, onde há um grupo de colegas da minha universidade.

Youngho os convidou, na verdade, ele convidou quase todas as pessoas que estão aqui agora. "comemorando" o nosso aniversário, tudo por conta dele.

Estou feliz em ter sido lembrado por ele, mas tenho certeza que a maior parte dessas pessoas estão aqui pela cerveja gratuita.

O Segredo do Oceano •  JaeWooOnde histórias criam vida. Descubra agora